The Water Magician

Volume 1 - Capítulo 2

The Water Magician

“Meu primeiro teto...”

As primeiras palavras de Ryo foram parecidas com o que os personagens costumam dizer em situações de isekai. Mais ou menos. Uma cama luxuosa com dossel? Nem pensar. Até porque, com um dossel, ele nem conseguiria ver o teto...

Comparada aos padrões japoneses da sua antiga vida, essa cama era definitivamente bem simples. Era só um tecido jogado sobre palha espalhada no chão de madeira. Mas se ele pensasse em termos culturais da Europa pré-Renascença, até que era de boa qualidade. Pelo menos para a sua casa, que estava longe de ser a mansão de algum nobre.

Ele vestia as mesmas roupas que usava quando morreu na Terra. Os sapatos também. Não carregava absolutamente nada com ele.

Ryo rolou para fora da cama e a primeira coisa que fez foi explorar o interior da casa. Quarto, sala, cozinha e... banheiro.

“Um ofurô?!”

Ele nunca tinha ouvido falar de europeus da pré-Renascença que tivessem banheiros dentro de casa.

“Mas os romanos antigos tinham enormes banhos públicos, então acho que é possível. Eu, como japonês, sou grato... Ooooh, será que o Falso Miguel fez isso especialmente pra mim por eu ser japonês? Muito obrigado, Falso Miguel! Me curvo diante do seu talento!”

Ele ainda não tinha certeza se Falso Miguel era mesmo um homem.

No entanto, seu conhecimento era bem limitado, já que os banhos públicos realmente existiam na Europa medieval. O problema era que, por falta de noção sobre higiene, esses banhos muitas vezes se tornavam criadouros de doenças infecciosas.

Satisfeito com o que encontrou no banheiro, Ryo seguiu para a sala.

Sobre a mesa, havia dois livros e uma faca. Ao lado deles, repousava uma única folha de papel:

Seu estoque de comida está no silo do lado de fora. Ele também funciona como freezer, então dá pra conservar os alimentos. – Falso Miguel

“Eu sabia que ele estava lendo minha mente...”

Definitivamente não queria fazer inimigos com alguém tão competente como o Falso Miguel.

Diferente dos livros grossos e pesados da seção de raridades da biblioteca da faculdade, esses pareciam... bem normais, na verdade. Idênticos aos livros impressos após o surgimento da imprensa.

“Uou. Isso é feito de papel? Papel mesmo, e não pergaminho? Esse mundo tem papel?”

Ele leu silenciosamente os títulos nas capas de cada livro: *Compêndio de Monstros – Edição para Iniciantes*. *Compêndio de Flora – Edição para Iniciantes*.

“Isso significa...”

Ele não tinha algo como uma habilidade de avaliação, que era padrão nas histórias de reencarnação.

“Sei que ele disse que esse mundo não é baseado em níveis nem em sistemas de habilidades, mas pô...”

Ambos os livros tinham várias ilustrações de fácil compreensão, o que foi um alívio enorme para Ryo.

Quanto à faca na mesa, sua lâmina tinha cerca de vinte centímetros e parecia ser bem feita. Se você estivesse preso numa ilha deserta e pudesse levar apenas uma coisa, o item mais citado sempre era uma faca. Então, Ryo a pegou e a prendeu na cintura por enquanto.

Ele examinou a área ao redor da mesa e o restante da sala, mas não encontrou mais nada. Por fim, abriu a porta que levava para fora — e foi imediatamente cegado pelos raios brilhantes do sol. Quando seus olhos se acostumaram com a luz, viu um gramado se estendendo ao redor da casa. Além disso, uma floresta densa bloqueava sua visão.

Do outro lado da casa, também havia árvores. Mas além delas... ele viu montanhas tão altas que pareciam perfurar o céu. Percebeu que deviam estar bem distantes dali. A princípio, achou que o clima daquele mundo fosse ameno, mas mudou de ideia ao ver a neve cobrindo os picos das montanhas.

“Aposto que dragões e outras coisas vivem lá. O que significa... que é melhor eu não chegar nem perto.”

Ryo disse isso em voz alta de propósito, fazendo um juramento a si mesmo.

Ele ainda não estava com fome, o que significava que era hora. Precisava confirmar por si mesmo que agora estava de fato num mundo de espadas e magia. Sim, era hora de finalmente usar sua magia.

“Não posso usar nada além de magia de água. E a imagem é a parte mais importante na hora de usar magia.”

Estendeu a mão direita para frente e a levantou, o que pareceu o gesto certo, por algum motivo. Enquanto visualizava a água jorrando da palma de sua mão, Ryo entoou:

“Água, manifeste-se!”

*Splash.* Um filete de água — suficiente para encher um copo — escorreu de sua mão e caiu no chão. Sua primeira experiência com magia! Objetivamente falando, foi uma demonstração bem sem graça, mas ainda assim, era algo. Ryo não conseguia parar de tremer de tanta empolgação por ter conseguido usar magia logo na primeira tentativa.

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“Magia realmente existe nesse mundo...”

Ryo ficou tão empolgado que tentou várias vezes depois disso...

“Água, manifeste-se!”

“Água, manifeste-se!”

“Água, manifeste-se!”

Após um breve silêncio, ele murmurou em voz alta:

“O Falso Miguel disse que a imagem mental era importante. E se eu tentar assim...”

Em sua mente, visualizou a mesma imagem da água jorrando de sua palma direita.

“Água.”

Assim como nas tentativas anteriores, uma esfera de água — suficiente para encher um copo — escorreu e caiu no chão.

“Uó-rã.”

Dessa vez, tentou falar com um sotaque estrangeiro, mas o resultado foi o mesmo — um copo de água espirrou no chão. Na tentativa seguinte, decidiu apenas pensar, sem dizer nada em voz alta.

*Água.*

Nenhuma diferença. Ainda era só o suficiente para encher um copo, caindo direto no chão.

“Hmm. Então não preciso dizer em voz alta, afinal. Que pena... Sempre quis usar feitiços com nomes estilosos...”

Não importa a idade, todo homem guarda um pouco da tal Síndrome do Protagonista.

“Ahhh, era pra eu ter feito isso dentro da banheira... Que desperdício de água...”

Correu até o banheiro e continuou praticando sua magia de água por lá, agora sobre a banheira.

“Ainda não consegui produzir mais do que um copo por vez. Seria ótimo conseguir um fluxo forte e contínuo, o suficiente para encher a banheira.”

A banheira era imponente, feita de pedra. Combinaría perfeitamente com uma pousada de luxo com águas termais e ofurôs privativos. Ryo sabia que, se continuasse só com copinhos de água, encher aquilo seria um verdadeiro desafio.

“Um fluxo forte e contínuo... Tipo água saindo de uma torneira. Não, pera, pera, pera. Isso é uma banheira. Então não é só água comum que preciso — é água quente. Certo, vamos tentar gerar água quente.”

Ryo visualizou água quente. Para fortalecer a imagem, entoou as palavras em voz alta:

“Água quente.”

Quando fez isso, mais um copo de água caiu dentro da banheira. Sim, água — e não água quente.

“Mas que droga? Talvez eu precise tornar a imagem mais clara?”

Dessa vez, imaginou a banheira completamente cheia de água quente enquanto repetia:

“Água quente.”

O resultado foi o mesmo — mais um copo de água morna espirrou dentro da banheira.

“Hmmm... Acho melhor desistir da água quente por hoje. Essa Floresta de Rondo é bem quente, então um banho com água natural também soa agradável.”

Ryo não se incomodava com esforço, mas sabia a hora de recuar. Era natural, afinal, não dava pra esperar ser bom em algo logo de cara. Decidido, recuperou o foco.

“Torneira.”

Água começou a sair de sua mão direita de forma constante, como se fosse de uma torneira.

“Isso, isso, muito bom. É por aí mesmo.”

Ele tinha maturidade suficiente para admitir seu fracasso com a água quente. Mas considerando a quantidade de água comum que conseguiu produzir logo no primeiro dia, isso já contava como um grande sucesso. Pelo menos agora, já conseguia gerar água suficiente para beber e tomar banho.

Mas entre os vários desafios da vida, um ainda restava...

“Vou precisar de fogo, né...”

Para cozinhar, se aquecer, e no dia em que finalmente passasse de banhos mornos para banhos quentes. De um jeito ou de outro, precisaria encontrar uma forma de gerar fogo.

Esse problema não existiria se pudesse usar magia de fogo, mas... isso seria como pedir a lua nesse mundo. Afinal, Ryo só poderia usar magia de água pelo resto da vida.

“A questão é: como vou conseguir fogo...”

Humanidade “descobriu” o fogo quando um raio caiu sobre uma árvore e a incendiou, não foi...? Mas ele não tinha certeza se isso era verdade. Ou talvez tenha sido Prometeu quem trouxe o fogo para os humanos...? Nenhuma dessas opções o agradava no momento.

“Uma pederneira seria o ideal.”

Fez uma nova inspeção pela casa, mas não encontrou nada. Bater o aço da faca contra uma pederneira criaria faíscas. Ryo estava certo de que, com o tempo, encontraria algo assim pelas falésias ou margens dos rios próximos, mas isso ficaria para quando estivesse mais adaptado à nova vida.

Falso Miguel havia dito que monstros não se aproximariam num raio de cem metros da casa — o que significava que provavelmente havia monstros além disso. Ele só sairia da barreira após se preparar devidamente. “Barreira” era como tinha decidido chamar, até descobrir o nome real. De qualquer forma, não poderia cruzá-la até que sua magia de água estivesse forte o bastante para lutar. Do contrário, não teria a menor chance.

De todo modo, Ryo precisava arranjar outra forma de obter fogo. Sem pederneira, a única alternativa seria usar atrito — esfregar um graveto duro contra outro mais macio até gerar calor.

“Não consigo nem me imaginar conseguindo fazer isso dar certo...”

Quando a banheira finalmente encheu, Ryo saiu da casa por um breve momento.

Ryo recolheu gravetos e lenha enquanto mantinha um olhar atento na direção do lado de fora da barreira. Também pegou qualquer coisa que pudesse servir de isca para iniciar o fogo. Capim seco, por exemplo, talvez funcionasse se ele o amassasse um pouco... Provavelmente.

Naquele momento, deu sorte de encontrar uma árvore que, embora não fosse exatamente uma palmeira do cânhamo, ainda assim entrava na categoria das palmeiras. A casca escura seria bem útil.

“Acho que lembro de ter visto isso num vídeo.”

Esse era o nível do conhecimento de sobrevivência do Ryo.

Falso Miguel havia instalado um fogão a lenha tradicional dentro da casa. Mesmo considerando toda a madeira que esse tipo de fogão exige, ainda sobraria bastante lenha para ele usar. Quanto aos gravetos necessários para criar atrito, os ideais seriam um galho de pinheiro e outro de carvalho sempre-verde.

“Vamos nessa!”

Nem uma fumacinha sequer. Ryo continuou tentando. Uma hora se passou... depois duas... até ele finalmente desistir.

“Acho melhor eu ver que tipo de comida tenho.”

Às vezes, era preciso ser prático e saber priorizar. Não dava pra esperar que tudo fosse dar certo logo de cara.

Tendo jogado a toalha na tentativa de fazer fogo, Ryo seguiu até o silo do lado de fora da casa. Por fora, parecia uma cabana comum. Mas ao abrir a porta, sentiu o ar gelado vindo de dentro.

“Isso é magia de água? As paredes são feitas de gelo? É o que chamam de casa de gelo?”

Devia ser obra do Falso Miguel também. Talvez, no futuro, Ryo também conseguisse usar esse tipo de magia... quem sabe.

No seu segundo dia em Phi, Ryo acordou junto com o nascer do sol. Já tinha pensado numa ideia para conseguir fazer fogo, mas para colocá-la em prática, precisava entender melhor como usar sua magia de água.

Falso Miguel tinha dito que as leis da física e a composição molecular de Phi eram praticamente idênticas às da Terra. Era verdade que, embora magia existisse em Phi e não na Terra... aparentemente a Terra já havia sido um mundo mágico também, um dia.

Na Terra, a estrutura molecular da água era H₂O. Então, com quase toda certeza, era o mesmo em Phi.

Ryo trouxe o balde do banheiro.

“Torneira.”

Ele o encheu com cerca de dez centímetros de água, planejando congelá-la. Em sua mente, focou em criar uma imagem clara de gelo.

“Congelar!”

Mas não deu certo.

“Hmmm, isso é bem difícil. Mas preciso continuar tentando, porque preciso aprender a criar gelo... Tenho quase certeza de que dá pra usá-lo como arma. Seria ótimo criar uma lança de gelo com magia.”

Talvez não bastasse apenas condensar a água. Poderia ajudar se ele visualizasse o calor saindo do líquido ao mesmo tempo em que ele se tornava sólido. Assim, começou um processo de tentativa e erro, testando várias abordagens.

Após inúmeras tentativas desafiadoras, uma fina camada de gelo finalmente se formou na superfície da água. Infelizmente, não congelava além disso. Então, decidiu se concentrar diretamente nas moléculas de H₂O.

Existem dois mecanismos pelos quais o gelo armazena calor: o primeiro envolve a vibração das partículas; o segundo, através da entalpia, armazena calor modificando a força das ligações entre as moléculas de água.

A base da magia é a imaginação, e a imaginação humana é ilimitada. Pode-se imaginar tudo — desde o menor grão microscópico até os confins infinitos do universo. A imaginação humana é poderosa em sua essência.

Mesmo que não se possa ver átomos e moléculas a olho nu, desde que se tenha o conhecimento necessário... é possível imaginá-los!

Ryo só precisava ligar as moléculas de H₂O entre si. Pegar o O de uma molécula e conectá-lo ao H da vizinha. Focou em visualizar o fenômeno conhecido como ligação de hidrogênio.

O gelo existe em várias formas. Além da estrutura cristalina hexagonal comum, ele também ocorre na natureza como cristal cúbico. Além disso, outras quinze formas de gelo já foram descobertas em ambientes de alta pressão — de grades belíssimas com ligações de hidrogênio cheias de espaços até formas de gelo que parecem esmagadas.

Muitos aspectos da água e do gelo ainda são um mistério para os cientistas da Terra. Essas substâncias estão profundamente entrelaçadas à vida humana, pois a humanidade não vive sem elas — e mesmo assim, continuam repletas de enigmas não resolvidos.

Agora que era um mago da água, Ryo não conseguia deixar de pensar nisso. Ainda assim, precisava focar em criar gelo, então concentrou-se em formar uma rede ordenada de moléculas de água unidas por ligações de hidrogênio. Ao mesmo tempo, visualizou a redução das vibrações moleculares.

A temperatura de uma substância está diretamente ligada à amplitude de vibração de sua estrutura molecular. Em outras palavras, temperatura é um índice da intensidade das vibrações moleculares. Quanto mais intensas, maior a temperatura. Quanto menores, mais a temperatura cai. Quando as vibrações atômicas e moleculares se aproximam de zero, a temperatura atinge o chamado zero absoluto: –273,15 °C. Por isso, em teoria, não existe temperatura abaixo do zero absoluto.

Na mente de Ryo, as vibrações das moléculas de água iam diminuindo. E a água no balde, obedecendo à imagem mental, transformou-se completamente em gelo.

“Beleza, consegui! Consegui, sim, mas... não consigo tirar isso do balde.”

Foi aí que percebeu que precisava mudar um pouco o formato do gelo. Com as duas mãos sobre ele, começou a raspar e moldar as bordas do bloco, aos poucos. Quando virou o balde de cabeça para baixo, um bloco de gelo com 25 centímetros de diâmetro e 10 centímetros de espessura caiu para fora.

Ele o pegou com as duas mãos e continuou visualizando. Engrossou o centro e afinou as bordas para formar uma lente convexa. Depois de trinta minutos, finalmente conseguiu um formato que o satisfez.

“Heh heh heh. A vitória é minha, e tudo graças às ligações de hidrogênio!”

Ninguém sabia exatamente contra o que Ryo havia vencido.

Enquanto ligações de hidrogênio unem moléculas de água, elas também são responsáveis por outras conexões, como a hélice dupla do DNA. Nas aulas de ciências, aprende-se que os pares adenina-timina e guanina-citosina se conectam por ligações de hidrogênio, formando a famosa estrutura em hélice. As ligações de hidrogênio são incríveis, não são?

Agora ele podia usar a lente de gelo que criou para focar os raios solares e incendiar a casca preta da palmeira-do-cânhamo. Fazer fogo com gelo tinha algo deliciosamente irônico.

Ele se preocupava que o gelo pudesse derreter, mas enquanto continuasse infundindo sua magia na lente, o gelo permanecia sólido. Talvez essa fosse a diferença entre gelo natural e gelo mágico.

Os raios solares incidiam intensamente sobre a grande lente de gelo. Então, em menos de dois minutos, a casca da palmeira pegou fogo. Finalmente, Ryo havia conseguido uma forma de fazer fogo.

“Acho que nem precisava dizer, mas... magia é realmente incrivelmente útil.”

Dos três elementos essenciais à sobrevivência — fogo, água e comida — já tinha conseguido os dois primeiros graças à magia, mesmo que precisasse combinar técnicas primitivas com seus poderes para criar fogo...

“Fico pensando de onde vem a água. Deve vir das moléculas presentes no ar... Acho.”

O calor na Floresta de Rondo era tão intenso que o mais correto seria chamá-la de subtropical, e não temperada. A umidade também era alta, o que explicava a grande quantidade de vapor d’água no ar. Ryo achava que esses fatores explicavam como ele conseguia produzir água tão facilmente, mesmo sendo iniciante em magia de água.

Na Terra, mesmo em desertos há umidade — mesmo que mínima —, o que significa que o ar seco ainda contém um pouco de vapor. Se a magia puder extrair água dessas regiões, então realmente é uma ferramenta impressionante.

Mas... e se magia não se limitasse apenas a isso? Seria possível criar algo a partir do nada? Ele sabia que, tecnicamente, nada nasce do nada. Mais precisamente, o “nada” a que se referia era um estado com ausência de matéria, mas presença de energia.

Falso Miguel havia dito que os fenômenos físicos eram praticamente os mesmos entre a Terra e Phi. Ryo se perguntou se as fórmulas da Terra também funcionariam em Phi. Por exemplo, o teorema mais famoso de Einstein: *E = mc²*, onde *E* é energia, *m* é massa, e *c* é a velocidade da luz.

“Multiplique a massa pelo quadrado da velocidade da luz e você obtém energia.”

Em termos simples, isso significa que a energia pode ser gerada a partir da matéria. Os exemplos mais notáveis incluem a energia nuclear e as bombas atômicas. Mas o ponto aqui é o sinal de igualdade. Como se aprende na escola, se os dois lados de uma equação são ligados por um sinal de igual, significa que são equivalentes. Isso se chama equivalência.

Ou seja, se é possível extrair energia da matéria, então o inverso também deve ser verdade: matéria pode ser criada a partir de energia. Claro que, mesmo na Terra do século XXI, ainda não existe tecnologia para criar matéria a partir de energia. No máximo, os cientistas conseguem gerar elétrons através da produção de pares.

Vale lembrar que até mesmo um único grama de matéria gera uma quantidade absurda de energia. Isso quer dizer que, mesmo controlando grandes quantidades de energia, o produto final ainda seria apenas um grama de matéria. Quer saber o quanto é absurdo? Considere a bomba atômica lançada em Hiroshima. Dizem que apenas 0,7 gramas de massa foram convertidos em energia. Se toda essa energia fosse revertida de volta em matéria, o resultado seria... apenas 0,7 gramas.

Mas, levando em conta que a magia existe em Phi, talvez haja técnicas para gerar matéria a partir de energia dentro desse abismo misterioso chamado magia. E, claro, isso sugere uma conexão com os mesmos fenômenos que deram origem ao universo, onde “algo surgiu do nada” e matéria foi gerada a partir de energia.

Os sonhos realmente podiam ser ilimitados nesse mundo!

Após garantir mais uma “vitória” graças às ligações de hidrogênio, Ryo mirou mais alto — água quente. Com o que sabia agora, tinha confiança de que seria uma batalha fácil. Se havia conseguido formar gelo ao desacelerar as vibrações das moléculas de água, bastava fazer o oposto para esquentá-la: aumentar as vibrações.

Durante a escola, ele havia feito exatamente esse experimento como projeto de pesquisa nas férias de verão. Claro, sem magia na época... Na ocasião, colocou água em uma garrafa térmica, fechou a tampa e depois a sacudiu com força! Após cerca de duas mil sacudidas, a temperatura da água havia subido quase um grau.

Sabendo que a temperatura da água podia aumentar ao forçar a vibração molecular, o sucesso parecia garantido. Ele tentou usando o mesmo balde.

Torneira.

Dessa vez, disse o feitiço apenas mentalmente — precisava praticar tanto a versão falada quanto a silenciosa!

Assim como na criação do gelo, Ryo encheu o balde com dez centímetros de água. Então posicionou as mãos sobre ele e visualizou as moléculas de H₂O.

Mas agora, fez com que vibrassem!

...

“Hã?”

A água não mudou. Nenhum vapor subiu para indicar aumento de temperatura. Ele pegou um pouco na palma da mão... ainda morna.

“Por que não funcionou?”

Será que sua imagem mental não estava forte o suficiente? Tornou a visualização mais clara e... vibração! Resultado?

“Ainda não tá quente, hein...”

O processo deveria ser exatamente o oposto de transformar água em gelo.

“O que mais eu fiz quando fiz o gelo...”

Ryo pensou nos passos que havia seguido.

“Aaaah... Eu liguei as moléculas antes de parar as vibrações. Então, talvez eu tenha que desfazer isso também?”

Mais uma vez, levantou as mãos sobre a água no balde e formou uma nova imagem mental. Dessa vez, primeiro imaginou desfazendo as ligações de hidrogênio entre as moléculas, permitindo que se movessem livremente. Depois, forçou cada uma a vibrar.

*Pshhht.* Um gêiser de água quente jorrou subitamente do balde.

“Aaaah! Quente, quente, quente demais!”

Ele conseguiu desviar do jato por pouco. Sabia que estaria encrencado se se queimasse, já que magia de água não tinha propriedades curativas...

Mesmo assim, havia conseguido produzir água quente. No entanto, ainda havia um problema prático: Ryo tinha medo de testar sua instável Técnica de Aquecimento de Água (como ele mesmo nomeou) diretamente na banheira. Seria um desastre se acabasse danificando a estrutura de pedra.

Diante disso, qual era a única coisa a se fazer? Havia apenas uma resposta:

“Praticar, praticar e praticar!”

Precisava dominar muito melhor essa técnica. Teria que experimentar erros e acertos até o número de sucessos superar as falhas. A única maneira de ganhar confiança era acertando várias vezes.

O almoço foi o mesmo do jantar da noite anterior: carne seca do silo... Por algum motivo estranho, era o único alimento que não estava congelado... Enquanto mastigava um pedaço, Ryo se dedicou a produzir água e repetir sua técnica de aquecimento.

Aproximadamente três horas depois — em horário da Terra — com o sol já próximo ao horizonte, começou a se sentir tonto e teve dificuldade para se manter de pé.

“Acho que vou desmaiar...”

Era a primeira vez que sua reserva de energia mágica se esgotava. Bebeu um pouco da água recém-produzida no balde e então cambaleou até o quarto, onde desabou inconsciente na cama.

“Pra compensar o de ontem, vou gastar toda minha magia depois do banho,” disse Ryo para si mesmo em seu terceiro dia em Phi. Falou em voz alta para firmar a promessa. Como um bom ex-japonês, se sentia sujo e nojento por ter dormido sem tomar banho na noite anterior.

Foi então que percebeu algo.

“Eu só tenho a roupa que tô usando...”

Falso Miguel não havia deixado nenhuma muda de roupa extra. Talvez fosse o tipo de ser que não ligava muito pra vestuário.

“Agora que pensei... O que ele tava vestindo mesmo?”

Seria algo como uma toga daquelas usadas por ricos na Roma Antiga...? Se fosse o caso, ele só precisaria de um tecido bem comprido para enrolar no corpo. Mas... não havia nada assim na casa. Bom, tecnicamente havia sim. Um pedaço de pano apropriado existia — só que Ryo o usava como lençol. E ele definitivamente precisava daquilo para dormir!

“Também, não tem ninguém aqui pra me ver... então, na pior das hipóteses, fico pelado.”

Deixando de lado o fato de que até Adão e Eva apareciam com partes íntimas cobertas por folhas nas pinturas...

“Talvez eu consiga caçar um animal e usar o couro como tanga ou algo assim?”

Ryo sempre foi do tipo que não ligava muito para roupas, então não se incomodava com a ideia de não ter um segundo conjunto. Já tinha fogo, água e comida — isso significava que finalmente era hora de... desenvolver uma forma de ataque com sua magia de água!

Tinha dois meses de alimentos no silo, então havia tempo para se fortalecer o suficiente antes de sair da barreira e procurar uma fonte permanente de comida.

A única arma que possuía era a faca que Falso Miguel deixara.

Na Terra, Ryo era conhecido por suas habilidades com facas — mentira. Ele não tinha confiança nenhuma em caçar animais ou se defender de monstros usando apenas aquilo. Mesmo na Terra, abater um javali selvagem com uma faca seria praticamente impossível... Era insano imaginar que poderia vagar por essa floresta em Phi só com uma faca. A magia de água era sua única alternativa viável.

“Seria ótimo se eu tivesse alguma tecnologia pra fazer arco e flecha, mas... acho que não tem como agora, né?”

No dia anterior, ele havia fantasiado sobre criar uma lança de gelo enquanto fazia a lente. Mas por enquanto, isso ainda era impossível. Levava vários minutos só pra congelar um balde d’água. Criar uma lança de gelo no ato, e ainda acertar um alvo... não parecia realista.

Mais importante... será que ele conseguiria propulsionar a lança com magia? Todas as vezes que usara os feitiços *Água* ou *Torneira*, o líquido apenas escorria das mãos como se caísse por gravidade... Isso o fez pensar se não seria melhor começar com algo como uma bola d’água.

Lembrando da magia que via em animes e vídeos, Ryo esticou a mão direita e visualizou uma bola d’água do tamanho de sua cabeça. Imaginou-a sendo lançada de sua mão.

“Bola d’Água.”

*Whoosh.* Exatamente como imaginado, uma bola do tamanho de sua cabeça saiu voando da sua mão direita. Avançava na velocidade de um passe de basquete entre jogadores. Depois de percorrer dez metros, caiu no chão com um *ploc*.

“Uooooou!”

Ryo comemorou, pulando de alegria com seu primeiro sucesso em... magia ofensiva? Mirou o próximo ataque em uma árvore a sete metros de distância! *Whoosh... splash.* A bola de água acertou o tronco e... molhou a casca. E só.

“Hm, não tem muita força nesse ataque...”

Ryo se jogou no chão de joelhos, em desespero.

“Espera! Tenho uma carta na manga!”

Levantou-se e declarou com convicção:

“Se a Bola d’Água não funciona, então vou tentar o Jato d’Água!”

Dizem na Terra que não há nada que um jato de água industrial não consiga cortar. Tecnicamente, ele não corta — ele desgasta. Ryo havia pesquisado sobre jato d’água por conta das operações da empresa, e por isso tinha certeza de que esse ataque baseado em pressão daria certo.

Apontou a mão direita e visualizou um jato fino de água em alta velocidade saindo da ponta de seus dedos. Aplicou pressão em torno dele, tornando-o o mais fino possível.

“Jato d’Água.”

A água escorreu de seus dedos, com uma força apenas um pouco maior do que a do feitiço *Torneira*. Com isso, ele conseguiria cortar... absolutamente nada.

Ele caiu de joelhos novamente.

“Perdi...” disse, derrotado — embora não soubesse bem para quem.

“Ok, preciso me acalmar.”

Como no dia anterior, mastigou carne seca do silo para o almoço.

Preciso ter paciência. Não tem por que ter pressa. Ontem levei meio dia só pra dominar a técnica de aquecimento. Então, mesmo que esse jato seja fraco agora, com prática ele pode virar uma arma poderosa, certo?

Além disso, aprendi a criar gelo também — o que deve servir em combate contra monstros no futuro... Mesmo que ainda não saiba como usar isso.

Determinado, Ryo ergueu a cabeça e fez uma promessa a si mesmo:

“Certo, só me resta praticar. O esforço nunca te trai!”

Dedicou-se por completo a treinar o *Jato d’Água*. Todos os dias, um pouco depois das duas horas — no horário da Terra —, ele praticava, aumentando gradualmente a força do jato, que agora superava o *Torneira*... embora apenas um pouco. Mesmo assim, ainda estava no nível de uma mangueira de lava-rápido. Ele ainda não tinha descoberto como ir além disso.

Foi só então que Ryo se deu conta de algo.

“Hoje eu definitivamente preciso tomar banho.”

Seguiu até o banheiro, pronto para pôr em prática tudo o que havia aprendido no dia anterior.

“Água, transborde.”

Em cerca de dez segundos, a banheira já estava cheia. Ele havia aprendido a controlar a quantidade de água produzida — fruto do intenso treinamento que o deixara sem energia mágica a ponto de desmaiar.

Agora era hora de esquentar a água. Ryo não se preocupava mais — todo o treino do dia anterior havia lhe dado confiança.

Com a mão direita estendida sobre a banheira, visualizou. Cada molécula vibrava livremente. Imaginou isso acontecendo com cerca da metade da água, já que não queria correr o risco de se queimar. Fez isso várias vezes, mergulhando a mão na água após cada tentativa para ajustar a temperatura conforme ela subia. Após dez ajustes...

...a água estava perfeita.

“Uoooooou!”

Ele comemorou, eufórico. Seu esforço havia sido recompensado.

“Exaustão é a raiz do fracasso. Não trabalhe tanto a ponto de se esgotar.”

O lema do seu pai. Era absolutamente verdadeiro, mas... tão difícil de pôr em prática.

Ryo se acomodou lentamente na banheira, refletindo sobre sua situação atual. Ainda não conseguia usar o *Jato d’Água* como ataque. Levava minutos para congelar água. Também precisava descobrir se era possível criar gelo usando apenas a umidade do ar.

Como qualquer homem, Ryo não conseguia parar de pensar em como seria legal lançar uma lança de gelo no ar enquanto gritava algo como “Lança de Gelo!”. Ele realmente queria tentar. Primeiro, precisava aprender mais sobre gelo feito com magia de água. Depois, se conseguisse criar gelo com rapidez, talvez fosse possível usá-lo em combates contra monstros.

Assim que terminou o banho, saiu direto para o quintal para testar suas ideias.

“Gelo formado diretamente do ar! Lente de Gelo!”

Uma lente de gelo começou a se formar lentamente entre suas mãos, igual à que havia feito durante os testes para criar fogo. Demorou cinco minutos para completar a formação.

“Então é possível criar gelo direto do ar. Mas... demora, hein?”

Diferente do dia anterior, não precisou de balde para atingir o objetivo. Embora não soubesse disso, só esse feito já era algo impressionante.

A lente de gelo não derretia enquanto o usuário canalizasse magia por ela. Assim que o fluxo cessava, começava a derreter como gelo comum.

“Será que consigo fazê-la voar?” murmurou, observando a lente.

Então, lançou-a com força.

*Fwish, thud.*

Jogou a lente usando apenas força física. Ela descreveu uma parábola no ar e caiu no chão.

“Tá, então ela não voa. Quer dizer, é uma lente de gelo... era óbvio que não ia voar!”

Ele nem sequer falou a decepção em voz alta — guardou-a no peito.

Certo. Próxima tentativa: a tão aguardada... lança de gelo. *Lança de Gelo*.

“A magia de ataque definitiva do gelo!”

Como sempre, a imagem mental era o mais importante. Primeiro, visualizou um estalactite com trinta centímetros de comprimento.

“Lança de Gelo!”

Uma estaca de gelo começou a se manifestar em sua mão, mas levou muito mais tempo que a segunda lente. Dez minutos se passaram. Depois, quinze... e finalmente tomou forma.

“Perfeito, exatamente como imaginei. Agora... voe!”

*Fwish, thud.*

“Urgh!”

A lança de gelo, assim como a lente, seguiu uma parábola curta antes de atingir o chão.

“Eu tinha imaginado ela voando muito mais rápido... Talvez a imagem não tenha sido forte o suficiente.”

A *Bola d’Água* disparada de sua mão havia voado dez metros antes de cair, então por que a *Lança de Gelo* não conseguia fazer o mesmo?

“Será que ela é pesada demais? Não... A *Bola d’Água* era do tamanho da minha cabeça. Diria que os dois pesam o mesmo, então. Argh, não entendo. Talvez eu descubra se continuar tentando.”

Depois disso, repetiu os feitiços mais vezes do que conseguia contar.

“Bola d’Água.”

O tempo entre o feitiço e a ativação também ficou muito menor, provavelmente graças à prática constante. Na primeira vez, havia demorado cinco segundos. Agora, após dezenas de tentativas, o tempo havia caído para um segundo. Suas bolas de água também iam bem mais longe do que os dez metros iniciais.

Quanto ao poder de impacto... ainda era o mesmo da primeira.

“Haaa. Fiquei bom nisso, embora acho que nunca fui ruim na Bola d’Água. Agora é hora de tentar a Lança de Gelo com esse progresso. Como fiz com a bola, vou imaginar a lança saindo da minha mão direita.”

Ryo respirou fundo, soltou o ar e então entoou:

“Lança de Gelo.”

*Fwish, thud.* Assim que saiu da mão, caiu no chão.

“Lança de Gelo.”

*Fwish, thud.* Repetiu de novo e de novo, sempre com o mesmo resultado.

“Consegui reduzir o tempo de geração da lança, então isso é progresso... Mas por que ela não voa?”

Já havia disparado dezenas. Agora levava apenas um minuto entre criar e lançar.

Até que, enfim, sua energia mágica acabou — de novo, como no dia anterior.

“Droga, acho que vou desmaiar...”

Ryo cambaleou até a cama e mais uma vez sucumbiu à exaustão.

Quando acordou em seu quarto dia em Phi, ainda não havia resolvido o mistério da *Lança de Gelo*. Mas naquela manhã, um problema mais urgente se impunha: o estômago vazio...

Pensando na sua vida até agora nesta segunda chance, percebeu que só havia comido carne seca. Na verdade, tinha quase certeza de que só havia almoçado nesses últimos dias. Apesar de não ser glutão, ainda era um jovem saudável de dezenove anos — então era natural sentir fome comendo tão pouco.

Seria irônico morrer de fome mesmo com os dois meses de provisões deixados por Falso Miguel... Como enfrentaria Falso Miguel se acabasse reencarnando de novo?

Primeiras coisas primeiro.

Ryo abriu a porta do silo e entrou. O interior era tão gelado quanto um freezer. Fazia sentido, já que as paredes eram feitas de gelo. Ele suspeitava que fosse magia de água... mas o gelo que Ryo criava começava a derreter assim que ele parava de canalizar magia. Já as paredes do silo... não mostravam sinais de derretimento.

Isso significava que a magia de Falso Miguel ainda funcionava aqui no mundo físico? Ou seriam essas paredes uma manifestação do potencial desconhecido da magia de água? De qualquer forma, Ryo estava fascinado. No futuro, também queria desvendar esse enigma. Mas por agora... precisava encher o estômago!

Carne seca era prática e rápida, mas era o quarto dia ali e ele já estava cansado dela. Tinha vontade de comer carne de verdade, grelhada!

Ele vasculhou o conteúdo do silo e viu vários tipos de carne animal e de monstros, todos congelados e bem organizados. Carcaças inteiras de coelhos, javalis, algo parecido com aves e mais... Havia também cortes separados de cada um.

“Aposto que o Falso Miguel deixou assim de propósito, dos dois jeitos, pra eu saber quais partes são comestíveis quando for cortar. Ele realmente é um homem incrível.”

Profundamente grato pela previsão de Falso Miguel, Ryo pegou dois pedaços de carne que pareciam coxas de coelho.

“Estão duros como pedra. Espero conseguir descongelar. Vamos ver o que acontece se eu levar lá pra fora... Tomara que comecem a descongelar.”

Saiu do silo com um pedaço em cada mão e colocou ambos dentro do balde — seu balde multiuso e super prático! O sol começava a subir no céu e iluminava a carne, mas as coxas de coelho continuavam congeladas.

“Significa que eu mesmo vou ter que descongelar, já que sou mago da água...?”

Ergueu a mão direita sobre uma das peças e visualizou as ligações de hidrogênio entre as moléculas da água congelada se desfazendo.

“Hã? Não tá funcionando. Parece que algo tá me repelindo.”

As ligações entre as moléculas de água não se desfaziam — e isso criava um ciclo de bloqueio dentro da mente de Ryo.

“Talvez seja porque eu não fui quem criou esse gelo? Será que ele tá me rejeitando porque foi o Falso Miguel quem o fez?”

Mesmo assim, Ryo não podia desistir. Precisava comer para sobreviver.

Como foi Falso Miguel quem preparou tudo para ele, era altamente improvável que tivesse deixado carne congelada esperando que Ryo a comesse assim mesmo. Afinal, Falso Miguel era um homem extremamente talentoso e competente — o que significava que a carne podia, sim, ser descongelada!

A confiança de Ryo em Falso Miguel era imensa.

“Vamos tentar com calma. Não tem por que se apressar.”

Ao invés de tentar descongelar a coxa inteira de uma vez, decidiu focar em uma única seção. Visualizou sua magia sendo direcionada para aquela área, desfazendo as ligações moleculares, e depois passou para a seção vizinha. Assim, movendo-se devagar de um ponto ao outro, removendo as ligações moleculares, o gelo foi derretendo.

Depois de longos quinze minutos, uma das coxas de coelho estava completamente descongelada. A outra, mesmo com todo o tempo que passou, continuava rígida como pedra, sem qualquer sinal de derretimento.

“Michael, sua magia é incrível! Vou deixar essa coxa congelada como está para experimentar depois. Quero ver o que acontece se eu assar com o gelo do Michael ainda cobrindo a carne.”

Ryo preparou a lenha e a casca da palmeira-do-cânhamo preta no quintal, depois foi até a cozinha procurar tempero. Por coincidência, o único tempero que Falso Miguel havia deixado era uma quantidade absurda de sal. Voltou para fora, espetou a coxa descongelada num galho e salpicou sal por cima.

Em seguida, começou a fazer sua já habitual lente de gelo. Com inúmeras práticas, suas habilidades haviam melhorado drasticamente. Se antes levava mais de quinze minutos só para congelar água, agora conseguia fazer uma lente de gelo direto do ar em menos de dois minutos.

“Tô ficando bom nisso.”

Ficava feliz em ver o quanto havia evoluído.

Usando a lente, Ryo concentrou os raios solares sobre a casca preta da palmeira-do-cânhamo, ateando fogo. Assoprou as brasas para reacender a chama e então transferiu o fogo para a lenha, até criar uma boa fogueira. Quando ficou pronto, fincou o espeto da coxa ao lado do fogo e pegou a coxa congelada para segurar diretamente sobre as chamas. Mas não havia nenhum sinal de derretimento no gelo ao redor da carne.

“Isso é tão surreal...”

Conclusão: a carne congelada por Falso Miguel não derretia nem quando exposta ao fogo.

Enquanto conduzia seu experimento, a coxa descongelada assava perfeitamente.

“Hora de comer!”

Sua primeira refeição de verdade em quatro dias estava tão deliciosa que quase o fez chorar. E, de fato, ele chorou — foi a primeira vez que Ryo comeu chorando na vida.

Descongelou a outra coxa da mesma forma, depois a assou e comeu. Relaxado, refletiu sobre o que precisava fazer naquele dia. A primeira tarefa era entender por que não conseguia lançar sua *Lança de Gelo* com magia.

Sentia que ainda não havia encontrado a solução por falta de informação. Por mais que pensasse sobre o problema, nenhuma resposta surgia. Nesse caso, só restava continuar tentando coisas novas e esperar preencher as lacunas de conhecimento. Afinal, tinha todo o tempo do mundo.

Quanto à criação de gelo, já havia se tornado bem habilidoso. No entanto, se alguém lhe perguntasse se conseguiria usar essa habilidade numa batalha contra monstros, ele teria que admitir que ainda era um grande desafio. Levava um minuto inteiro para formar uma *Lança de Gelo* e lançá-la — e ainda assim, ela não voava como esperava. Sua *Lente de Gelo* levava dois minutos para ser feita. Ainda assim, em ambos os casos, havia reduzido bastante o tempo em relação às primeiras tentativas.

Mas não era o suficiente. Em uma luta contra monstros, sua vida estaria em jogo. Não havia espaço para atrasos. Precisava dominar suas técnicas a ponto de formar gelo em apenas um segundo, no formato que desejasse.

Ao perceber isso, decidiu tentar criar outras formas com seu gelo: uma lança de dois metros, talvez uma tábua, um pilar ou até uma parede...

Enquanto pensava nisso, percebeu outra coisa: o gelo precisava ser resistente. Lembrou-se de que gelo extremamente duro, que não derretia facilmente, existia mesmo na Terra. O gelo é menos propenso a derreter quando todo o ar da água é removido. Uma das formas de conseguir isso era ferver a água antes de congelá-la.

Agora, se Ryo quisesse gerar um gelo relativamente duro, como faria isso? Para evitar que o ar entrasse durante o congelamento, decidiu tentar congelar de dentro para fora.

Normalmente, a água congela de fora para dentro, e é assim que o ar acaba preso em bolhas dentro do gelo. Mas Ryo podia usar sua magia para começar pelo centro! Era só isso. Com esse método, conseguiria produzir um gelo mais resistente do que os que vinha fazendo até então.

Ryo acreditava em sua teoria. Enquanto mastigava sua carne seca habitual no almoço, concentrou-se intensamente em criar gelo. Da mão direita, esquerda, dos pés... Visualizou todos os cenários possíveis.

Estava tão absorvido em seu trabalho que se assustou quando percebeu que já era fim de tarde.

“Droga, preciso tomar banho.”

Jantou, tomou banho e voltou para o treinamento mágico. Que vida refinada a dele. Ryo não podia estar mais feliz.

No quinto dia em Phi, Ryo queria revisar tudo que havia aprendido até então. No café da manhã, repetiu o que havia feito no dia anterior: pegou uma coxa de coelho do silo, descongelou, acendeu o fogo, assou e comeu... Tudo de forma tranquila.

Como no dia anterior, continuou a treinar a criação de gelo. Graças aos seus esforços, agora levava apenas vinte segundos para criar tanto uma *Lança de Gelo* quanto uma *Lente de Gelo* — mas isso ainda estava longe de ser útil em combate. Além disso, ainda não conseguia fazer a lança voar, tornando-a inútil numa luta. Também não possuía qualquer conhecimento sobre técnicas reais de autodefesa, nem onde poderia aprender.

Ryo ao menos sabia que precisaria da habilidade de criar gelo pelo resto da vida, e era por isso que precisava aperfeiçoá-la a ponto de se tornar algo tão natural quanto respirar.

Enquanto comia sua carne seca, sua mente fervilhava com ideias de lanças de gelo, tábuas, pilares, paredes e mais. Criar e derreter, derreter e criar. Repetiu esse ciclo inúmeras vezes. Assim que terminou de comer, passou o restante da tarde criando gelo. Ryo permaneceu imerso em seu treinamento até algo cair sobre sua bochecha, fazendo-o olhar para o céu.

“Chuva...?”

Era a primeira vez que chovia desde que ele renascera neste mundo.

“Ha, é um bom momento pra parar. Melhor aproveitar e tomar banho.”

Ryo com certeza vinha falando sozinho com muito mais frequência desde sua reencarnação...

Como as janelas da casa feita por Falso Miguel não tinham vidro, Ryo as cobriu com tábuas de madeira para evitar que a chuva entrasse. Não havia lâmpadas, lanternas ou fogo em nenhum dos cômodos, então o interior ficava completamente escuro.

Até ontem, isso nunca havia sido um problema — depois do banho, ele sempre saía para praticar magia até sua energia se esgotar. Depois, voltava para a cama e apagava. As janelas abertas permitiam que a luz da lua iluminasse os cômodos, mas ele nunca tinha parado pra notar.

Hoje, no entanto, era diferente. Por causa da chuva e das janelas fechadas, nenhuma luz lunar entrava na casa.

“Mas isso não muda nada no meu treino de magia.”

Após o banho, deitou-se na cama e voltou ao treinamento. Em vez de deixar o gelo derreter após criá-lo, sublimava a água em gás, que era absorvido pelo ar ao redor. Assim, evitava encharcar a cama. Com os esforços combinados de ontem e hoje, agora levava menos de cinco segundos para formar gelo, dependendo do formato.

Foi mais ou menos nesse momento que a energia mágica de Ryo se esgotou novamente naquela noite. Ele desfez a *Lança de Gelo* recém-criada e deixou o sono levá-lo. E assim, durante mais uma semana, continuou completamente imerso em seu treinamento de criação de gelo.