
Capítulo 7
Minha irmãzinha vampira
"Irina… Everwinter? Minha… irmã mais nova?"
As palavras que saíram da boca da jovem não faziam sentido. Se ela fosse minha irmã mais nova, por que eu não teria sabido dela? Além disso, por que minha irmã seria uma Vampira? E, mesmo que, por algum milagre, tivéssemos alguma ligação de sangue, essa mulher não se parecia em nada comigo!
Felizmente, a beleza percebeu meu tormento mental e começou a esclarecer minhas dúvidas.
"Não, não somos parentes por sangue nem nada disso! Honestamente, seria um problema se realmente fossemos! Mas mesmo assim, você ainda é meu querido irmão!"
Irina começou a soltar uma série de declarações estranhas. Nós não éramos parentes de sangue, mas ela dizia que éramos irmãos? Eu tinha milhões de maneiras científicas de refutar essa garota. Mas não adiantava nada ela me lançar aqueles olhinhos de filhote, que eram além de adoráveis.
Espera aí…
"Irina… foi? Posso te chamar assim?"
"Por favor, fique à vontade!!!"
Sobrecarregado pelo entusiasmo da 'irmãzinha', inconscientemente dei dois passos para trás. Os olhos de Irina brilhavam de alegria pura, e sua tez branca como a neve ficou um pouco corada. Preciso admitir que aquela expressão simples mexeu demais com meu coração.
Por que estou sentindo tanto afeto por alguém que nunca conheci? Por que não me sinto perturbado com esses acontecimentos?
Sempre fui uma pessoa racional, capaz de manter a cabeça fria nas situações mais tensas. Mas isso era um jogo totalmente diferente. O sentimento que tinha por essa mulher deslumbrante… vinha lá do fundo da minha alma.
Não era uma vontade primal masculina de procriar com uma mulher bonita. Nem era a paixão que se tem por um ídolo.
O sentimento que tinha por essa Irina… era diferente.
E só havia uma explicação para esse fenômeno.
"Irina… você sabe o que aconteceu comigo há quinze anos?"
"…"
Irina ficou em silêncio diante da minha pergunta simples. A excitação no rosto dela desapareceu, dando lugar a uma tristeza pesadíssima. A mudança em suas emoções não era só visível para mim. No fundo do meu coração, podia sentir uma conexão espiritual com a jovem beleza. Era como se os sentimentos dela fossem diretamente alimentados na minha alma inteira.
As frustrações que ela tinha… o remorso que carregava… a dor e o sofrimento que pesavam no coração dela, e finalmente…
O anseio que ela tinha por mim.
Era tudo tão pesado.
"Sim, irmão…" Irina respondeu tristemente. "A razão pela qual você se machucou… foi por minha causa."
"Você?"
"Sim… É uma longa história."
"Tenho todo o tempo do mundo."
Irina fez uma pausa por um momento e soltou um suspiro. Lentamente, ela agarrou minhas mãos e disse: "... Como você deve ter adivinhado, nos conhecemos há quinze anos."
"É mesmo?"
Eu até tive essa impressão. Mesmo não me lembrando de nada, desde a familiaridade que eu sentia com essa jovem mulher até o carinho que ela demonstrava por mim… havia alguma razão oculta nisso tudo. Quanto ao motivo de eu não me lembrar de nada…
"Você não vai lembrar agora, mas passamos três meses inteiros juntos. Naquela época, você me protegeu, me mostrou o calor de um ser humano e… Você realmente virou meu irmão. Os dias que passamos juntos… foram os melhores momentos da minha vida."
Uma tristeza envolveu o rosto de Irina enquanto ela recordava com carinho as memórias que compartilhamos. No entanto, aquele sorriso amargo rapidamente se transformou numa expressão de raiva.
"E, como qualquer irmão faria… Você me protegeu do Demônio Exterior que veio nos atacar. Aquela maldita fera! Se eu fosse um pouco mais forte!!!"
… Começo a entender melhor o que estava acontecendo.
Pelolas palavras de Irina, tínhamos nos conhecido há muitos anos e nos tornamos tão próximos quanto irmãos. Não era uma história absurda, já que meus pais costumavam estar ocupados com o trabalho de Caçador, e eu geralmente me perdia por áreas isoladas para treinar minha magia e minhas habilidades marciais.
Deveria ter criado laços com essa linda garota, sem saber que ela era uma Vampira. Ou talvez eu soubesse, mas não me importasse?
Aff… Desde criança, eu era um garoto ciumento, né?
"Espera aí, se eu te protegi do Demônio Exterior, por que não me lembro de nada?"
"É complicado… O Demônio Exterior que nos atacou era capaz de atacar almas. Ainda que tenhamos resistido bravamente e conseguido expulsá-lo, você foi atingido por um de seus ataques, e sua alma se quebrou em muitos pedaços."
"Minha alma, como assim?!"
Uma ferida na alma é muito mais grave do que qualquer outro ferimento para um humano comum. Ainda mais que até os Caçadores mais elite teriam dificuldades de se recuperar de uma ferida na alma. E se Irina estava certa, ter minha alma despedaçada era praticamente uma sentença de morte!
O fato de eu ainda estar vivo é provavelmente um milagre moderno.
"Então, para te salvar, realizei um ritual proibido…"
Nesse momento, os olhos cinzentos de Irina, típicos do inverno, começaram a encher de lágrimas. Ela me olhou com uma expressão reservada, insegura se deveria revelar todos os detalhes.
"Para garantir que sua alma não se dissipasse, raspei uma parte da minha e a coloquei de volta no lugar."
"Você fez o quê?!"
Isso era possível?! Vai contra toda lógica! E espera… ela disse que era minha irmã mais nova, né? Então, ela era ainda mais nova do que eu na hora de fazer algo tão impactante assim?!
"… Claro que tive ajuda."
Irina desviou o olhar com um sorriso suspeito. Por algum motivo, pude perceber que ela estava escondendo algo por trás daquele sorriso, mas eu estava tão chocado que não consegui seguir por esse caminho. Além disso, se ela contou com o auxílio de outros Vampiros mais velhos, faria mais sentido.
"Essa é a razão de você ter conseguido sobreviver àquele episódio, meu querido irmão…"
Para impedir que eu insistisse mais, Irina levantou ambas as mãos até minhas bochechas e segurou minha cabeça, de modo que meus olhos não saíssem do rosto dela.
"Tenho tanto que quero te dizer… Tantas coisas que quero fazer com você… Já se passaram tantos anos, meu querido irmão…"
Os olhos de Irina começaram a encher de lágrimas. A imagem de uma beleza fria mudou rapidamente para a de uma amante cheia de saudade. Ou, neste caso, irmã? Suas mãos sedosas deslizaram pela parte de trás da minha cabeça e a empurrou para baixo, até a base do meu pescoço.
Instantaneamente, o aroma da neve fresca do inverno invadiu meus sentidos. Era uma sensação quase intoxicante, como se eu tivesse retornado ao lugar onde deveria estar.
Essa fragrância… Esse toque… Essa sensação…
Eu já tinha experimentado tudo isso antes.
"Esperei… esperei tanto tempo…"
Enquanto continuava acariciando minha cabeça, Irina continuou derramando seu coração para mim.
"Perdão, irmão… Não pude te transformar em Vampiro naquela época… Sua alma não aguentaria a carga. Tive que esperar até ela estar completamente curada para realmente te salvar. Além disso…"
Irina continuou a abrir seus sentimentos para mim. Talvez fosse a conexão com a alma dela no meu corpo; eu podia sentir cada onda de emoção que ela tinha. Tristeza por ter causado meus quinze anos como inválido… arrependimento por não ter feito mais por mim… E, mais importante ainda…
"Desculpe, foi preciso que fosse assim. Eu sei que deveria ter te perguntado antes de te transformar em Vampiro, mas não havia outra alternativa. Se você permanecesse humano, sua alma curada, junto com meu fator Vampiro, rasgaria seu corpo todo. E…"
A jovem maravilhosa levantou meu rosto e trouxe seu rosto bem perto do meu. Estávamos tão próximos que nossos narizes quase se tocavam. E, com esse simples gesto, só os olhos dela eram o que eu via.
O tempo parecia ter desacelerado, e parecia que todos os meus outros sentidos tinham se atrofiado. Eu não me importava com o mundo ao meu redor. O que importava era a garota nos meus braços.
"Eu não queria que você morresse!"
Irina soltou, cheia de arrependimento. Eu podia sentir a tremedeira na sua voz, a ansiedade em seus olhos. Ela tinha medo de que eu a odiasse… Que ela não me perdoasse… Por ter tirado minha humanidade sem minha permissão.
"Foi meu egoísmo que te transformou em Vampiro. Mas, entre perder você e fazer você me odiar… não tive escolha! Eu te acompanho de longe há tanto tempo! Eu não podia deixar meu amado irmão morrer assim!"
"Irina…"
Ao ver essa beleza furiosa, uma ideia surgiu na minha cabeça.
Eu a odiava por me transformar em Vampiro? Talvez a gravidade da situação ainda não tivesse me atingido completamente, mas, de repente… não me sinto tão mal.
E daí se eu me tornei um Vampiro? A alternativa seria morrer na cama do hospital, sem nunca conseguir ficar forte o suficiente para cuidar de mim mesmo. Tornar-me Vampiro também reverteu minha habilidade de usar magia, algo que achava que nunca mais usaria.
Talvez fosse ingenuidade, mas…
Ser Vampiro talvez tivesse sido a melhor coisa que aconteceu comigo. Além disso…
"Não sei as implicações de ser Vampiro, nem sei se tudo que você diz é verdade, mas…"
Eu estendi as mãos e acariciei suavemente os cabelos macios da jovem. Surpreendida com meu toque, Irina pulou um pouco, mas logo se acostumou. Encostando sua face esquerda no meu peito, ela permitiu que eu continuasse brincando com seus cabelos de marfim, soltando uns ronronados de contentamento.
"Se eu estivesse no seu lugar, faria o mesmo. Eu nunca escolheria morrer."
Isso era um fato inquestionável. Mesmo sem Irina, se me derem a escolha entre morrer ou me tornar um Vampiro, eu escolheria a segunda, sem hesitar. Não permitiria que eu morresse antes de me tornar alguém importante. Ou, pelo menos, alguém que não passasse a vida toda inválido.
"E… Eu não consigo te odiar, Irina."
"O-Que?!"
Vendo a coisinha adorável que estava nos meus braços se mexer como um coelhinho assustado, meu coração encheu-se de emoções que achava nunca ter sentido antes. A vida toda, nunca tive um amor. Era principalmente por ser inválido e ninguém achar que eu era atraente, mas também nunca fui atraído por interesse romântico algum.
Era como se a parte do meu cérebro responsável pelas emoções tivesse sido lacrada há muito tempo, e agora eu entendi o porquê.
Todo o meu afeto tinha sido reservado para essa beleza encantadora no meu abraço.
"Será por causa da sua alma no meu corpo? Acho que não consigo sentir nenhuma emoção negativa por você. É estranho…"
"Sério?!"
"Sim…"
Desde que Irina apareceu, pude sentir meu ser inteiro atraído por ela. Era uma emoção difícil de descrever. Como se ela fosse realmente minha irmã perdida há muito tempo. Uma irmã preciosa que faria tudo para proteger.
Na verdade, eu me odiava por não lembrar do passado. Se ao menos eu tivesse minhas memórias… as lembranças preciosas do passado com essa beleza tão amável.
Vendo que eu não estava bravo, Irina finalmente relaxou. Deslizou suas mãos pela minha nuca e colocou a boca próxima ao meu ouvido.
"Então… irmão… você vai ficar comigo?"
Era tudo tão intoxicante. Desde o aroma acolhedor de Irina até suas emoções transbordando… eu tinha vontade de aceitar sua proposta ali mesmo. Mas…
"… É difícil dizer."
"P-Por quê?!"
Balancei a cabeça e sorri.
"Não estou dizendo que não, Irina. É que há muitas coisas que ainda não sei."
Da minha perspectiva, eu tinha acabado de me tornar um Vampiro, um ser que nunca imaginei que viria a ser. E então, essa beleza aparece do nada e diz que é minha irmã mais nova Vampira. Ela também disse que nos conhecemos há muitos anos, mesmo eu não lembrando, e esses sentimentos que tenho por ela…
"Não sei quanto da verdade que você está me dizendo é real."
"Eu nunca mentiria para você, irmão!"
"Por mais que eu gostaria de confiar em você… acabamos de nos conhecer."
"Ah…"
Irina deu dois passos para trás enquanto a revelação começava a tomar conta dela. Se o que ela disse fosse verdade, ela vinha me observando há muitos anos. Além disso, ela tinha as memórias que compartilhamos quando jovens. Mas na minha cabeça, eu simplesmente tinha acabado de conhecê-la de verdade pela primeira vez.
Se minhas memórias voltarem quando minha alma se recuperar, talvez seja uma história diferente. Mas por enquanto, Irina não passava de uma estranha com uma conexão misteriosa comigo.
"Você está certa… Ainda não pode confiar em mim…"
Irina esboçou um sorriso amargo, uma expressão que parecia tão triste quanto arrependida. Aquela expressão triste mexeu com meu coração, fazendo eu desejar apagar minhas palavras anteriores e fazer exatamente o que ela pediu. Mas, desta vez, meu cérebro racional prevaleceu.
"AINDA!!! Você não pode ficar aqui! Você acabou de se tornar um Vampiro, e o mundo humano não pode mais te tratar assim! Eu sei que você ainda não pode confiar em mim, mas por favor, venha comigo para minha mansão!"
"Mas…"
"Por favor! Você não quer se recuperar logo?"
"É verdade…"
Não sabia nada sobre biologia de Vampiro. Muito menos, ainda estava me recuperando da ferida na alma que Irina me contou. Além disso, não adiantava chorar sobre o leite derramado. Agora que sou Vampiro, preciso aprender mais sobre eles. E sair com Irina parecia o caminho certo.
Mas…
"Meus pais… Você pode trazê-los também?"
"Você está concordando?!“
Irina agarrou minhas mãos com brilho nos olhos e soltou um suspiro animado.
"Sim, mas preciso de alguém que confie ao meu lado. Mas você promete que ninguém vai machucar eles lá."
Meus pais eram antigos Caçadores, de alta patente. De fato, chamar de ex-Caçadores seria um insulto. Se não fosse por eles terem se aposentado cedo para ficar comigo, poderiam facilmente ter subido na hierarquia com seu poder atual. Então, não me preocupava com a segurança deles. Mas não havia garantia de que a família de Irina não os sobrecarregaria em número.
"Não se preocupe! Juro pela minha alma que nenhum mal acontecerá aos seus pais!"
"Você não precisa exagerar…"
Sorri de modo amargo. Honestamente, ver as reações sinceras de Irina me fez sentir culpa por duvidar dela. Mas nunca fui uma pessoa confiável por natureza. Mesmo que tudo o que ela disse fosse verdade, ainda assim precisava de alguma proteção.
Porém, ainda assim, ver aquela beleza jovem pular no ar com um sorriso deslumbrante…
Realmente fez meu coração vibrar.