
Capítulo 978
Terramar: O Mar Encoberto
Sparkle não conseguiu segurar e segurou a mão direita de Charles ao ouvir aquilo. No entanto, a mão dele, marcada por cicatrizes, parecia a de um morto—estava extremamente fria, sem nenhuma calorosidade.
De frente para sua filha, Charles acrescentou: "Costumo pensar demais e me fixar de forma demasiado rígida nos detalhes insignificantes. Os aspectos mais essenciais da humanidade são seus pensamentos e sua existência."
"Afinal, os humanos são os observadores centrais da relação entre eles mesmos e o mundo. São seres sociais conscientes, e há um conflito constante entre suas ações e sua própria existência."
"Não se deve perturbar essa relação entre os humanos e o mundo ao seu redor. Existências como a minha, especialmente, deveriam evitar uma empreitada dessas."
"Papai, papai, acalme-se. Você está pensando demais e complicando tudo demais," disse Sparkle, apertando a mão dele nervosamente.
No entanto, Charles não lhe deu atenção e falou ainda mais rápido: "Diante disso, surge uma questão: qual é mais primordial? É o pensamento? A existência? É a consciência, ou é a matéria? Ou seja, qual deles surgiu primeiro?"
"Acredito que essa questão seja mais importante do que o desejo infantil e trivial de salvar a humanidade."
"O mundo nasceu dos pensamentos ou da consciência? Ou ele sempre existiu por si só? A essência e a base do mundo estão enraizadas na consciência ou na matéria?"
Percebendo que Charles a ignorava, Sparkle rangeu os dentes e teleportou-se para longe. A cena lá fora tinha mudado drasticamente. Havia órgãos amorfos, sangrentos e deformados por toda parte, todos ondulando como uma onda de maré.
Entre as "ondas", Sparkle viu algo mais—a mulher obesa, de pele pálida, cujo cabelo úmido grudava em seu couro cabeludo pálido. Seus cinco olhos estavam cheios de terror, enquanto levantava suas garrras rubras como sangue e clamava por ajuda a Sparkle.A mulher era a irmã mais nova de Sparkle, e mais da metade de sua figura tinha afundado no mar de carne e sangue. Charles estava no meio de devorar tudo na ilha.
"Não! Papai vai se tornar um deus assim! Preciso detê-lo!" Sparkle, com sua figura magnífica, cresceu ainda mais, e uma imensa massa de tentáculos, com centenas de metros de diâmetro, apareceu no ar.
A indescritível massa de tentáculos era a forma verdadeira de Sparkle. Ela havia ficado visivelmente maior do que antes. Se alguém de fora estivesse vendo, perceberia as distorções visuais anormais ao redor de sua figura bizarra.
A enorme forma de Sparkle desceu, derretendo-se no oceano de carne como uma gota d'água. Ela ficou cada vez mais nervosa ao nadar no mar de carne. O cérebro de seu pai não estava onde deveria estar, e ela não fazia ideia de para onde tinha ido.
A ausência do cérebro era perigosa. Cada segundo era crucial, e Sparkle precisava devorar as partes excedentes do cérebro de Charles o quanto antes, senão ele realmente se tornaria um verdadeiro deus!
Com esse pensamento, Sparkle se fortaleceu. Sua gigantesca forma tentacular explodiu. Os tentáculos, pontilhados com olhos fluorescentes verdes, nadavam pelo ilha como serpentes do mar, procurando pelo cérebro desaparecido.
Sabia que isso era perigoso. Se ela fosse sequer um pouco descuidada, poderia ser devorada pelo próprio pai. Contudo, Sparkle não se importava. Para ela, a vida do pai era muitíssimo mais importante do que a própria!
Os órgãos amorfos e a carne ao redor de Charles ondulavam rapidamente, cada vez mais rápido com o passar do tempo. Eles também proliferavam por conta própria, aumentando em número de forma cada vez mais acelerada.
Felizmente, eles permaneciam imóveis enquanto os tentáculos de Sparkle os atravessavam; pareciam tratá-la como uma de suas próprias!
Após alguns minutos de exploração, Sparkle finalmente encontrou o cérebro de seu pai na parte inferior esquerda do oceano de carne.
Infelizmente, o panorama era sombrio. O cérebro gigante crescia rapidamente e tentava se desprender da carne de Charles. Parecia estar no meio de uma transformação para uma existência que nem mesmo Sparkle podia discernir ou compreender.
Os tentáculos verdes de Sparkle espalharam-se em várias direções e se lançaram sobre o cérebro. Como uma faca quente cortando manteiga, eles penetraram e saíram do cérebro. Seus olhos fluorescentes verdes haviam sumido, substituídos por uma cavidade que consumia freneticamente o cérebro de Charles.
A força de Sparkle aumentava exponencialmente ao devorar cada vez mais partes do cérebro de Charles. Contudo, ela não se importava — seu único objetivo era salvar o pai.
A luta durou cinco dias inteiros até que o cérebro, cheio de buracos, finalmente parou de expandir e ficou silencioso.
Não, não posso esquecer meus motivos! Eu absolutamente não posso esquecer por que decidi me tornar um deus em primeiro lugar! São minha família, e eles têm a mesma espécie que eu!
Uma expressão de sofrimento marcou o rosto de Charles enquanto ele convulsionava no sofá.
Foi rápida uma explosão de luz branca, e Sparkle apareceu ao seu lado. Ela abriu os braços e abraçou Charles, enquanto cantarolava a canção de ninar reconfortante que Anna costumava cantar para ele.
No meio do canto, Charles apertou Sparkle cada vez mais forte, até que sua figura magnífica praticamente se fundiu ao corpo carnal dele. Sua sanidade começava a se recuperar, e seus olhos clarearam cada vez mais enquanto os segundos passavam.
Quando Charles voltou a si, a ilha finalmente silenciou. Recordando tudo o que tinha acabado de acontecer, Charles suou frio. Parecia que ele havia estado muito perto de se tornar um deus novamente.
Meu tempo está ficando cada vez mais curto? Será que consigo completar meus objetivos antes de realmente me tornar um deus? Charles sentiu que suas chances de sucesso haviam caído mais uma vez. Ele não temia a morte, mas tinha medo de ela.
Ele soltou Sparkle e a tirou de seu peito.
Charles foi acometido por uma onda de medo persistente ao relembrar o que acabara de acontecer. Se perdesse o controle, Sparkle estaria em perigo.
"Sparkle, não sei quanto tempo mais vou aguentar. No dia em que me tornar um deus, lembre-se de ficar bem longe de mim," avisou Charles.
Sparkle abriu os braços e abraçou Charles com força, colocando sua face clara contra o uniforme antigo do capitão.
"Papai, não se preocupe. Nada vai acontecer com você enquanto eu estiver aqui."
"Obrigado." O coração de Charles ficou aquecido. Ele voltou a envolver a filha em seus braços. Só nesses momentos ele realmente se sentia humano.
Depois de apreciar o caloroso momento entre ele e sua filha, Charles soltou Sparkle e lançou um olhar gentil para ela. "Sparkle, estou sério. Escute: estou seguindo meus próprios objetivos aqui, e eles não têm nada a ver com você."
"Você não precisa abrir mão de tudo para me seguir."
Os olhos de Sparkle ficaram vermelhos. "Papai, você é tudo o que tenho agora. Se você virar um deus, só posso te seguir."
Charles olhou para ela com uma expressão complexa. "Não, você tem mais do que apenas eu. Ainda tem sua mãe. Você sabe onde ela está, certo?"
"Você sabia disso, papai?" Sparkle ficou atônita. "Desculpe, não devia ter mentido para você."
Charles sorriu com calma e explicou: "Vi algo nas suas pós-imagens, e não vou te recriminar ou algo assim. Se algo acontecer comigo, vá procurar sua mãe."
A boca de Sparkle tremeu um pouco, mas ela, por fim, concordou com dificuldade.
Charles levantou as mãos, segurando delicadamente o rosto exímio da filha, dizendo: "Nossa Sparkle é tão bonita. Tenho certeza de que você puxou sua mãe."
Antes que Sparkle pudesse responder, Charles de repente puxou o rosto pálido da filha para o dele. Suas mãos trêmulas suavemente tocaram os cantos dos olhos de Sparkle, e ele murmurou, surpreso: "Minha querida filha… o que foram aquelas—?"
Sparkle levantou as mãos, colocando-as na parte de trás das mãos de Charles. Ela respondeu com calma: "São rugas, papai."