
Capítulo 44
Poder das Runas
Mas então, como se a masmorra tivesse começado a respirar pela primeira vez em séculos, algo mudou.
Uma onda—silenciosa, mas inegável—varreu o salão.
Asha sentiu-a instantaneamente, como se a própria realidade estivesse tremendo ao seu redor. A putrefação persistente, o chão ensanguentado, os corpos quebrados empilhados como oferendas—sumiram. Desapareceram sem deixar vestígios, apagados da existência.
Até mesmo a presença opressiva dos soldados de pedra desapareceu, sua maldade extinta como brasas que se apagam.
A respiração de Ash prendeu-se—não por medo, mas por uma quieta compreensão.
Ah... Droga
Seu lábio contorceu-se, entre um sorriso sarcástico e uma careta.
Ele está aqui
Mesmo depois de eu chegar primeiro, ele ainda apareceu…
O olhar de Ash se afinou, os olhos estreitando-se contra o brilho que escorria pelas fissuras nas antigas paredes. Ele não precisava ver Ray para saber que a masmorra tinha mudado.
Mesmo quando eu chego primeiro... você ainda toma o palco, pensou Ash, cerrando a mandíbula.
A mana da masmorra, que antes era selvagem e opressiva, agora pulsava com uma calma estranha, como se estivesse acolhendo um visitante há muito esperado.
O olhar de Ash voltou-se para os operativos do mercado negro, ainda arranhando a porta selada, alheios às mudanças na masmorra.
Minha suspeita estava certa, pensou Ash sombriamente. Sem Ray, este lugar não desbloqueia suas profundezas verdadeiras.
Os sussurros do romance o assombravam agora, linhas que ele já tinha lido.
"A própria masmorra respondia a ele, como se percebesse algo escondido dentro dele..."
Ash inclinou-se mais fundo nas sombras, a ironia afiada na garganta.
Um suspiro suave saiu de seus lábios—meio cansado, meio resignado.
Suspiro...
E ainda assim, ele esperou.
Não levou muito tempo.
Logo, Ray chegou—justamente como Ash sabia que ele chegaria. Mas ele não estava sozinho.
Seguindo atrás dele, vinha um grupo desajeitado de sobreviventes—alguns mancando, outros de semblante sério, mas ainda de pé. Suas armaduras estavam amassadas, o sangue salpicara suas roupas, e a desesperança grudava neles como uma segunda pele.
Os olhos de Ash se estreitaram levemente, observando das sombras seguras.
Ele trouxe companhia.
Ray estava no comando dos feridos, o olhar firme apesar das dificuldades que lhe apertavam. Uma faísca de determinação brilhava por trás de seus olhos dourados—a mesma determinação imprudente que Ash lembrava do romance.
A visão acendeu algo amargo no peito de Ash, mas ele afastou a sensação.
Enquanto isso, os operativos do mercado negro tinham abandonado as tentativas inúteis de forçar a porta. Em vez disso, se aproximaram lentamente dos recém-chegados, armas baixas, mas prontas, olhos afiados com intenções veladas.
Aash não precisava ouvir as palavras para entender.
Uma conversa frágil estava prestes a começar.
Ash observava das sombras, invisível, enquanto a atmosfera ficava carregada de tensão.
O grupo de Nathaniel encarou os caçadores do mercado negro perto da porta, os dois lados se olhando como lobos que avaliam bandos rivais.
Bary, um homem alto com uma cicatriz irregular no queixo, zombou. "Bem, bem. Os cães da Associação finalmente decidiram aparecer. Demoraram, hein."
O maxilar de Nathaniel se cerrava. "Demoramos? Vocês deixaram nosso povo morrer."
"Ainda estão respirando, não estão?" retrucou o homem, fingindo inocência.
Vince rosnou. "Respirando por sorte, seu Bastardo."
"Não era nosso trabalho cuidar de vocês," acrescentou um caçador do mercado negro com um sorriso debochado.
"Cuidar?," interrompeu Selene. "Salvamos metade das pessoas que vocês abandonaram, seus insolentes."
Ray, ao fundo, só apertou os punhos. Os sobreviventes atrás dele murmuraram maldições, lançando olhares de desprezo para o grupo do mercado negro.
Aash, ainda escondido, soltou um respiro silencioso.
Por que eles estão se ofendendo, se deveriam lutar se for preciso?
Um dos caçadores feridos do lado da Associação dos Humanos deu um passo à frente, tremendo, mas furioso. "Vocês nos deixaram para trás depois de dizer que íamos limpar a masmorra juntos!"
"De verdade?," respondeu outro mercenário preguiçosamente. "Bem, vocês estão vivos, então sejam gratos."
Segue-se um silêncio tenso. Até o ar parecia mais pesado.
Então Vince quebrou o silêncio, sorrindo mesmo assim. "Você tem uma língua afiada para alguém que se esconde atrás de artefatos roubados e contratos sujos."
O sorriso de Bary se alargou. "Melhor do que se esconder atrás de uma carteira."
Nathaniel suspirou pesadamente. "Basta. Nenhum de nós está em condição de luta."
Selene cruzou os braços, de cara fechada. "E daí? Finjam que as pessoas atrás de nós quase não morreram limpando a bagunça deles? Nem sei por que ainda não estamos matando eles na hora."
"Por enquanto, sim." A voz de Nathaniel não permitia argumentos. "Até que limpemos a masmorra, ninguém sai daqui."
Bary virou o pescoço, olhando de volta para a porta selada. "Bom, pelo menos vocês acertaram nisso. Primeiro, vamos eliminar o monstro que estiver dentro, e aí podemos resolver o que precisarmos."
Nathaniel deu um passo à frente. "Está bem, lidaremos com o que estiver lá primeiro. Depois, decidiremos se há algo digno de sangue."
"Ok," disse o mercenário líder com um gesto de ombro. "Trégua temporária, então."
Ash assistiu à troca de mãos com relutância, olhos ainda cheios de desconfiança.
Que típico deles, pensou Ash secamente. Quase prontos para se matar, agora uma trégua.
À medida que os dois grupos relaxaram um pouco, Ray se mexeu desconfortável próximo aos sobreviventes.
Ambos os grupos ficaram diante da porta gigantesca, olhando para as runas intricadas gravadas em sua superfície.
Apesar de tudo, o silêncio que se instalou entre eles não era de alívio—era de medo.
Nathaniel, com a lança na mão, deu um passo mais perto para inspecioná-la. "Esses glifos são antigos," murmurou. "Isso não é magia normal de masmorra."
Um dos mercenários bufou. "Quer dizer que você está com medo de pedra agora?"
Nathaniel ignorou, os dedos percorrendo as linhas pulsantes ao longo da moldura da porta. Lucien, o mago do grupo, também examinou a porta de perto.
Ray ficou atrás, olhando silenciosamente para a porta enquanto os outros discutiam.
A voz de Garrick foi baixa, porém afiada. "Está muito silêncio aqui dentro."
"Sempre fica quieto antes de aparecer o ouro," respondeu o líder do mercado negro com um sorriso preguiçoso.
Então, Ray deu um passo lento em direção à porta. Sentiu... algo estranho, como se ela o estivesse chamando.
Sem pensar, colocou a palma da mão contra a pedra.
A porta pulsou uma vez—depois estremeceu.
Um ruído profundo ecoou pelo cômodo enquanto os sigilos brilhavam mais intensamente e a pedra lentamente se abriu, revelando uma passagem escura além.
Então, com um ranger lento, a porta começou a abrir. Poeira caía de cima enquanto a pesada pedra se movia, revelando a vastidão escura além.
O cômodo ficou tenso.
Ninguém falou.
Ray piscou, recuando, confuso. "O que diabos..."
Nathaniel virou-se. "O que aconteceu?", perguntou, mas ninguém respondeu, pois todos estavam examinando a porta, sem entender como ela tinha se aberto.
Mas Ash percebeu claramente, pois seu olhar nunca saiu de Ray.
Sabia que era assim, pensou friamente.
Os outros nem notaram, demasiado fixados na passagem que se abria diante deles.
"Parece que vamos entrar, afinal," disse um dos mercenários, sorrindo.
Depois de hesitar por um momento, finalmente decidiram entrar.
Quando o grupo se aproximou para adentrar na câmara escura e sem luz, aconteceu.
Os caçadores do mercado negro se moveram como víboras.
Sem aviso, lâminas reluziram na tênue luz de suas lanternas—direto nas costas dos sobreviventes feridos da Associação dos Humanos.
Gritos de dor e choque ecoaram ao serem golpeados brutalmente, derrubando os indefesos sem misericórdia.
Uma adaga fincou-se na espinha de um jovem caçador, seu corpo convulsionando violentamente antes de cair, com os dedos tremendo contra o frio chão de pedra. Outro gritou ao sentir uma espada atravessar seu ventre, a ponta saindo pelas costas. Ele engoliu o próprio sangue antes que suas pernas fraquejassem.
O cômodo virou cenário de caos.
"VOCÊ, FILHO DA P*TA!" gritou Nathaniel, rodando enquanto um mercenário empurrava uma lâmina na garganta de um soldado exausto ao seu lado.
O sangue espirrou.
O corpo do homem desabou à sua frente, olhos arregalados de incredulidade antes que suas pernas o traíssem.
"M#*DA-SE TODOS! O TESOURO É NOSSO!" gritou Bary, sua voz ecoando sobre a carnificina.
Ray virou-se, horrorizado, justo quando outra sobrevivente—uma mulher quase sem forças—jogou-se na frente dele. A faca destinada a Ray fincou-se fundo no seu ventre ao invés disso.
Ela arfou.
Colapsou nos braços de Ray, seu sangue manchando sua armadura.
"Não!" seu grito saiu rugindo, cheio de fúria. Seu aperto na espada ficou mais forte até suas mãos ficarem brancas.
Selene rosnou, luzindo suas adagas, enquanto atacava o mercenário mais próximo. Cortou sua garganta, torcendo a lâmina antes de arrancá-la. Sangue espirrava em seu braço, mas ela não parou.
Vince disparou flechas a queima-roupa, atingindo dois traidores nos olhos antes que pudessem reagir.
Lucien lançou uma tempestade de magia, fogo e gelo explodindo de suas mãos, queimando as fileiras inimigas.
Garrick rugiu, seu escudo massivo batendo na cabeça de um caçador com força de rompante. O homem caiu como um farrapo. Com força monstruosa, Garrick virou seu escudo de lado, quebrando as costelas de outro mercenário com um barulho horrendo.
Irene ficou atrás dele, mãos brilhando enquanto canalizava magia de cura nos feridos.
"Fiquem atrás de mim!" gritou Garrick, protegendo-a com seu escudo enquanto flechas voavam em direção a eles. Ele as derrubava com brutal eficiência, respirando pesado.
Nathaniel lutava como um demônio. Empurrou sua lança através do peito de um traidor, torcendo e puxando de uma só vez. Sangue espirrava em seu rosto, mas seus olhos dourados permaneciam frios.
Mas então—
Bary avançou.
O líder do grupo do mercado negro, alto e vestindo uma armadura escura, estalou os dedos, seu sorriso cruel brilhando na pouca luz.
Os olhos de Nathaniel travaram nele.
"Tch. Finalmente resolveu mostrar o seu rosto feio."
Bary zombou. "Palavras corajosas para um morto."
Então, ele se moveu.
Mais rápido do que o esperado.
Seu grande espadão desceu em um arco brutal, forçando Nathaniel a defender-se com sua lança. O impacto enviou uma onda de choque pelo cômodo, poeira e detritos sacudindo do teto.
Nathaniel rangeu os dentes, recuando enquanto Bary avançava, golpeando com força bruta.
As armas deles colidiram numa dança mortal—Nathaniel esquivando, defendendo, atacando com precisão, enquanto Bary contra-atacava com força bruta.
Uma finta—a espada de Bary subitamente baixou, depois disparou para cima.
Nathaniel quase virou em tempo, mas a lâmina roçou seu lado, cortando a armadura e arrancando sangue.
"Nada mal," provocou Bary. "Mas você já está ficando mais lento."
Nathaniel respirou fundo, firmando sua postura.
Então, sorriu.
"Você também."
A lança disparou como um raio.
Bary desviou quase por acaso, mas a ponta tocou seu ombro, rasgando músculo.
Sua expressão se torceu numa ameaça.
"Seu filho da p#*a."
Ele revidou com um golpe pesado para baixo.
Nathaniel rolou para o lado, evitando a investida, mas a onda de choque destruiu o chão onde ele estava.
A batalha continuava— brutal, implacável.
Enquanto isso, Garrick lutava como uma força imbatível, seu escudo atingindo os inimigos com impacto devastador.
Então—
Uma flecha.
Uma única flecha bem direcionada cortou o ar, perfurando a brecha exposta na armadura de Garrick no pescoço.
Ele arquou-se, seu ritmo vacilando.
Outra adaga enfiou-se em seu lado.
Uma terceira lâmina cortou sua perna.
Ele caiu de joelhos, sangue escorrendo para o chão.
Irene gritou seu nome, "Garrick!!!!"
Mas Garrick não parou.
Com um último grito de desafio, bateu seu escudo no chão, enviando uma onda de choque para fora. A força do impacto fez três caçadores voarem para trás.
Mas seu corpo não aguentou.
Ele desabou para frente, o escudo escorregando de suas mãos.
Morto.
Irene soluçou, magia ainda brilhando em suas mãos, mas era tarde demais.
A fúria de Ray explodiu.
Ele avançou, sua espada atravessando as costelas de um mercenário com força bruta e desleal.
"Não vou deixar mais ninguém morrer!" gritou.
Mas eles morreram.
Um a um, os sobreviventes que ainda tinham esperança foram abatidos.
Selene xingou enquanto uma flecha cortava seu braço.
"Ray! Foca no inimigo!"
Nathaniel bloqueou um golpe direcionado ao Vince, com os punhos sangrando, e gritou, "Não quebre a formação!"
Ray ignorou-os, dominado pelo furor.
Seus golpes eram desesperados, mas potentes, cada um alimentado pela emoção pura.
Sangue espirrava nas paredes.
Quando o último mercenário caiu—com a garganta rasgada pelo último tiro de Vince—o estrago já tinha sido feito.
Silêncio.
Ray ficou no meio dos corpos, a espada tremendo em suas mãos.
Sua face banhada de sangue. Seus olhos vazios, mas fervorosos.
Apenas a equipe de Nathaniel permanecia.
Garrick jazia morto no chão de pedra, seu corpo enorme cheio de ferimentos.
Seis sobreviventes.
Todos machucados, todos furiosos.
Vince escorou-se numa parede, segurando seu lado. "Malditos covardes," cuspiu, ofegante.
Selene limpou sangue do rosto, com voz fria. "Eles nos esperaram abrir a porta. Hora de covarde."
Nathaniel ficou ali, com expressão sombria.
"Eles nos enganaram."
Ray apertou os punhos, sem conseguir falar.
Os corpos daqueles que o protegeram jazia aos seus pés.
O cômodo ficou calado, carregado de dor e quieta fúria.