Capítulo 641

Há alguns meses, Jalen estaria extremamente feliz em saber que seria surpreendido em silêncio rotineiramente. Vermil tinha sido uma fonte inesgotável de diversão — mas isso não era mais engraçado.

Jalen descobriu que não gostava tanto de surpresas quando era o alvo delas.

Gostava ainda menos quando, mesmo após a revelação, elas não faziam absolutamente nenhum sentido.

A pessoa que havia invadido os Arquivos, que havia cortado Imbuições com tal precisão cirúrgica que ele estava convencido de que era um dos magos mais fortes que o império já tinha visto, era o membro medíocre e paranoico de sua própria família que mal tinha chegado ao Ramo Principal.

Impossível. Nada se encaixa. Será que ele está trabalhando com outra pessoa? Talvez a verdadeira ameaça esteja longe, conseguindo o que quer que eles tenham vindo buscar, enquanto o Pai ficou para trás como uma distração com um plano para me confundir completamente.

Mas, se for esse o caso... como o Pai foi forte o suficiente para rejeitar meu ataque daquele jeito?

“Se tem alguém que não deveria estar aqui, esse alguém é você”, disse Jalen. Ele estalou o pescoço. “Com quem você está trabalhando, Pai? Você tem a menor ideia do que está tentando liberar sobre o império?”

“Eu apostaria que sei muito mais do que você”, respondeu o Pai. Houve um leve tilintar quando ele mudou seu peso e estendeu a mão para o seu manto. Ele caiu do seu corpo, revelando dezenas de correntes vermelhas pesadas penduradas no corpo do Pai como enfeites em uma árvore de Natal. Elas envolviam seu corpo e prendiam seus tornozelos, deixando-o com espaço apenas para se arrastar.

Ele é um prisioneiro? Ele certamente não parece estar sob coação.

“Eu não me candidatei a fazer parte do seu fetiche de bondage”, disse Jalen, estalando o pescoço. “É hora de parar de brincar, Pai. Eu não sei o que você está tramando, mas você está brincando com forças muito mais perigosas do que imagina. Todo o trabalho que você fez para entrar no Ramo Principal não vai ser particularmente útil se você morrer aqui.”

Os lábios do Pai se esticaram em um sorriso fino, mas a diversão ainda não alcançou seus olhos.

“Qualquer respeito que eu possa ter por suas habilidades é manchado por sua personalidade insuportável”, disse o Pai. “Eu gostaria de dizer que me diverte que você tenha chegado agora, de todos os momentos, mas receio que simplesmente não me importo. Depois de todos esses anos de espera, eu tenho o que preciso.”

“Não me dê sermões sobre esperar. Eu sou centenas de anos mais velho que você.”

O sorriso do Pai se alargou. E, por um breve momento, o que quase pareceu uma diversão genuína brilhou por trás de seus olhos escuros.

“Ah, eu duvido muito disso. Eu estive esperando por um muito tempo. Você sequer tem alguma ideia do que é este lugar, Jalen? Do que ele guarda?”

“Eu acho que nós dois sabemos. É um arsenal de antes da Longa Noite — e é por isso que é tão importante que nada disso vaze. Você nunca foi estúpido, Pai. Você tem que saber o que aconteceria se armas como essa saíssem para o Império. Nós nos destruiríamos. Nem seria divertido. Tudo simplesmente desapareceria.”

Jalen discretamente usou seu poder, canalizando suas Runas enquanto mantinha sua magia escondida por seu domínio.

“Errado”, disse o Pai.

Jalen franziu a testa. “O quê?”

“Isto não é um arsenal. É um túmulo. Existem civilizações do passado distante nas quais um rei era enterrado com todos os seus servos. Todos estão vestidos em riquezas e fortunas para proteger o corpo do verdadeiro rei de ser saqueado. Assim são os Arquivos. Aqui jaz um diamante escondido dentro de pilhas de ouro.”

“Fascinante”, disse Jalen. “Conte-me mais.”

E então ele enviou um raio espacial estalando pelo ar. Rachaduras pretas se abriram mais rápido do que o olho podia seguir, cobrindo o chão entre ele e o Pai antes que o estalo de sua passagem pudesse sequer ecoar.

O raio atingiu a palma da mão do Pai e se estilhaçou como fragmentos de vidro quebrado. A expressão do Pai sequer mudou enquanto eles giravam por ele inofensivamente.

“Dentro dos Arquivos repousa um artefato”, disse o Pai, imperturbável. “Um tão poderoso que um reino foi destruído para mantê-lo escondido. Um artefato cujo mero toque destruiria um mago abaixo do Rank 7.”

“O que você está dizendo?”, perguntou Jalen, tentando esconder o mal-estar crescendo dentro dele. Essa foi a segunda vez. Duas vezes, o Pai tinha impedido completamente seus ataques de acertarem o alvo sem o mínimo esforço.

“O Império de Arbalest. Tantas mentiras. Tantas coberturas. Tanta decepção que nem mesmo os enganadores sabem que a verdade em que acreditam não é nada além de outra mentira”, disse o Pai com uma risada oca. “Uma guerra foi travada para esconder um artefato. E, quando terminou, os sobreviventes covardes estavam com muito medo para reivindicar seu prêmio. Então eles o trancaram. Eles procuraram os magos mais fracos da região e enviaram ondas de monstros contra eles, armando os magos com armamento mágico e os reunindo em quatro grandes cidades.”

“Que porra você está falando?”, perguntou Jalen, usando o tempo que o Pai estava desperdiçando monologando para convocar ainda mais de seu poder. Seus ataques não estavam funcionando. Ele tinha que tentar algo mais. Algo mais drástico — mas ele não sabia o quê.

“Quando os magos fracos conseguiram lutar contra os monstros, a última isca foi colocada. Disseram-lhes para esconder as armas, para proteger seu reino de ser destruído. O artefato foi enterrado junto com eles, e todos os vestígios dos magos fortes desapareceram. Claro, havia aqueles que viviam fora daquele continente. Aqueles que eram poderosos — mas os covardes eram espertos. Eles tinham mentiras para eles também. Um experimento. Um teste, para ver quais novas runas poderiam ser desenvolvidas por magos que cresceram independentemente dos recursos completos do mundo. Tal é a maior mentira. Uma forjada na verdade.”

“Você está cheio de besteira”, disse Jalen através de uma risada, mas ele estava apenas ganhando tempo. “Você está me dizendo que a Longa Noite foi falsa? Que os Bastiões, cujo propósito é defender as armas mortais daquela guerra, são apenas... o quê, isca? Nada mais que uma história de fachada?”

“Não há apenas neste mundo”, disse o Pai. “Os Bastiões são estoques de armas. Guardiões foram selecionados para protegê-los, pois poderiam causar grandes danos ao império. Eles são escolas. Eles são institutos de pesquisa. Aqueles que avançam para o Rank 7 são removidos do império, e eles frequentemente têm novas percepções sobre runas. Tudo isso é verdade.”

Uma sensação de afogamento instalou-se no estômago de Jalen. Havia algumas peças demais que se encaixavam bem no que o Pai disse. Simplesmente não fazia sentido para ele mentir. Jalen não tinha conseguido sequer tocá-lo.

Mas, se ele não estava mentindo...

“Os Rank 7 são removidos do Império porque apenas um Rank 7 pode tocar o artefato”, disse Jalen. “É isso que você está insinuando?”

“A lacuna entre 6 e 7 é grande”, disse o Pai. “Uma que danificaria o delicado equilíbrio em que este reino se encontra. Uma que permitiria a um mago tentar canalizar o artefato que está escondido dentro do reino. Genial, não é? Verdade dentro de mentiras. Mentiras dentro da verdade. Tudo foi tão cuidadosamente elaborado. Os registros dos túmulos foram expurgados muito completamente, mas a informação nunca pode ser verdadeiramente apagada. Peças sempre permanecem. Fragmentos de informação conhecidos por cada uma das famílias de magos. Felizmente, eles nunca seriam compartilhados. Afinal... vocês se odeiam. Vocês foram criados para se odiarem.”

“Quem é você?”, perguntou Jalen.

O Pai lhe deu um sorriso vazio. “Eu usei nomes o suficiente para perder a conta. Eu fui um Rei. Eu fui um Herron. Um Rivven. Um Torrin. Eu passei por quase todas as famílias neste reino em minha busca por conhecimento. Já faz tanto tempo que eu uso meu próprio nome que quase o esqueci.”

“É por isso que você queria acesso ao Ramo Principal”, murmurou Jalen. “Você estava tentando ler nossos registros?”

“Não é tão impressionante descobrir uma vez que eu já revelei para você”, disse o Pai. As correntes penduradas em seu corpo tilintaram. Pequenas imbuições cobriam suas superfícies, tão pequenas que Jalen mal conseguia vê-las. “Você certamente facilitou. Por mais anos do que até mesmo você pode contar, eu me escondi. Eu apodreci na escuridão, reunindo informações e evitando ser notado. Levou séculos para eu estar neste lugar.”

Então é por isso que o desgraçado nunca saiu do quarto dele. Deve estar Imbuído até a alma para esconder a presença dele.

“É realmente sábio admitir que você é mais fraco do que quem quer que esteja protegendo o Reino?”, perguntou Jalen, arqueando uma sobrancelha. “Se você está se escondendo, então tem um bom motivo. E você está exposto agora. Aquele protetor está vindo atrás de você.”

“Apenas um tolo superestima seu poder, mas eu não serei mais fraco por mais tempo”, respondeu o Pai simplesmente. Ele levantou uma mão e as correntes que o cobriam tilintaram. Pequenas imbuições cobriam suas superfícies, tão pequenas que Jalen mal conseguia vê-las. “E eu permaneço escondido. Vá em frente, Jalen. Lance outro ataque. Meu poder está restrito, afinal. Eu tenho certeza de que o terceiro vai funcionar.”

A mandíbula de Jalen se apertou.

Ele obedeceu o Pai e abaixou a mão, cortando o ar. Uma lâmina de matéria negra brilhou através da sala. Ela atingiu a mão estendida do Pai e se estilhaçou, assim como os últimos ataques.

Droga. Isso está me irritando seriamente. Eu não consigo nem sequer tocar nele.

Isso é ruim.

Se ele consegue ignorar meus ataques tão efetivamente... então, no momento em que ele decidir me atacar, todas as probabilidades apontam para a minha morte.

Que merda. Que patético.

“Obrigado pela sua atenção”, disse o Pai. Ele levantou a mão em direção a Jalen. “Eu sonhei com este momento por tanto tempo. Eu devo admitir que ter uma audiência o tornou mais agradável — mas seu propósito foi cumprido. Eu não permitirei nenhuma interferência na etapa final.”

“Você acha que é tão esperto?”, perguntou Jalen, arqueando uma sobrancelha. E, enquanto ele falava, ele alcançou profundamente dentro de si — por suas Runas. Ele se recusou a desistir assim. Ele não podia deixar que este fosse o fim. Se ele ia morrer, ele pelo menos ia lutar até o fim. “Mas se você resumir tudo o que acabou de me dizer, pode ser resumido dizendo que algum mago Rank 7 extravagante se escondeu como um bebê covarde até que ele pudesse roubar um porrete. Isso é bem patético.”

“Você não pode me provocar para a raiva. Tais emoções há muito tempo definharam. Adeus, Jalen.”

O Pai apertou o punho.

Houve um baque suave, como um pão sendo derrubado no chão. Uma brisa leve passou por Jalen.

Ele olhou para baixo.

Havia um buraco do tamanho de um prato no centro de seu peito. Jalen conseguia ver o chão atrás dele através dele, onde seu coração tinha estado. Seu corpo nem sequer tinha percebido que tinha sido cortado ainda. O sangue estava apenas começando a surgir em volta das bordas de órgãos perfeitamente cortados agora expostos ao ar.

“Oh”, disse Jalen.

O Pai se virou.

---

E Jalen, chefe da Família Linwick, caiu sem outra palavra.