
Capítulo 76
Fui parar dentro de uma história de fantasma... e ainda tenho que trabalhar
– 'Esta é a sua única saída.'
Baque.
– 'Você, tolo, enredado pelo changgwi e levado até a tumba de Sangun-nim! A escuridão se aproxima, e um fantasma se agarra às suas costas.'
Engoli em seco.
– 'Não responda. Não abra a porta. Purifique seu corpo e resista até a lua cheia surgir. Vá ao santuário para realizar o ritual.'
– 'Então você poderá ver o sol nascer. Contudo…'
Virei a página.
– 'O changgwi perseguirá incansavelmente qualquer um que considere presa digna. Você, que já foi enlaçado pelo tigre, jamais escapará.'
– 'O fantasma ficará na soleira da sua porta, ao seu lado enquanto dorme.'
– 'Por isso, você também deve se tornar um changgwi. Para escapar, deve encontrar outro para substituir seu lugar e oferecê-lo ao tigre.'
……!
– 'O sacrifício deve possuir raciocínio, sangue quente e voz. Só assim o changgwi poderá ser enganado.'
– 'Ofereça o sacrifício e siga o caminho iluminado pela lua até uma pequena cova de serpentes.'
– 'Este é o seu único meio de escapar. Não existe outra maneira.'
"……"
– Acabou. Interessante, não?
Fechei o livro, com as mãos paralisadas.
'...Então era isso.'
No registro da exploração, aquilo estava descrito em uma ou duas linhas: um sacrifício era escolhido por sorteio e, quando o escolhido recusava, era amarrado a um poste e arrastado embora.
Mas, ao encarar aquilo diretamente... o peso estranho e perturbador das palavras me esmagava.
Folheei.
Naquele instante, algo que estava entre as últimas páginas do livro caiu.
"……"
Era um pequeno cartão de papel.
Quando o peguei, vi uma letra apressada rabiscada no verso.
⧻⧻ Saindo amanhã.
Virei o cartão.
───
Go Seonha
Departamento de História, Universidade Joo Kang
───
Será que foi alguém que leu o livro antes de mim?
Enquanto isso, o chefe de seção Lee, que sabia ler chinês clássico, parecia tropeçar nas palavras sozinho.
E então parou, congelado de terror.
"犧牲物… I-Isso! Não quer dizer que uma pessoa deve ser sacrificada?"
"……"
"Certo! Se apenas um de nós morrer, o resto pode sobreviver!"
Não respondi.
O chefe Lee começou a esfregar as mãos nervosamente, os olhos atentos, se movendo pela sala.
"Ma-mas, se n-não fizermos isso, todo mundo vai morrer mesmo, então…"
"E daí?"
"…Não seria suficiente se a pessoa certa morresse? Alguém que provavelmente não sairia vivo daqui, né?"
Isso foi uma apresentacão?
Mas, olhando para a expressão do chefe Lee, entendi.
'Ele estava falando das crianças.'
"Pra ser sincero! Uma dessas crianças… se você não tivesse chegado, eles provavelmente estariam todos mortos! A gente tem que se concentrar em sair daqui!"
"……"
"Se um deles morrer e o resto de nós sair vivo, isso ainda não seria uma coisa boa?"
Jamais imaginei ouvir esse tipo de conversa na vida real.
Considerando que ele estava preso aqui há uma semana, tomado pelo medo da morte e pelo pânico, podia entender seu desespero, mas…
'Ainda assim, não consigo concordar com esse tipo de pensamento.'
Olhei para o texto em chinês clássico.
"Ser senciente."
"Hã?"
"Este livro especifica um ser senciente, com intelecto, como sacrifício."
Inclinei a cabeça levemente.
"Uma criança que nem chegou à idade adulta pode ser considerada um ser plenamente senciente?"
"E-Eh…"
"Acho que não."
Fitei o chefe Lee com firmeza.
"Os adultos é que seriam elegíveis como sacrifício, não acha? Ou seja... só resta uma opção."
"……!"
O chefe Lee, suando frio, com as pupilas tremendo, abriu a boca para falar.
"E-Espere, ah, hum…"
Falei calmamente.
"Quero dizer... eu mesmo."
"…Como assim?"
"Sou o único aqui qualificado. Excluindo as crianças e você, chefe Lee, que está aqui há uma semana e está instável mentalmente."
"……"
"Mas não quero morrer. Vou procurar outra alternativa."
Voltei a examinar o livro.
Após um longo silêncio.
"I-Isso, hum… me desculpe."
"……"
"Falar em sacrificar as crianças… que tipo de pessoa eu sou pra mesmo pensar nisso… ha, hahaha…"
O chefe Lee sentou-se, completamente abatido.
"Na primeira noite, foi meu pai…"
Ele havia falecido na cama do hospital por causa do câncer, e eu não pude estar ao lado dele quando morreu por causa do trabalho.
"Então meu pai, chorando, chamou: ‘Byeongjin, deixa eu ver seu rosto’, me pedindo para abrir a porta."
"……"
"Eu resisti, segurando a cabeça, e então o fantasma começou a me xingar de tudo quanto é jeito… tudo com a voz do meu pai."
O chefe Lee enterrou o rosto nas mãos.
"Todas as noites era alguém diferente — um membro da família morto, amigo, vizinho — vindo me visitar, chamando pelo meu nome com suas vozes!"
Seu tio querido, sua tia, primo que morreu em acidente, amigos da faculdade e até a criança do vizinho que foi sequestrada e desapareceu…
"Todos eles, todos que eu conheci, qualquer um que morreu… era como se fossem puxados das profundezas. Mal estou segurando minha sanidade… Se o inferno existe, é aqui mesmo."
"……"
Hum.
Agora que penso, os adolescentes nem suspeitavam que havia um fantasma batendo na porta.
E eles estavam aqui há dois dias.
'Ele ficou praticamente de vigia na porta.'
Se por vontade própria, acidente ou influência fantasmagórica, suas ações, de certo modo, protegeram a estabilidade mental das crianças. Era dolorosamente tocante.
Olhei para o chefe Lee por um momento antes de assentir.
"Se este lugar é o inferno, tem ainda mais motivo pra gente sair daqui."
"……"
"Vou estudar esse livro com mais atenção e…"
Toque, toque, toque.
"……!"
Chefe Lee e eu nos viramos simultaneamente para a porta.
"Foi só um…"
Toque, toque, toque.
"……"
"……"
Com licença.
A voz tinha retornado.