Nv. 99 Princesa da Chama Negra

Capítulo 37

Nv. 99 Princesa da Chama Negra

“Ele não vai voltar”, pensou Eunha ao olhar para a entrada do restaurante. Si-u havia saído dizendo que atenderia uma ligação, mas não voltava.

O grupo militar que fazia guarda na entrada já tinha partido, embora provavelmente ainda a estivessem vigiando de perto.

— Vamos sair daqui primeiro.

Ficar parada na entrada prejudicaria os negócios, então era melhor ir embora. Eunha deixou o restaurante com Minju.

— Yura. — encontrou Si-u no momento em que ele estava para entrar. Seu rosto estava estranhamente tenso. — Me desculpa, mas parece que vou ter que ir primeiro. Tenho um assunto para resolver.

A ligação devia ser importante. Eunha assentiu.

— E o que eu faço com isso aqui?

Eunha estendeu a essência de portão para Si-u. Ele disse — Isso é… — e hesitou, enquanto Minju espiava com a mão na de Eunha.

— Você pegou, então é seu.

Os olhos azuis de Si-u se voltaram para o garoto. Ele sorriu e curvou os olhos castanhos.

— Você não pode ficar com isso?

— …

Aquilo… estava certo?

Eunha olhou para a essência de portão e a colocou de volta no bolso. Si-u ainda estava fitando Minju com uma expressão indecifrável, mas então se virou para Eunha.

— …Yura, você tem alguma relação com os Estados Unidos?

— Estados Unidos? — Eunha terminou de guardar a essência e inclinou a cabeça. — Não. Na verdade, não.

No passado, ela planejava estudar lá, mas nunca foi. Nem a passeio.

— Entendo…

O rosto de Si-u voltou a se fechar. Ele poderia ter perguntado mais uma vez se ela realmente não tinha ligação nenhuma. Mas não o fez. Justo quando mergulhava nos pensamentos, um toque soou. Era o celular de Si-u. Ele fez um clique de língua e atendeu.

— Estou indo. — Encerrou a chamada de forma agressiva. Aqueles poucos segundos de ligação pareceram irritá-lo profundamente, pois ele se virou com a expressão rígida no rosto.

— Vou indo. Falo com você de novo amanhã. E…

Seus olhos azuis encararam Minju uma última vez.

“Embora eu ache que ele não vá fazer nada.”

Si-u falou com voz dura após fitá-lo. — Me mande uma mensagem… quer dizer, me ligue se acontecer qualquer coisa. — Seus olhos frios ainda estavam fixos em Minju. Eunha achou aquilo estranho, mas assentiu mesmo assim.

— Eu ligo.

— Tem que ligar — Si-u enfatizou, depois virou a esquina com passos apressados, deixando Minju e Eunha para trás.

Eunha se virou na direção oposta à que Si-u seguiu e olhou para o garoto. Certo. Precisava resolver o que fazer com a criança…

— Garoto. Você tem algum parente ou outro familiar?

— Não — Minju respondeu de imediato. Não estava mentindo.

— E casa, tem?

— …No momento, também não tenho.

Era uma meia mentira. Era verdade que não tinha casa, mas morava na sede da guilda do Esquadrão, então aquilo seria seu lar. Mas Minju não fez esforço para explicar.

“Que problemão.”

Eunha olhou para o garoto e engoliu um suspiro. Eram cerca de 22h, o que significava que os transeuntes estavam voltando para casa e as placas das lojas começavam a apagar. Uma cena típica do mundo moderno com portões.

“O melhor seria levá-lo para casa agora e entregá-lo à polícia cedo pela manhã.”

Mesmo agora, o grupo militar suspeito ainda os observava. Não sabia o que poderiam fazer se simplesmente largasse o garoto na delegacia.

— Vamos para minha casa primeiro.

— Sua casa?

Minju arregalou os olhos.

— Sim. Se for desconfortável pra você…

— Não, eu adoraria! Quero ir, vamos logo!

Minju a interrompeu e começou a pular de empolgação.

“Uau! A casa dela?”

Era bem provável que ela fosse parecida com ele. E ela tinha uma placa de identificação dourada! Talvez tivesse todo tipo de objeto precioso como aquela placa na casa dela. Seu coração parecia dançar de expectativa.

— Mas antes…

Swish.

De repente, sua altura aumentou. Quando se deu conta, Minju percebeu que estava nos braços dela.

“Hã?”

Whip, whip, whip.

Ela chutou o chão e saltou como uma mola até o topo de um prédio de dois andares ali perto. Seus movimentos eram tão leves e ágeis, como um gato de rua subindo um muro de pedra, que ele não teve escolha senão sentir uma certa estranheza.

— Melhor despistarmos eles.

— …

— Você pode ficar enjoado. Está bem?

— Uhm… Estou bem — Minju respondeu sem perceber e piscou devagar. Nesse momento, Eunha saltou novamente, como se estivesse esperando.

Whip…

Dessa vez foi bem mais alto. Ele sentiu que quase podia tocar a lua no céu noturno. A mulher com a luz da lua às costas lançou os cabelos negros como seda. A cada piscada, a paisagem mudava com os sons do vento sendo cortado.

“Essa pessoa…”

Ele já achava que ela não era uma caçadora comum, mas aquilo superava qualquer imaginação. Todos os membros do Esquadrão eram altos rankers na Coreia, mesmo sem contar Minju, que era Rank S. Um alto ranker precisava ser habilidoso em ocultar os próprios sons, afinal essa era a forma mais simples e importante de sobreviver em portões de alto nível. Todos os membros do Esquadrão tinham capacidade para limpar portões de Rank A ou superiores. O fato de ela ter ouvido aqueles sons provava que também era capaz de fazer isso. E essa velocidade…

“O que ela é?”

Minju engoliu em seco ao ver a mulher que o carregava nos braços e pulava pelos telhados como se estivesse brincando de amarelinha.

“É estranho que eu não soubesse da existência de um talento desses.”

Havia um total de seis caçadores de Rank S na Coreia. Eles não só sabiam como os outros pareciam, mas também conheciam seus nomes verdadeiros.

“Exceto por aquele cara.”

Exceto por aquele tal de Lobo Branco ou Blackrang, que foi o último a entrar entre os Rank S e insistia em manter segredo.

Não era muito diferente entre os caçadores de Rank A. De todos os caçadores, apenas 0,01% eram Rank S. E, depois dos Rank S, só cerca de 0,2% eram Rank A. Um número muito pequeno, considerando que os caçadores de Rank D, E e F representavam 90%.

Isso significava que, se você estivesse nesse ramo há alguns anos e fosse Rank A por cima, acabaria encontrando outros caçadores da sua faixa pelo menos uma vez, mesmo que não gostasse deles. Mesmo que não se encontrassem dentro dos portões, acabariam se cruzando em leilões ou mercados de sistema. Por isso, ele achava estranho. De onde essa mulher tinha saído?

Minju olhou para trás, ainda nos braços de Eunha.

Tsk. Ele clicou a língua baixinho e se virou de novo. Pelo jeito, os sons haviam desaparecido por completo, deviam tê-la perdido logo no começo. O futuro do Esquadrão era mesmo sombrio.

“Acho que vou ter que treiná-los de novo. E…”

Minju lançou um olhar para Eunha, que ainda o segurava como uma princesa.

“Preciso ficar de olho nela.”

No entanto…

Como se fosse para envergonhá-lo por pensar assim, Minju logo descobriu quem ela era.

— …Não pode ser.

A casa de Eunha. No momento em que tirou os sapatos e entrou no cômodo, os olhos redondos de Minju encontraram algo preto.

“Um vestido?”

O objeto pendurado no armário branco como neve era com certeza um vestido. Minju abaixou os olhos depois de encarar a renda e o laço caídos.

“Isso…”

Ele se agachou e pegou algo com a mão. Era uma sombrinha preta. No instante em que a segurou, uma lembrança passou por sua mente. Tinha acontecido recentemente, na sede.

— Mestre, viu isso aqui?

Junhwan estava dando gargalhadas na frente da TV quando de repente falou. Minju estava prestes a terminar de montar a nova Bazuca Explosiva e provavelmente respondeu sem dar atenção.

— O quê?

— Aqui, essa mulher. A Princesa da Chama Negra, sei lá. É absurda.

Minju, com a chave de fenda na mão, lançou um olhar à TV. Na tela, havia uma mulher de vestido preto, com cabelos e olhos pretos.

“Hmm. Uma caçadora de conceito.”

— É. Mas ela age diferente dos outros caçadores de conceito. Olha só. Isso são habilidades de uma caçadora de conceito, e ainda por cima Rank F? O que acha, Mestre?

— O que eu acho? Deve ser edição — Minju respondeu com indiferença e largou o assunto. — Desliga essa TV ou muda de canal. Está barulhenta demais.

Esses programas de entretenimento não o interessavam, por isso nem olhou direito. A ‘fofura’ que ele estava prestes a completar era mais importante do que qualquer caçadora de conceito da televisão. Porém…

“Ela é a Princesa da Chama Negra?”

Minju deixou a sombrinha cair. O fato de ela ser a Princesa da Chama Negra nem era o mais chocante. O que mais o surpreendia era…

“Eu achei que ela fosse parecida comigo.”

O fato de ela gostar de rococó, e não de militarismo.

Thud.

Minju desabou no sofá. A felicidade que sentiu ao encontrar uma alma gêmea evaporou, deixando apenas decepção. Se soubesse disso antes, não teria seguido ela até em casa.

“…Será que eu volto?”

Enquanto rolava no sofá, sentiu algo estranho sob os dedos. Quando se virou…

— …!

O queixo de Minju caiu até o chão.

“I-I-I-Isso! …Um uniforme militar?!”

Era como se incontáveis pontos de exclamação tivessem surgido acima da cabeça minúscula de Trapaceiro. Essa textura, esse padrão…! Era com certeza um uniforme militar.

“E não é qualquer uniforme.”

Minju esticou a mão trêmula. O bordado com asas no peito direito e os protetores de couro preto que envolviam pulsos e tornozelos diziam tudo: aquilo era herança dos caçadores da velha geração, da época em que eram recrutados!

“É uma relíquia inacreditável que só os caçadores da primeira geração usaram, daquelas que nem dá pra comprar porque não existem mais.”

Ele nunca tinha visto um antes. Estendeu os dedos com cuidado para checar o peito do uniforme. Infelizmente, não havia nenhuma plaqueta de nome. Isso poderia diminuir o valor… mas havia algo ainda mais incrível.

Alças de ombro verdes.

“Isso…”

— Quer dormir na cama? Eu durmo no sofá.

Minju virou a cabeça ao ouvir a voz de Eunha atrás de si. Ela havia trazido cobertores extras e estava parada ao lado do sofá.

— …Moça.

Minju moveu os lábios, que tremiam levemente. O vento soprou pelas cortinas da janela entreaberta. O rosto de um menino se aproximou de onde a cortina havia passado.

— Onde você comprou isso?

Twinkle twinkle…

Os olhos do garoto brilhavam como nunca.


— Ah, ele está vindo agora.

Jehwi desligou o telefone e voltou hesitante ao seu lugar. A mulher sentada à sua frente havia se apresentado como Catherine.

Catherine era uma mulher bonita, com terno elegante e óculos de armação angular perfeitamente ajustados, mas tinha o cabelo enrolado com tanta precisão que parecia não tolerar um fio fora do lugar, o que lhe dava um ar maduro e impecável.

— Eu estava preocupada por vir de repente com um pedido tão pesado, mas é um alívio que tenha aceitado prontamente.

Ela sorriu ao ajustar os óculos com o dedo. Jehwi respondeu

— Uhm, tudo bem — e devolveu um sorriso constrangido, enquanto pensava: “Na verdade… não foi tão prontamente assim.”

Jehwi sabia, por estar há muito tempo ao lado de Si-u, que o humor dele mudou na hora em que ouviu ‘Princesa da Chama Negra’.

Jehwi ergueu a xícara e observou a mulher à sua frente.

“O coreano dela é tão fluente. Nenhuma pronúncia ou entonação estranha.”

O broche no lado esquerdo do peito dela brilhava de forma excepcional. Tinha um casco dourado com a letra C gravada.

“É o distintivo da Chaser…”

Ele nunca tinha visto um de verdade.

Embora a Chaser fosse uma guilda americana, não era grande. Era uma guilda histórica, fundada nos primeiros dias dos portões.

“Ouvi dizer que o mestre da guilda Chaser era um caçador famoso que serviu como coronel nos EUA.”

Essa era a única informação que tinha do exterior. Nem mesmo na América havia muitos dados, então era impossível saber algo aqui na Coreia.

“Pra trabalhar com uma guilda como a Chaser, precisa ser tão bom assim em idiomas estrangeiros?”

Catherine deve ter notado o olhar curioso de Jehwi, pois ergueu os olhos da xícara e sorriu.

— Está interessado na nossa guilda?

— Ah, me desculpe. É que achei curioso… por ser tão misteriosa.

— Verdade.

Ela baixou a xícara e olhou para o distintivo no peito.

— Eu também não sei muita coisa sobre a Chaser.

— Perdão?

— Embora eu tenha o distintivo, não sou exatamente afiliada à Chaser. Sou da subsidiária, a Clamp Management.

Catherine colocou seu cartão de visitas sobre a mesa de vidro polido.

“Uau… Até o cartão tem detalhes em folha de ouro… espera management… alguém do mesmo ramo?”

Ele pensou que talvez falassem a mesma língua. Trocaram cartões e conversaram tomando um chá quente. Como Jehwi esperava, os dois da mesma área tinham muitas coisas em comum. Como o fato de ambos terem burros teimosos como superiores.

— Uma vez fui a Pequim a trabalho por ordem do diretor. Era aniversário da minha esposa naquele dia… haha. Por isso fiquei um tempo sem ver carne em casa.

— Entendo. Adiei toda a minha agenda e vim correndo para a Coreia. Provavelmente não volto mais pra casa quando retornar aos EUA.

— Sofremos muito, né.

Os dois se olharam e sorriram com empatia. Era como se estivessem conectados, mesmo sem dizer mais nada.

E logo, a porta se abriu com um estrondo.

Bam!

— Ah, Mest…

— É ela? A convidada de que você falou?

Era Si-u.