
Capítulo 997
Terramar: O Mar Encoberto
Enquanto Lily caminhava devagar pelo caminho rumo à escola, sua mente permanecia fixada nas palavras de seu pai, ditas anteriormente: O que você quer fazer no futuro?
Seu principal objetivo ao se matricular na academia era justamente encontrar a resposta para essa pergunta. No entanto, mesmo com a formatura se aproximando, ela ainda não tinha sequer uma pista de qual rumo seguir.
O que eu quero fazer no futuro… Ser como Maya, conseguir um emprego estável e viver em paz? Ou devo seguir o exemplo da mamãe, casar com um homem comum e ter meus próprios filhos?
O simples pensamento de um futuro assim fez Lily sacudir a cabeça vigorosamente. Com certeza, não era a vida que ela desejava.
Devo usar meus poderes para proteger a Ilha da Esperança? Tornar-me a guardiã de todos? Mas os mares estão calmos agora. As maiores confusões são apenas pequenas disputas entre os governantes das ilhas. A Associação dos Exploradores pode mediar facilmente essas situações. Não há espaço para mim…
Enquanto sua mente mergulhava em diversos pensamentos, ela chegou sem perceber às portas da academia. Hesitou por um momento antes de entrar.
O conhecimento que adquirira na academia era inútil na hora de encontrar seu propóstio de vida. Ela precisaria buscar essa resposta por outros meios.
Por isso, seguiu direto para a biblioteca, na esperança de encontrar uma solução. A biblioteca da Ilha da Esperança tinha quase uma cópia de todos os livros publicados no Mar Subterrâneo. Exceto por alguns textos proibidos; praticamente todos os títulos estavam disponíveis.
Ela acreditava firmemente que, certamente, haveria um livro capaz de solucionar seu dilema.
Lily passou horas na biblioteca naquele dia. Pulou refeições e mergulhou de livro em livro. Mas nenhuma delas trouxe a clareza que ela buscava.Sentada em uma escada alta, Lily vasculhava as volumes espessos em busca do próximo livro quando ouviu uma voz confusa vindo de baixo."Lily? O que você está fazendo aqui? Procuro por você a manhã toda."
Ela olhou para baixo e viu um rosto conhecido, surpreso, olhando para ela. Era sua amiga, Maya.
"Ah, nada demais. Só tentando entender meu futuro," respondeu Lily enquanto descia a escada. Depois, começou a compartilhar seu problema com Maya.
"No passado, nunca dei muita atenção a essa questão. O Sr. Charles me convidou para embarcar no seu navio e foi ele quem tomou todas as decisões ao longo do caminho. Até o fim, foi ele quem decidiu me transformar de volta em humana."
"Eu não tinha que pensar em nada. Tudo o que precisava era seguir."
"Por quase dez anos, meu único objetivo foi voltar para perto dos meus pais. E agora que estou aqui, percebo que ninguém mais me orienta. Não sei o que fazer a seguir."
"Resumindo, não sei qual é o sentido da minha existência. Maya… estou muito perdida," Lily concluiu com uma expressão que misturava tristeza e amargura.
Se Lily ainda fosse a mesma de antes, talvez seu futuro ideal fosse simplesmente viver feliz ao lado dos pais, aproveitar comidas gostosas e vestir roupas bonitas todos os dias.
No entanto, ela já não era mais aquela Lily com uma visão tão simplista.
Seu conhecimento tinha transformado sua forma de pensar. Ela não era mais imatura e tinha sido forçada a amadurecer, percebendo que depender dos pais não levaria a lugar algum.
Mesmo assim, depois de todo esse tempo, ela ainda não tinha encontrado as respostas que buscava.
Embora Maya não pudesse entender completamente alguns detalhes que Lily mencionava, como voltar a ser humana, ela captava o sentido geral do dilema da melhor amiga.
"Então, é assim que é ser rica? Você é bonita e adina, mas ainda sente que a vida não tem propósito? Sério, eu trocaria de lugar com você num piscar de olhos para você ver como a vida de uma pessoa pobre também pode ser plena," brincou Maya, com um sorriso provocador.
Lily revirou os olhos na direção de Maya antes de puxá-la em direção às portas da biblioteca. "Você não consegue me ajudar a descobrir? Não é sua melhor amiga?"
"Como sua melhor amiga, preciso te lembrar que a formatura está logo ali. Seu único objetivo agora é passar nas provas finais."
A compreensão a atingiu como uma ducha fria, fazendo seu peito apertar. "Sim, ainda há as provas finais. Esse é o foco principal agora. Vamos lá! Precisamos revisar imediatamente!"
As duas começaram a dar alguns passos quando Lily sentiu uma leve mudança de movimento atrás dela. Olhou para trás e viu um velho encurvado, arrastando-se com uma pilha pesada de livros.
Ela o reconheceu — era Sarthe, o zelador da biblioteca. A cicatriz na testa dele deixou uma impressão marcante em Lily.
"O que houve?" Maya perguntou, com o braço entrelaçado ao dela.
Lily balançou a cabeça em sinal de negação. "Nada… deve ter sido minha imaginação."
Com isso, elas saíram juntas da biblioteca.
O velho parou na mesa onde Lily tinha estado sentada há poucos instantes e pegou o livro que ela estivera lendo — Como Encontrar o Propósito da Sua Vida.
Ele olhou para o título e levantou a cabeça em direção à porta por onde Lily desaparecera. Depois, subiu numa escada próxima e devolveu o livro ao seu lugar na estante.
À medida que a formatura se aproximava, Lily parecia ter encontrado um propósito temporário. Passar nas provas finais virou seu único objetivo, sem espaço para refletir sobre alguma crise existencial.
Com a semana de exames chegando, cada estudante estava tenso com o peso da responsabilidade acadêmica. Todos sabiam que fazer parte da primeira turma de formandos carregava um peso especial.
Se conseguissem se formar, o governador tinha prometido um futuro brilhante à frente deles.
Por outro lado, se não passassem, marcariam suas vidas para sempre — uma mancha em seus registros que macularia suas perspectivas futuras. Ninguém queria carregar esse fardo.
Logo, os dias tensos de provas chegaram ao fim. Após a correção pública das provas entre os colegas, os resultados finalmente foram divulgados.
Quando Lily e Maya descobriram que tinham passado, deram um abraço de alívio e alegria.
Ao ouvirem o entusiasmo dos estudantes, os representantes do Ministério da Educação da Ilha da Esperança refletiram a mesma alegria em seus rostos.
O investimento do governador nesse programa finalmente começava a mostrar resultados. Quando esses formandos entrassem no mercado de trabalho, os avanços tecnológicos de Hope Island certamente saltariam para novos patamares.
Nessa mesma noite, a academia organizou um baile de despedida. Os estudos intensos e o estresse do ano todo finalmente deram lugar a uma celebração cheia de energia.
Impulsionados pelo efeito do álcool, o refeitório virou uma festa caótica. Risadas e comemorações encheram o ambiente, com alguns estudantes se abraçando e até se beijando por conta da empolgação.
No entanto, Lily não participou da celebração. Em vez disso, voltou mais uma vez à biblioteca. Seus olhos estavam cheios de saudade ao olhar para os assentos que tanto ocupou e os livros que passou incontáveis horas lendo.
Ela estava prestes a se formar e provavelmente nunca mais voltaria a esse lugar. De repente, um sentimento de saudade surgiu dentro dela.
"Menina, você tá se sentindo perdida agora?" perguntou uma voz rouca e envelhecida que veio de trás de Lily.
Assustada, Lily se virou e viu que era o velho zelador da biblioteca, Sr. Sarthe.
Lily fez uma leve reverência, dobrando os joelhos com graça. "Sr. Sarthe, por que o senhor não foi ao baile?"
"Isso é coisa de jovens. Quero manter meus ossos inteiros por mais um tempo," disse o velho com um sorriso amigável, enquanto se aproximava de Lily.
Batendo levemente na cicatriz na testa, perguntou: "Sabe o que é isso?"
Lily olhou curiosa para a cicatriz grotesca e respondeu: "Sr. Sarthe, foi alguma ferida?"
Sarthe balançou a cabeça. "Não, criança. Era um triângulo invertido branco aqui."
Os olhos de Lily se arregalaram de choque. "Você era um seguidor do Deus da Luz?"
Ela sempre achou que Linda fosse a última crente restante e nunca esperou que ainda houvesse outro resquício.
"Era," admitiu Sarthe, hundindo-se numa cadeira próxima. Ele continuou a história e disse: "Sabe o quão perdido me senti ao descobrir que o deus em quem acreditava tinha morrido?"
"Cheguei a pensar em acabar com minha vida para segui-lo. Mas, graças a um amigo, não consegui. Fiquei em um profundo estado de confusão. Estava completamente perdido, assim como você está agora."