
Capítulo 1054
Terramar: O Mar Encoberto
Todos se voltaram para Wrench, inclusive o Capitão Klaus. Quando Klaus viu o sorriso debochado de Wrench, sacou seu mosquete de calibre grande e disparou, acertando-lhe um tiro na cabeça. Era preciso fazer aquilo. Não podia deixar a situação fugir do controle.
Batidas de palmas, palmas, palmas!
O aplauso de Klaus chamou a atenção de todos.
"Vocês são minha tripulação ou não? Como assim já estão com medo, sendo que as coisas não estão tão ruins assim? Onde estava aquela energia que vocês tinham quando me seguiram para enfrentar aquela coisa naquela época?!
"Independente do que está acontecendo, nem pensem em se entregarem antes da hora! Nem temos medo da morte, então por que deveríamos temer o que está por vir?"
Sentindo as emoções conflituosas de seus companheiros, Klaus acrescentou: "E que se precisarmos ficar aqui por dez anos? O navio é nossa casa. Estar aqui é como estar em casa! As pessoas geralmente se estabelecem em suas casas, não é mesmo?
"Nunca passaremos fome, nunca ficaremos cansados e nunca morreremos! Nem envelheceremos! É como se os próximos dez anos nos fossem dados de graça. Não é uma boa coisa? Tenho certeza de que gente lá fora vai nos invejar."
Klaus se virou para sua tripulação e chamou um por um.
"Huck, você sempre disse que queria aprender a ler, mas nunca tinha tempo. Agora, você tem dez anos para aprender! Pode aproveitar com calma esse aprendizado!"
"Ei, Cozinheiro, lembro que você sempre quis se tornar um pintor, igual ao Governador Charles. Se é isso mesmo, então vá em frente. Agora você tem tempo suficiente para aprender!"Os membros da tripulação trocaram olhares e, aos poucos, se acalmaram. Ao ouvirem as palavras de Klaus, perceberam que estavam exagerando um pouco.
As palavras de Klaus tiveram efeito.
A tripulação seguiu seu conselho e encarou os ciclos de tempo com serenidade. Eles tratavam cada ciclo como um dia. Um dia, se reuniam para pensar em uma solução para sua situação; no outro, seguiam suas vidas normalmente.
Os membros analfabetos decidiram aprender a ler com a ajuda de seus companheiros alfabetizados. A tripulação aprendeu a cozinhar com o cozinheiro, e também a cuidar de doenças com o médico do navio.
Desde que pudesse aliviar o tédio, eles não hesitavam em fazer. Até mesmo aceitaram os ensinamentos de Lily, que lhes transmitia conhecimentos avançados que aprendera na academia.
O tempo passou assim, e eles passaram dois anos em paz. Contudo, isso também significava que haviam passado esses dois anos procurando uma solução e não encontraram nada.
No final, a própria tripulação começou a rejeitar subconscientemente a ideia de buscar uma saída. No terceiro ano, eles começaram a se cansar e buscar outras formas de aliviar a rotina.
Nesse momento, todos já sabiam onde estavam todos os livros do navio, inclusive os romances de Lily. No quarto ano, quase tendo decorado cada livro, começaram a inventar suas próprias histórias.
No começo, Lily persistiu e participou do grupo, mas com o tempo, sua alegria foi desaparecendo, substituída por uma postura cada vez mais retraída. O passar do tempo implacável estava destruindo seu coração.
Independente dos sentimentos de Lily, o ciclo de tempo continuou. Quando ficaram sem histórias para contar, a tripulação começou a pensar em ideias que já haviam tido antes, mas que nunca tiveram coragem de experimentar.
Por exemplo: ficar nus e pular na água escura do mar, colocar fogo no porão de combustível e de munição.
Lily também sentia olhares furtivos direcionados a ela, mas ninguém tinha coragem de agir por enquanto. Além disso, o Capitão Klaus fazia de tudo para manter alguma estabilidade, mesmo com as ações cada vez mais absurdas da tripulação.
No sexto ano, ninguém mais pensava em encontrar uma saída. No sétimo, começaram a se machucar, usando dores intensas para aliviar o tédio.
Porém, Klaus não impunha limites, sabendo que suas palavras anos atrás eram apenas uma maneira de enganar a si mesmo. No oitavo ano, as ações de autolesão ficaram mais graves; começaram a procurar métodos cada vez mais insanos, como engolir um galão inteiro de combustível vermelho.
Até o nono ano, porém, o humor dos tripulantes começou a melhorar.
O prazo de dez anos mencionado por Wrench estava se aproximando.
Como suas mentes e sanidade sempre se reiniciavam ao início de um novo ciclo, eles ainda não haviam enlouquecido de vez. Mas, na verdade, não podiam mais aguentar tanto tempo.
Curiosamente, os tripulantes estavam preocupados em esquecer a passagem do tempo, mas descobriram que todos estavam, na verdade, mantendo o controle dele secretamente em seus corações.
Era como prisioneiros que sabiam quantos dias faltavam até serem libertos. Assim, um novo ciclo de tempo começava. Todos eram transportados novamente para o convés, mas desta vez, estavam extremamente empolgados.
Sabiam — eles sabiam que tinham, no máximo, mais três ciclos antes de finalmente conseguirem sair.
"Três!" — os tripulantes gritavam ao máximo de suas forças, como se quisessem desabafar toda a emoção acumulada durante esses dez anos.
" Dois!" — gritavam e se ajoelhavam.
"Um!!" — Lily gritou junto com eles, com o rosto vermelho de excitação.
Quando se viraram para o convés mais uma vez, Lily levantou voo e limpou a neve no ar. Todos se apressaram para chegar à ponte, rindo descontroladamente, inclusive Lily.
Naquele momento, eles eram iguais a Wrench há dez anos. Só quem passou por algo semelhante poderia entender o quão deprimente era ficar preso na mesma rotina de ciclo de tempo por uma década.
Eles não podiam morrer, mesmo querendo, tampouco enlouquecer. A experiência aterradora deixou todos à beira do colapso — ou talvez, eles teriam desabado se não fosse o reset do ciclo.
"Engenheiro-chefe! Sobrecarregue os motores! Vire o barco! Nós. Vamos. Sair. Desses infernais lugares!" — Klaus gritou pelo rádio.
"Espere! Ainda não podemos sair," — Lily corria até Klaus e gritou — "Ainda não chegamos ao nosso destino!"
"Não!!" — Klaus imediatamente rejeitou o pedido de Lily — "Tenho que ser responsável pela minha tripulação! E ninguém sabe o que vem pela frente. Você quer passar por aquele inferno de novo?!"
A boca de Lily se abriu, mas ela não conseguiu dizer uma palavra. Lily lutava entre o pesadelo de dez anos e Charles. Após pesar as duas opções no coração, ela tomou uma decisão — "Só precisamos evitar a neve!"
Porém, Klaus já não dava a mínima para Lily. — "Engenheiro-chefe! Sobrecarregue os motores, eu disse! Você não ouviu?!"
Contudo, não obteve resposta de ninguém na sala de máquinas.
Corações apertados, todos sentiram um medo extremo ao mesmo tempo.
Alguém desceu até a sala de motores e voltou rapidamente, chorando e reportando — "Chefe! Os caras da sala de motores ainda estão congelados! Ainda estamos num ciclo de tempo!!!"
Todos presentes quase perderam o equilíbrio ao ouvir isso.
Lágrimas escorriam pelo rosto de Lily, mas não podiam dissipar nem um pouco do desespero em seu coração.
Todos se viraram lentamente, como robôs, para olhar uma pequena geleira de neve no convés lá fora.
Wrench estava debaixo da geleira, completamente enterrado pela neve pesada.