Minha irmãzinha vampira

Capítulo 6

Minha irmãzinha vampira

O que você faria se tivesse vivido toda a sua vida como um inválido? Desamparado para realizar as tarefas do dia a dia, incapaz de tomar banho sem a ajuda de alguém, sem conseguir fazer exercícios como uma pessoa comum e… completamente à mercê daquela doença que poderia tirar sua mobilidade a qualquer momento?

E o que você faria se, um dia… a enfermidade que o atormentou por uma década e meia… tivesse milagrosamente desaparecido?

Você ficaria quieto na cama do hospital como de costume?

Claro que não!

Como uma criança que recebeu permissão para brincar livremente no parque, pulei de contente para fora da cabana e me aventurei até uma área isolada, cercada de árvores e rochedos. A primeira coisa que fiz foi verificar meu estado físico.

Apesar de já ter deixado a puberdade para trás há algum tempo, meu corpo começava uma nova fase de crescimento acelerado. Antes, eu tinha apenas 1,70 metro, mas em poucas horas já tinha atingido 1,75 metros. Os médicos suspeitavam que minha doença havia prejudicado meu desenvolvimento na infância, causando uma pausa na produção de hormônios essenciais para o crescimento.

E agora que me tornei um Vampiro, uma raça renomada por suas capacidades de regeneração, meu corpo estava voltando ao que deveria ser.

Considerando como meu pai era enorme, fiquei curioso para saber até onde eu poderia chegar se continuasse crescendo nesse ritmo, mas tinha coisas mais importantes para pensar agora.

"Então o Sol não me afeta assim tanto, hein?"

Levantei os braços em direção à luz do sol que penetrava pelas nuvens cinzentas do inverno. Ainda eram três da tarde, e havia bastante luz do dia. Felizmente, diferente dos mitos antigos, Vampiros não se transformam em cinzas ao contato com a grande bola de fogo no céu.

Embora sentisse um leve incômodo, não era algo que ameaçasse minha vida ou que me obrigasse a correr para um abrigo. O que era perfeito para eu finalmente testar esse corpo novo.

Desde que acordei, fui arrastado de uma confusão para outra. O fato de ter me transformado em Vampiro, a clínica me interrogando sobre o que aconteceu na noite anterior, meus pais preocupados me incomodando…

Todo esse barulho deixou pouco tempo para mim mesmo.

E agora que estou sozinho…

Era hora de me divertir.

"Então, vamos respirar fundo…"

Sempre ouvi histórias sobre a raça enigmática que são os Vampiros. Muitos os chamam de predadores no topo da cadeia, e com razão. Têm força sobre-humana que rivaliza com qualquer Caçador. Sentidos aprimorados que só podem ser descritos como mágicos. Regeneração transcendente que permite curar qualquer ferimento. E, mais importante…

A conexão deles com a magia é incomparável.

Fechei os olhos e, como se fosse uma sinfonia, o mundo inteiro parecia ser pintado na minha mente. Usando meu senso de audição, consegui ouvir cada canto de pássaros, floco de neve caindo e o farfalhar de uma folha. Aos poucos, recomponho a floresta congelada. Para minha surpresa, descobri que usar meus outros sentidos era tão eficaz quanto minha visão.

Na verdade, talvez fosse até um pouco melhor.

Nunca tinha 'visto' o mundo com tanta clareza antes. Os batimentos de coração dos esquilos pulando de árvore em árvore, o som dos passos de uma colônia de formigas carregando folhas caídas… Nem mesmo o simples movimento da neve escapava da minha percepção.

Era algo totalmente surreal…

"Agora, vamos experimentar isso."

Disseram que um Vampiro comum tinha a força de um Caçador de elite. Com apenas força muscular bruta, podiam carregar rochas e rasgar carne ao meio. Para testar essa teoria, me posicionei em frente a uma árvore pequena e adotei uma postura de artes marciais simples.

Antes do acidente, meu pai tinha me mostrado muitos fundamentos de combate. Claro, eu não treinava desde que me machuquei, mas meu corpo ainda lembrava dos anos de treino duro. Com minha mão direita encaixada na cintura e meu braço esquerdo estendido para manter o equilíbrio, alinhei meu corpo com a árvore.

E numa movimento suave…

"HAH!!!"

Gritei enquanto minha mão direita explodia em direção ao tronco marrom à minha frente. Meu soco era simples, sem truques. Nada de magia ou uso de fortalecimento corporal. Foi só um soco direto, usando toda a minha força.

E o resultado?

"Creeeekkkkk!!!" Com um estalo, fumaça saía dos meus punhos enquanto via a árvore rachar, grande parte de seu tronco despencando sobre o chão coberto de neve.

"Na minha frente… eu realmente a quebrei…"

Mesmo tendo sido eu quem fez isso, mal conseguia entender meu novo poder. Além disso, ao olhar para os punhos, não tinha sequer um arranhão. Era como se a árvore fosse tão mole quanto água, e minha pele fosse de diamante puro.

"E quanto a isso aqui, então?"

Depois, testei minha regeneração. Ouvi falar que a capacidade de cura de um Vampiro era absurda, mas nunca tinha visto na prática. Peguei um galho partido que caiu da árvore, escolhi a ponta mais afiada e cortei diretamente minha mão esquerda. Foi um corte superficial, mas, diante da ferramenta que tinha, era o melhor que consegui.

O aroma de sangue entrou no meu nariz, deixando-me brevemente intoxicado. No entanto, levei um segundo para tirar a cabeça da sensação estranha e minha postura relaxada rapidamente voltou.

‘Ah, isso é interessante… estou mais interessado no meu próprio sangue do que no sangue vencido que o hospital me deu… Será que é porque sou um Vampiro ou porque o sangue que eles deram estava estragado? Preciso experimentar mais.’

Minha mente curiosa entrou em hiperatividade enquanto considerava as inúmeras variáveis que poderiam afetar minhas preferências, mas segurei o pensamento por um momento. O problema mais importante era…

"Uau! Está realmente curando!"

Admirado, vi a ferida que criei se fechar lentamente. Não de forma instantânea como nos filmes, mas bem mais rápido do que um humano comum. Em meia minuto, minha pele estava como nova, sem quase sinais de ferimento. Uma ferida que levaria dias para cicatrizar em alguém normal, aqui se fechava em segundos.

"Força sobre-humana e uma capacidade de cura que só posso descrever como milagrosa… eu realmente me tornei um Vampiro…"

Mais uma vez, fiquei pasmo com a minha nova realidade. Quem diria que aquele inválido agora fosse capaz de fazer tanta coisa?

"Falta só mais um teste…"

Respirei fundo devagar, fechei os olhos com cuidado. Para esse último teste, precisava de concentração total. Ignorei os outros sentidos que pintavam o mundo ao meu redor e foquei em uma única coisa. Olhei… para dentro.

Consegui 'ver' meu sangue desde o interior do coração até os pequenos vasos nos dedos. Consegui 'ver' o fluxo perfeito do meu corpo interno. E, o mais importante, senti uma força familiar, algo que eu nunca tinha sentido há horas. Era uma força que eu desejava desesperadamente, e um poder que me foi arrancado aos dez anos.

A magia.

Estava lá. Era tênue, mas não havia dúvida de que existia.

Sempre observei meus colegas usar magias como se fosse algo natural. Apesar de ter obtido as melhores pontuações na teoria, tudo era em vão, pois não conseguia usar a coisa que mais desejava.

"HAHAHA!!! Eu vou conseguir! Posso usar magia novamente!!!"

Meu coração ficou mais leve. Na verdade, todo o meu ser se sentiu mais leve. O peso que me arrastava desde aquele incidente desapareceu. Durante toda a minha vida, senti como se metade da minha alma estivesse selada. A única coisa em que eu era melhor… eu não podia usar.

Nem sei quantas vezes disse: "Se ao menos eu pudesse usar magia…"

Aprendi todos os teoremas… Estudei demais… E, ainda assim, meu corpo se recusava a aprender aquilo que eu mais amava.

Mas isso mudou hoje.

"Está lá… Com certeza está lá… Mas, infelizmente, não sei o quanto a magia dos Vampiros difere da dos humanos, embora…"

Suspirei fundo. Ser um especialista em pesquisa mágica não significava que eu pudesse usá-la imediatamente, especialmente agora que me tornei um Vampiro. Não aprofundei bastante no poder dos Vampiros, mas sei que o sistema de magia deles é completamente diferente do que conhecia.

" Felizmente, se não sei de algo, é só perguntar a quem sabe, né?"

Minha voz soava firme, nem alta, nem baixa, mas com uma certa determinação. Olhei para uma brecha entre duas árvores a cerca de quinze metros de distancia e encarei o vazio. Visualmente, não havia ninguém por perto. Quem tivesse dois olhos e um senso lógico normal perceberia, mas, lá no fundo, eu sabia…

Sabia que alguém estava me observando.

E, de fato…

"Uau… Não esperava isso. Que você pudesse identificar exatamente onde eu estava. Acho que não devia esperar nada menos de você."

Uma névoa etérea emergiu além das árvores e lentamente se agrupou. A névoa ficou cada vez mais espessa até que os contornos de uma pessoa puderam ser visíveis. E, da densidade do nevoeiro, surgiu uma voz doce, parecida com o canto de uma Sereia.

Não demorou muito para reconhecer a visitante estrangeira, que vinha me espionando o tempo todo. Uma jovem, provavelmente na casa dos vinte anos, saiu da névoa que a envolvia e se revelou completamente.

E, uau… Que visão era essa.

A mulher que surgiu da floresta era deslumbrante. A sua marca mais marcante era o cabelo branco incomum, que fluía por suas costas como uma cachoeira. Mas aquilo era só o começo. Ela parecia possuir um corpo perfeito, com curvas tão sedutoras que até um homem gayficaria envergonhado.

Seu rosto em formato de coração destacava suas feições distintas. Especialmente seus olhos cinza de inverno, harmoniosos e elegantes. Com um nariz afiado e lábios de cereja perfeitamente delineados, não era exagero chamá-la de mulher mais linda que já vi pessoalmente. E, para completar, sua pele clara era quase tão branca quanto a neve ao redor dela.

O único detalhe estranho sobre ela era sua roupa durante o inverno. Apesar do vento suave, ainda era época de neve, com temperaturas abaixo de zero, o mais quente que podia ficar.

No entanto, essa jovem permanecia calma vestida com um vestido gótico branco, de tecido quase leve, com pouquíssimas roupas quentinhas. Se olhasse com atenção, nem se preocupou em cobrir o colo, o que era inédito no inverno.

O que só podia significar uma coisa…

"Quem é você?"

"Há quanto tempo, irmão."

"Irmão?"

Houve uma breve pausa na minha mente quando ela me chamou de irmão. Eu alguma vez tive uma irmã? Não, isso não faz sentido. Se eu tivesse uma irmã, meus pais nunca esconderiam dela a existência. Então, por que isso?

E, exatamente naquele momento… A memória da noite anterior veio à tona, lentamente. A primeira visão da Lua de Sangue. O fato de minha doença ter começado a piorar de novo. O momento em que aceitei meu destino, me preparei para morrer com um sorriso e…

A mulher que entrou no meu quarto.

"Ontem… Fui você?"

Sim… Como pude esquecer? Quando estava à beira da morte, apareceu um anjo. Mesmo tendo desmaiado logo após, não há dúvidas de que essa jovem entrou no meu quarto. E, dadas as circunstâncias… Provavelmente foi ela quem me transformou em Vampiro.

"Sim! Fico feliz que lembre de mim, irmão!" Um leve rubor surgiu em seu rosto enquanto seus lábios se curvavam num sorriso radiante. Ela deu dois passos em minha direção, colocou as mãos no meu peito e lentamente deslizou-as pelos meus ombros.

Como tínhamos altura semelhante, o rosto dela estava a apenas alguns centímetros do meu. Agora, de perto, pude admirar totalmente sua pele lisa e sem poros. A fragrância doce do inverno emanava de seu corpo vibrante, e uma sensação quase intoxicante invadiu o fundo do meu cérebro.

Estranho…

Essa mulher era uma desconhecida. Não, provavelmente uma Vampira também. E, mesmo assim, eu não me sentia ameaçado em nada.

Pela estranha razão, não consegui me negar ao seu toque. Pelo contrário, parecia que cada fibra do meu ser estava acolhendo sua carícia.

Aquele sorriso juvenil… Essa fragrância familiar… Sua voz alegre…

Onde já senti tudo isso antes?

"Urgh!"

Naquele momento, minha cabeça começou a latejar. Uma visão difusa passou pela minha consciência. Era confusa, mas dava para distinguir a imagem de uma jovem correndo pelos campos comigo. Naquele mundo, só tinha ela e eu.

Não tínhamos mais do que dez anos, e passávamos os dias cheios de alegria e risadas. Era uma cena que eu nunca vira antes, e, mesmo assim… Sentia como se fosse uma memória bem guardada, presa fundo na minha mente.

Por mais que tentasse, a dor daquela lembrança não diminuía. Na verdade, cada segundo ela ficava mais forte. Felizmente, antes que eu me esforçasse demais e desmaiasse, uma voz melodiosa conseguiu me libertar do estado de choque.

"Irmão! Você não precisa se forçar!"

"…"

"Não se preocupe, meu querido irmão… Você ainda está se recuperando. Não precisa forçar nada. Tudo será revelado a seu tempo…"

Quando acordei, percebi que estava abraçado aos braços daquela mulher. Ela segurava minhas costas com uma mão e, com a outra, acariciava meus cabelos negros.

Que coisa estranha…

Por que estar com ela… parece tão certo?

Essa desconhecida…

"Quem é você?" Perguntei inconscientemente.

A mulher fez uma breve pausa, afastando seu corpo do meu. Apesar disso, seus braços continuavam firmemente agarrados aos meus ombros, como se tivesse medo de que eu fugisse assim que ela me soltasse.

E, com o sorriso mais brilhante que já tinha visto, ela declarou:

"Meu nome é Irina Everwinter… sua pequena irmã!"