
Capítulo 183
Minha irmãzinha vampira
Eu, Sirius Moonreaver, só tive medo três vezes na minha vida.
A primeira foi no dia em que conquistei o título de Sirius. O Stardevourer e Sirius eram sinônimos da elite. O melhor que a Casa Moonreaver podia oferecer. No dia em que aceitei esse título, senti um medo instintivo de perder tudo que havia conquistado e de não estar à altura do que se esperava de mim.
A segunda foi no dia em que me tornei o Senhor da Casa Moonreaver. Poucos podem se tornar um líder de clã em uma idade tão jovem, e me senti completamente sozinho. Não havia muitos na Casa Moonreaver de quem eu pudesse confiar, e temia ser isolado.
E, finalmente, a terceira vez… foi exatamente neste momento.
Esse medo que eu tinha… Não era o medo de decepcionar ou de acabar sozinho…
Não, esse era um medo bem mais primordial.
Minha alma estava cambaleando, e meus joelhos não conseguiam sustentar meu corpo. Ao cair, senti um vazio infinito surgir no fundo do meu coração enquanto minhas funções corporais falhavam uma a uma. O peito estava comprimido, e minha mente mal conseguia formar um pensamento coerente. Mas o mais chocante de tudo era…
O Stardevourer também estava tomado de pânico.
Vibrando descontroladamente como uma folha de outono ao vento, o Stardevourer tentava desesperadamente escapar das minhas mãos e atravessar as dimensões.
A arma suprema da Casa Moonreaver, forjada com o sangue e as almas de todos os Sirius anteriores. Uma arma que nunca sentiu medo, mesmo ao enfrentar monstros como Dracula Bloodborne, o primeiro Vampiro, ou os Senhores Demônios do outro reino. A lâmina da ceifa foi criada para proteger a Casa Moonreaver, mesmo que isso significasse se autodestruir.
Mesmo quando a apontei contra o Demônio misterioso que poderia espalhar a Morte a cada golpe de sua foice, ela permaneceu firme.
Mas no momento em que aquele enorme relógio apareceu acima da cabeça de Jin Valter… O Stardevourer reagiu como se fosse um bebê diante de uma onça.
Isso… Não tinha acontecido antes?
Na primeira vez que enfrentei Jin Valter… Quando atravessei o Stardevourer por seu peito na tentativa de derrotá-lo… O medo nos dominou. Havia algo especial naquele menino, e não era sua linhagem. Nem seu poder como o Progenitor. Sempre havia algo escondido dentro de Jin Valter, algo do qual o Stardevourer tinha um pavor mortal.
E agora, esse algo finalmente mostrava seus dentes.
Minha alma e meu corpo foram destruídos enquanto eu caía completamente de joelhos. Não tive coragem de olhar para cima, temendo as consequências que poderiam advir. Mas, de alguma forma, meu instinto gritou para que eu desse uma olhadela. Era como se… Se eu não olhasse agora, me arrependeria dessa hora para sempre.
Por isso, olhei diretamente para o Sol, contrariando meus instintos primários de fugir e desviar o olhar.
Sangue escorria das órbitas dos meus olhos, e meu cérebro ficava mais pesado a cada segundo. O Stardevourer já havia fugido, abandonando a Casa Moonreaver e a mim, por temer que algo daquele Jin Valter, daquele "algo", pudesse nos alcançar. Mugindo de dor, resisti à pressão imensa que me collapsava e finalmente levantei a cabeça.
E lá vi…
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O que é isso?
Como Matriarca da Casa Everwinter, achava que já tinha visto de tudo.
Vi a ascensão e queda de nações. O nascimento da raça Vampira. Enfrentei guerras com a Igreja Sagrada e vivi as cruzadas. Estive presente quando os Demônios Externos invadiram a terra pela primeira vez, e o mundo deixou de lado suas diferenças para assinar um tratado de paz. Matei milhões e testemunhei o nascimento de bilhões. Vivi mil vidas, e ainda assim…
Nunca tinha sentido essa emoção antes.
Medo completo.
Quando Jin, o Vampiro mais forte e Progenitor que já vi, perdeu para aquele Demônio Externo misterioso, pensei que tinha enlouquecido. Quando vi a névoa negra destrutiva daquele Demônio que poderia acabar com toda a vida e criação, achei que estava tendo alucinações. E, finalmente, quando vi Jin cair diante do Demônio, pensei que toda esperança tinha se perdido.
Mas então…
Jin lançou um feitiço estranho.
Ele possuía uma quantidade de magia muito maior do que eu já tinha testemunhado. Parecia que as leis do mundo tinham sido reescritas, e tudo estava fora de controle. A magia que Jin conjurou… não era normal. Ultrapassou os limites humanos e entrou na esfera dos Deuses.
Minha existência inteira gritava para que eu fugisse. Minha alma se sobrecarregava, sentindo-me compelida a ajoelhar. Fui dominada por aquela presença avassaladora, e meu corpo tremia como um cachorrinho assustado.
Nunca tinha sentido isso antes… Nem Dracula me deixou sentir algo assim, tão assustado.
Foi preciso o máximo de mim para apenas olhar diretamente para Jin, o homem que desceu. Energia mágica pura envolvendo-o em dourado e vermelho enquanto uma aura muito mais poderosa que a Lua Vermelha emanava de seu corpo.
Era isso.
Não consegui olhar para ele por mais de um segundo. Meus olhos queimavam como brasas, sangue sendo forçado a sair das órbitas. Caí de joelhos, cobrindo o rosto na grama como uma avestruz tentando escapar do predador. Meus instintos gritavam para que eu fugisse… A única maneira de sobreviver era desviar o olhar e rezar para que o homem não percebesse minha presença.
Pois, se ele quisesse… poderia me destruir com um mero pensamento.
Será que isso pode ser chamado de magia?
Parecia uma força superior. Uma existência maior. Era como testemunhar a própria descida de um Deus. Mesmo sem olhar diretamente, sentia como se olhasse para um abismo maior que todos os Buracos Negros do universo juntos.
A força diante de mim não podia ser medida por padrões humanos.
Nem mesmo por padrões astronômicos.
Só há uma palavra para descrever o homem e o poder que ele empunha…
Divino.
❖❖❖
O que aconteceu?
Eu deveria ter matado Jin Valter com facilidade. Meu poder foi projetado especialmente para enfrentar aquela ameaça, o monstro que atormentava os sonhos de Uriel. E, para provar isso, eu o derrotara facilmente, deixando uma ferida fatal.
Ele morreria dentro de uma hora se eu não o atacasse mais.
Então, o que é esse poder?
O que é essa emoção que me prende ao chão?
Por que estou… tremendo?
Não sei exatamente o que sinto, mas sei que não posso deixar isso continuar. Se eu permitir que aquele monstro finalize seu feitiço, minha vida pode estar em perigo. Com toda minha força, corri direto para o homem e o relógio mágico que caía. Mas, a cada passo, parecia que o peso do universo estava contra mim.
Meu corpo se destruía por dentro, e a dor como nunca tinha sentido me dominava os sentidos. Se eu tivesse um corpo mortal, meus olhos estariam sangrando, e meus ossos esmagados. Felizmente, por estar em um estado físico único, consegui resistir a esse poder misterioso.
Um passo…
Dois passos…
Três passos…
De pouco em pouco, me aproximei do monstro com a foice. Queria acabar com ele agora, antes que fizesse mais mal a mim. E, finalmente, cheguei até ele.
Estava bem na frente do monstro. Com um último golpe, poderia acabar com tudo ali mesmo. Os pesadelos de Uriel, os sacrifícios de nossa espécie, a vingança de Baishe, Cthulhu e Eyghon… Poderiam todos ser concluídos com um único golpe final.
Mas…
Eu estava impotente para fazer isso.
O feitiço foi concluído, e o relógio atingiu a alma daquele monstro.
Em poucos milissegundos, seu corpo se transformou. Seus cabelos negros começaram a crescer, e suas feições ficaram mais definidas. Uma energia pura, em tons de vermelho e ouro, emanava de seu corpo, causando um medo que eu nunca tinha sentido antes.
Isso é…
Medo?
Estou sentindo medo?
Thanatos, o Deus da Morte e carta na manga da Raça Demoníaca… Estou sentindo medo? Mesmo o Soberano Demônio nunca me deixou sentir algo assim antes. Minha alma doía, e toda minha existência gritava para que eu fugisse. Olhando para a aura radiante, senti-me como uma vaga-lume diante do Sol, uma pedra diante de um planeta, uma gota d’água no oceano inteiro.
Aquele poder… Não é algo que simples mortais possam compreender.
Não é algo que qualquer criatura viva consiga entender, assim como seres de três dimensões não percebem os de quatro. E, quando ele finalmente abriu seus olhos dourados e vermelhos…
Ah… Agora entendi…
Uriel, por isso você quer que eu o mate imediatamente.
❖❖❖
O irmão mudou.
No instante em que ele concluiu aquele feitiço e o relógio atingiu sua alma, senti o mundo se transformar. A atmosfera mudou, o planeta mudou, e, mais importante… O irmão mudou.
Antes de lançar o feitiço, ele nos avisou para corrermos. Não sabia por que disse aquilo, mas minhas pernas automaticamente atenderam ao pedido dele. Porém, não dei nem dois passos antes de meu corpo parar de se mover.
Encantada pela luz dourada e avermelhada, meu corpo foi naturalmente atraído por ele. A energia que ele criava… Era tão familiar.
Parecia que eu estava me afogando na essência dele. Sentia-me envolvida pelo amor dele. Intoxicada por seus sentimentos.
As outras três garotas estavam na mesma situação. Nossas almas estavam sendo renovadas, e tínhamos completamente esquecido o aviso de irmão. Éramos atraídas por ele como mariposas por uma lâmpada, sem conseguir desviar o olhar.
O cabelo do irmão começou a crescer. Antes, era bonito e curto, do jeito que eu amava, mas esse novo estilo virou meu favorito. Era como se ele fosse um imperador antigo reencarnado. O brilho cintilante e impecável de seus fios só era ofuscado por seus olhos estrelados.
Transformando-se em dourado e vermelho, duas Luas Vermelhas apareceram em suas órbitas enquanto uma aura régia pulsava ao redor dele. Seus traços ficaram mais afiados e seu corpo, já perfeito, parecia ainda mais. Mesmo com o peito perfurado e o braço cortado, ele não parecia fraco.
Pelo contrário, parecia que ele nunca tinha estado tão forte.
E, como se tivesse sido despertado de uma noite mal dormida, a voz ressonante de irmão soou.
"Ruído…"
Com um movimento de dedo, irmão enviou o Demônio da Morte voando em velocidades hipersônicas. Como se estivesse esmagando uma mosca, ele despachou o Demônio que causava tantos problemas com apenas um bocejo.
Este… Seria esse irmão?
Como ele pôde se tornar tão forte tão rápido? Será que irmão vendeu sua alma ao diabo em troca de poder extremo?
Múltiplas perguntas surgiram na minha mente antes mesmo que qualquer uma delas fosse respondida…
Nossos olhares se cruzaram.
Os olhos secretos de Lua Vermelha do irmão refletidos nos meus. Por um instante, parecia que o tempo tinha parado. Incontáveis emoções emergiram do meu âmago, e eu não consegui respirar. O homem literalmente tirou o meu ar.
O que devo fazer? Essa versão do irmão vai me machucar? Ele ainda vai me reconhecer? Será que ele ainda é ele mesmo?
Eu desesperadamente buscava respostas, mas, por sorte, não precisei procurar.
"Irina, meu amor… Por que está de vestido de noiva? É hora da nossa noite de falsificação de recém-casados de novo? Você sabe que estou sempre feliz em estar com você na cama, mas eu estava bem no meio de alguma coisa. Não, você ficou mais jovem, não ficou? Foi você que se fez parecer mais jovem hoje à noite? Ah, isso me lembra a noite do nosso casamento."
A quantidade de amor que tivemos!
Sim… O irmão ainda é o mesmo, pelo jeito.