No Game No Life

Volume 3 - Capítulo 3

No Game No Life

No dia seguinte — em uma pequena sala de conferências na extremidade do Castelo Real de Elkia. Lá estavam Sora, Shiro, Steph, Jibril, além de Chlammy e Fiel, a elfa. Sora com um sorriso irônico, Shiro com os olhos meio abertos, como de costume, e Chlammy, com um olhar sereno. Esses três, que no dia anterior haviam chorado até não poder mais e desabado como pedras, agora não demonstravam nenhum sinal disso. Se olhasse de perto, era possível notar os olhos levemente vermelhos, mas pareciam ter recuperado o ritmo.

“...Então, por que estamos todos aqui?”

A pergunta que todos pareciam estar esperando alguém fazer foi levantada por Steph. Como se também estivesse esperando por isso, Sora respondeu.

“Eu já tenho um certo entendimento com Chlammy através da memória, mas vamos lutar juntos. Precisamos nos apresentar, não é?”

— Lutar juntos: o que Chlammy mencionara no dia anterior — serem agentes duplos contra Elven Gard. Diante de uma troca que sugeria algo ainda mais profundo, Jibril e Steph observaram Chlammy e Fiel. Chlammy, com seus olhos escuros e cabelo preto, encarando com um olhar afiado e cheio de inteligência, disse diretamente:

“—Sou Chlammy Zell. Prazer em conhecê-los.”

...Parecia que era só isso. Sora teve que continuar.

“Uh, mesma idade que eu, dezoito anos, altura 1,58 metros, busto—”

“H-hey, você?! Isso é covardia!”

Interrompendo Sora apressadamente enquanto ele revelava suas informações pessoais, Chlammy gritou.

“E ela usa sutiãs com enchimento, mas na verdade—”

“T-tá bom, tá bom, pare, eu faço isso, tá bem?!”

Estava claro para todos, exceto para Chlammy, que ela estava discretamente choramingando, mas enfim.

“M-mas antes disso — Fi precisa ser apresentada antes que eu possa explicar qualquer coisa...”

Com Chlammy lançando um olhar, a elfa chamada Fi abriu a boca.

“Oiii, eu sou Fiel Nirvalen!”

Com cabelos loiros gentilmente ondulados para parecerem macios ao toque, e as longas orelhas características dos elfos apontando para fora — a garota, que parecia estar na metade da adolescência, apresentou-se com uma voz encantadora.

“Mas todos, exceto aquela diaba ali, podem me chamar de Fiii!”

Talvez fosse isso que significava um sorriso ser como o sol. Diante de Fi, com sua aura suave e gentil, mas que havia chamado alguém de diaba, Jibril inclinou a cabeça como se dissesse “Ah, é mesmo?” e comentou.

“Bem, então, você certamente não gosta de mim. Pergunto-me por quê? Estou intrigada.”

— Aquilo era para ser uma piada, talvez? Enquanto todos olhavam friamente para Jibril, Sora, com o rosto apoiado na mão, murmurou.

“São palavras fortes para quem diz que lançou um ‘Golpe Celestial’ ou algo assim na capital deles.”

Mas, como se o comentário de Sora a tivesse surpreendido completamente...

“O quê? Como já expliquei antes, claramente não tive culpa em—”

“Teve sim! Um galo na cabeça comparado à destruição de uma cidade? Sério, como você sequer compara?!”

Para a observação sensata de Sora, Fi complementou com um sorriso alegre.

“Se posso acrescentar, naquela ocasião ela também levou todo o nosso estoque de grimórios. Ora, levamos mais de oitocentos aaaanos para restabelecer os esquemas mágicos perdidos na época, sabiam?!”

Sora, tamborilando os dedos como martelos na mesa, falou.

“—Sra. Jibril, sua defesa.”

“Defesa? Ora, nunca... Senhor, cabeças de elfos são apenas Raridade 2, e considerando que usei todo meu poder naquele Golpe Celestial, você não acha que já foi demais? Até para mim, levou cerca de cinco anos para me recuperar.”

Quem sabia o que era exatamente um “Golpe Celestial”, mas aparentemente era algum ataque capaz de aniquilar uma cidade inteira. Descobrir que para lançar algo assim tinha um preço até mesmo para um Flügel trouxe um pouco de alívio interno aos humanos.

...Se cinco anos era um preço apropriado ou não.

“Assim, aproveitei-me dos livros que observei para, ao menos, obter algo da batalha. Agora, na era dos Dez Pactos — eh-heh-heh, olhando para trás, foi um ótimo saque, geh-heh, eh-heh-heh-hehh!”

“A ré, Jibril, é considerada — culpada.”

“Por quê?!”

Enquanto Jibril fazia uma cara que sugeria uma apelação imediata, Sora a ignorou, ponderando sobre como convencer alguém cuja espécie havia sido massacrada a perdoar a perpetradora.

“Uh, bem, posso te chamar de Fi?”

“Mas é claro!”

“Se vamos lutar juntos, quero me livrar de rancores. Como posso fazer você perdoar a Jibril?”

Quando Sora foi direto ao ponto, Fi levou o dedo à bochecha, pensando com sua voz sonhadora.

“Hmmm, olha, isso é difícil de dizer.”

Mas Chlammy também falou, de olhos fechados e braços cruzados.

“Fi, precisamos do poder dela para o plano de Sora. Também te peço isso.”

Suspirando relutantemente, Fi fez uma proposta.

“Tá bem, olha, se você apenas lamber meus pés e disser: ‘Por favor, me perdoe, Fiel, Sua Alteza,’ então eu perdoo vocêuu.”

“Oh, céus, céus, a arrogância dessa ratazana da floresta com suas orelhas pretensiosas acaba de cruzar os céus!”

As duas se encararam com sorrisos sombrios. Contudo, mexendo desinteressadamente em um jogo no colo de Sora, Shiro murmurou.

“...Ji-bril...culpada... Punição.”

“O quê?! V-você não vai realmente me mandar lamber os pés dessa ani—”

“...Punição.”

“Ngh, nghhhh... Eu não compreendo seu raciocínio, Mestre, mas se você ordenar...”

E Jibril rastejou até os pés de Fiel.

Lambe, lambe…

“—(monótono) Ohh, por favor, me perdoe, Fiel, Sua Alteza.”

“Ora, então, eu te perdooou!”

Assim, Fi juntou as mãos e sorriu como se realmente tivesse perdoado a Flügel.

— Era só isso? Sora se perguntou se essa garota realmente nem ligava para o passado e só queria implicar com Jibril, mas deixou isso de lado por enquanto.

“M-M-M-Mestre, v-você tem um momento?!”

Interrompendo seus pensamentos, Jibril correu até ele com os olhos brilhando diante de uma grande descoberta.

“É-é uma desonra profunda ter que lamber os pés de um animal tão inferior e pedir desculpas, mas, como pode ser?! Eu sinto—quando penso que é uma ordem de meus mestres, de alguma forma… Eu fico toda arrepiada! Você tem alguma ideia da verdadeira natureza desse grandioso—”

“Tá bom, agora, Chlammy, vamos continuar com a apresentação—”

Enquanto Sora tentava avançar a conversa, ignorando-a novamente…

“Com licença, se estamos falando de rancores, eu tenho os meus.”

“—O quê, Steph? Do que você tá falando?”

Apontando o dedo para a impassível Chlammy, Steph vociferou:

“Estou falando de—dela! Não foi essa aí que trapaceou com magia para me derrotar?!”

“A culpa é sua por cair nisso. Certo, Chlammy, continue.”

“Ei—?!”

Ignorando a indignação abruptamente descartada de Steph, Chlammy falou.

“Fi… é minha amiga de infância. Para ser mais precisa—minha mestra, na verdade.”

Enquanto Shiro momentaneamente não entendia o que ela queria dizer, Jibril explicou.

“Elven Gard é uma democracia, mas promove a submissão de raças inferiores pelo uso dos Pactos—para ser franca, um sistema de escravidão.”

“O quê… Então Chlammy é…”

Steph, soltando essa exclamação, viu Chlammy assentir.

“Sim, desde a época de meu bisavô, somos escravos da família Nirvalen. Nasci e cresci em Elven Gard.”

Com um sorriso amargo para Steph, que ficou sem palavras, Chlammy continuou.

“Não é grande coisa… Todo mundo tem uma ou outra dificuldade para suportar.”

Ao ver o olhar dela pousar em Sora, Steph, e Jibril, até mesmo Fi se perguntou o que no passado de Sora poderia ter feito Chlammy dizer de si mesma: “Não é grande coisa.”

“...É uma história bastante comum, suponho. Eu era uma escrava, e Fi foi a única que me tratou como amiga.”

Percebendo o clima, Chlammy continuou para desviar o rumo da conversa.

“Mas tratar uma escrava como amiga poderia causar um alvoroço além de apenas manchar a reputação da família, então, claro, não podemos agir assim publicamente.”

“Bem, da minha parte, não gosto nem um pouco disso.”

Enquanto Fi borbulhava com suavidade, mas com um toque de raiva, Chlammy prosseguiu.

“A família Nirvalen é conhecida em Elven Gard. Seu nome tem figurado entre os assentos inferiores da câmara alta da legislatura por muitas gerações, e, desde que o chefe anterior faleceu no ano passado, Fi se tornou a chefe de fato—”

Então, quem entendeu o significado de sua história e reagiu foi ninguém menos que—

“...Então Fiel é um membro atuante da Câmara Alta—espere, p-para um membro da Câmara Alta planejar um movimento para libertar os escravos—isso não é traição?!”

— Isso seria um escândalo inédito no maior país do mundo. Mas, em vez de detalhes triviais como esse, todos agora olharam para Steph com expressões de espanto.

“—S-Steph, você realmente acompanhou a conversa?! Tá doente de novo? Tem febre?!”

Diante de Sora, que verbalizou o que todos estavam pensando, Steph aproveitou seu impulso para se virar e gritar:

“Pode por favor remover a etiqueta de idiota que colocou em mim? Se eu não fosse mais instruída sobre política do que certos dois monarcas que jogam todos os assuntos da administração nacional sobre mim, dificilmente serviria para alguma coisa!”

B-bem, deixando de lado o espetáculo incrível que se desdobrava diante de seus olhos. Sora olhou nos olhos de Fi e perguntou:

“...Tá tudo bem pra você, Fi?”

“Peerdão? O que você quer diizer?”

“Trabalhar conosco pode levar à queda de Elven Gard, sabia?”

— Sim, como Chlammy havia mencionado, o que Sora estava planejando envolvia a União Oriental, e além disso—mas.

“Ahh, mas esse tempo vai chegar quando tiver que chegar.”

Fi, com o mesmo sorriso radiante.

“Eu realmente não me importo, contanto que Chlammy não se machuque... A família e coisas do tipo, francamente, não significam muito para mim… E já ouvi tanto sermão dos velhos conselheiros que, se possível, gostaria de me livrar da liderança…”

Com um sorriso gentil, tão evasivo quanto a neve.

“Na verdade, às vezes até pensei que seria mais simples se o estado simplesmente desaparecessee, eh-heh-heh!”

“Q-q-que declarações chocantes você faz assim tão casualmente…”

Steph deu um passo para trás diante das palavras pronunciadas com aquele sorriso.

“Se eu tirar os olhos da Chlammy, ora, ela vai acabar chorando em um canto, então prefiro ficar ao lado dela.”

Fi falou enquanto acariciava Chlammy carinhosamente, ao que Chlammy respondeu:

“E-eu não choro! Nunca chorei!”

“Ah, e sobre quando nós te derrotamos para nos tornarmos monarcas, e você estava soluçando como uma—”

A correção de Sora foi prontamente recebida com um olhar mortal de Chlammy, enquanto Fi continuava acariciando-a.

“Ahh, como eu já suspeitavaa; sempre digo que Chlammy é muito fácil de se empolgaaar.”

Ressentida, mas sem afastar a mão de Fi, Chlammy continuava tentando protestar.

...Então, Fi estava basicamente dizendo que não se importaria em destruir sua terra natal, contanto que fosse pelo bem de Chlammy. Em circunstâncias normais, palavras como essas levantariam suspeitas… mas Sora sentia que — talvez por ter recebido algumas memórias de Chlammy — aquelas palavras estavam livres de falsidade. Ao comparar o relacionamento das duas… com o que ele tinha com Shiro, uma estranha simpatia emergiu.

“E-eu disse que não chorei, tá bom?! S-só porque você me conhece desde que eu era uma bebê, poderia por favor parar de me tratar como uma criança?!”

Observando isso, Sora se lembrou silenciosamente, pelas memórias de Chlammy, da idade de Fiel. Ela parecia estar no início da adolescência, mas, sendo uma Elfa ou algo assim, na verdade — tinha cinquenta e dois anos. E, ao ver o sorriso de Fiel enquanto continuava acariciando Chlammy, sem nenhum sinal de satisfação, Sora pensou:

(—Não tanto uma amiga, mas mais como uma mãe… é.)

Assim, como se testemunhassem algo desconhecido, com um leve sentimento de inveja, Sora e Shiro observavam silenciosamente…

******

“Muito bem! Compartilhamos nossas mentes; agora, para aprofundar ainda mais nosso relacionamento—”

“Eu não vou entrar no banho com você.”

“C-c-como você sabia?!”

Sora ficou atordoado por ter seus pensamentos lidos tão facilmente. Chlammy olhou de volta para ele, exasperada, e suspirou.

“Esse homem esqueceu que me deu todas as suas memórias?”

“Mgh—mghghh!”

Maldição, essa era uma situação extremamente problemática. Neste mundo, a obtenção de material impróprio era uma questão de importância máxima! E agora que eles tinham até mesmo uma garota elfa, Fiel—como ele poderia deixar passar essa chance?! Enquanto Sora tentava instantaneamente bolar uma estratégia, a ajuda veio de uma fonte inesperada.

“Chlammy, é importaante conhecer bem as pessoas com quem você vai lutar.”

“H-hein?!”

Com as palavras de Fi, quem ela acreditava ser sua amiga, a máscara de Chlammy caiu.

“Ora, você me disse para me dar bem com a Jibril, não fooi?”

“O-o que isso tem a ver com todos nós entrarmos no banho e sermos fotografados?!”

Mas Sora, como se esse fosse o momento, mobilizou todas as células de sua matéria cinzenta. O instinto de Sora sussurrava que, embora ele não soubesse a intenção de Fi, tinha que aproveitar essa oportunidade.

“No mundo de onde viemos, há uma prática tradicional japonesa para aprofundar amizades—através da ‘comunhão nua’.”

Sora falou com ousadia, e Chlammy retrucou.

“Q-quando foi que você usou um banho para esse propósito desde que chegou a este mundo?!”

Para Chlammy, que possuía as memórias de Sora, era fácil apontar isso. Era algo óbvio; Sora nunca tinha pensado em tal coisa. Era natural que Chlammy o questionasse. Mas, ainda assim—era possível vencer esse debate!

“Bem, veja, Steph e Jibril já foram efetivamente vinculadas a mim pelos Pactos. Mas, neste caso, estamos contando com sua ajuda baseada em uma relação de confiança. Agora só podemos recorrer à cultura tradicional—Jibril, por favor.”

“À disposição.”

Sora estalou os dedos, e Jibril deslizou de joelhos para ficar ao lado dele.

“Fiel serva, você pode usar este tablet para explicar a eles a grande tradição japonesa da ‘comunhão nua’?”

Entendendo perfeitamente a intenção de Sora, Jibril manipulou o tablet.

“Ahem—‘comunhão nua’ tem suas raízes em um antigo ritual que remonta ao Período dos Estados Combatentes no Japão, no qual os participantes demonstravam uns aos outros que não tinham armas escondidas e expunham seus corpos para revelar suas habilidades, de modo a mostrar suas mãos limpas e provar sua boa fé.”

Com a fabricada explicação impecável de Jibril, escrita em lugar nenhum, Chlammy, no entanto, rebateu ainda mais.

“V-você está mentindo! Não há nenhuma história dessas nas memórias de Sora!”

“É, eu mesmo não sabia das raízes. Mas você deveria conseguir encontrar alguma memória de que isso aprofunda a confiança?”

Um momento de pausa. Provavelmente vasculhando as memórias de Sora—e então.

“—Tudo o que vejo são memórias lascivas superando totalmente coisas assimmm?!”

Chlammy, presumivelmente inundada de trechos eróticos e vídeos comprometedores, ficou vermelha como um tomate e gritou. Aparentemente incapaz, afinal, de simplesmente assistir a isso, Fi interveio.

“Tá beem, Chlammy. Deixe-me falar em seu nome.”

“H-o quê? Uh, t-tudo bem—obrigada—”

“Senhor, imagino que você mesmo já tenha percebido isso, mas o que Chlammy está tentando dizer é o seguinte. Ela não tem confiança no corpo dela, então prefere—”

“E-E-E-E-E-Eu não estou tentando dizer nada disso!!”

Fi, de olhos arregalados e expressão vaga.

“Não está? Mas…”

Os olhos de Fi percorreram o ambiente. Passaram por Jibril, por Steph, depois pelo próprio busto de Fi. E, finalmente, pousaram no peito de Chlammy. Seus olhos, cheios de compaixão.

“Ora, não se preocupe, Chlammy. O valor de uma mulher não está no peito, sabia!!”

“—A-ah… T-tudo bem, já chega! Eu vou!”

Chlammy apontou furiosamente para Shiro.

“A-acham que eu teria esse tipo de insegurança na presença de uma garotinha como esta?”

Shiro, apontada, ergueu os olhos de seu dispositivo portátil e inclinou a cabeça. Mas Fi, com um sorriso ainda mais gentil, no tom de uma mãe ensinando uma criança.

“Chlammy, se comparar com uma criancinha só está se humilhando ainda maais.”

Chlammy bateu as mãos na mesa e levantou-se… À beira das lágrimas.

“Fi, eu te odeio! N-não quero saber; onde é o banho?!”

“Muito bem, eu os acompanharei a todos!”

Imediatamente, Jibril apareceu, carregando itens de banho para cada um, sabe-se lá quando os pegou.

“…Eu também vou entrar, não vou? Sim, isso era esperado, não era?”

…E assim, observando Chlammy e Steph serem conduzidas por Jibril, Sora, segurando Shiro, levantou-se e perguntou a Fi, que também começava a segui-los.

“—Então, por que você colaborou com a minha mentira?”

“O quê, quer dizer que era mentira? Ora, que abominável.”

Fi ainda sorria enquanto devolvia a mentira com a mesma leveza. Mas, diante do silêncio indagador de Sora e Shiro enquanto caminhavam ao lado dela, Fi respondeu.

“…Se todos se despirem, posso analisar suas personalidades até certo ponto pela atividade espiritual em seus corpos, e se eu puder compreender a probabilidade de alguém me matar enquanto durmo, isso torna mais fácil lidar com issso.”

“Entendi,” riu Sora. “Então você quer a comunhão nua, exatamente como Jibril disse.”

Com seu sorriso habitual, fofo e—sim, evasivo, Fi continuou.

“As memórias que você deu à Chlammy fizeram com que ela confiasse em você incondicionalmente. Não tenho como saber o conteúdo delas, e sou verdadeiramente grata por você não ter tirado nossas vidas—mas.”

Ainda sorrindo, Fi estreitou os olhos.

“Você não deveria assumir que, só porque Chlammy confia em você, eu também confio.”

Seus olhos levemente entreabertos diziam—se isso também fosse um truque. Então ela usaria quaisquer meios à sua disposição para apagar Sora e companhia da face da terra, levando toda Elkia junto. Ainda assim, afastando aquele olhar, Sora respondeu com um sorriso.

“Você está certa. Se você fosse burra o suficiente para confiar em um trapaceiro quando ele diz ‘Confie em mim’, isso seria um problema para mim também.”

Em silêncio, ainda sorrindo, Sora e Shiro caminharam ao lado de Fi. De repente, Sora perguntou.

“Ei, deixa eu perguntar—todos os Elfos têm a mente tão rápida quanto a sua?”

Rindo suavemente da pergunta, Fi respondeu.

“Se eu soubesse disso, então saberia exatamente até que ponto minha traição já foi descoberta.”

—Ela, afinal, até considerava a possibilidade de que alguém estivesse fingindo não perceber.

“Ha-ha, parece que Elven Gard pode ser nosso inimigo final, no fim das contas.”

“Contanto que você não machuque Chlammy, ajudarei com todas as minhas forças.”

—Desde que eles não machucassem Chlammy, ela não se importava se destruíssem Elven Gard. Implícita, mas claramente dizendo isso, Fi.

“Agora, senhor, em consideração à preparação do terreno, é hora de eu ir ao lado de Chlammy.”

Observando Fi alcançar Chlammy com passos suaves e delicados, Sora murmurou de lado.

“—Jibril.”

“Estou aqui.”

Ouvindo o leve sussurro de Sora e instantaneamente aparecendo às suas costas, Jibril falou.

“…Ela usou algum tipo de magia?”

“Não, não houve nenhuma resposta, absolutamente.”

Com essa resposta, Shiro franziu ligeiramente a testa.

—Era um incômodo com a possibilidade de alguém ter previsto três ou quatro jogadas à frente de seu irmão, algo que nem mesmo ela ainda tinha alcançado. E Sora, também, riu um pouco, meio arrependido, coçando a cabeça.

“Ela consegue enxergar minhas intenções verdadeiras sem usar magia? Se for o caso, isso abala um pouco minha confiança.”

Se ele perdesse para uma usuária de truques mágicos fenomenais em astúcia e jogos mentais, estaria realmente em apuros. Será que Fi tinha realmente previsto até o último movimento que ele havia planejado?

“…Bem, eventualmente teremos que enfrentar Elven Gard também; então é melhor começarmos a ter uma noção das habilidades deles.”

******

—Agora, claro, bastante lenha havia sido queimada em consideração à adequação etária. Mas, por trás da névoa de vapor que todo aquele fogo criara, encontrava-se, indubitavelmente, o paraíso. Paradise. Na câmara do banho, sentava-se uma Shiro emburrada. Embora as coisas tivessem melhorado um pouco graças ao misterioso xampu “especialmente formulado com água espiritual” que Jibril havia trazido, ainda parecia que ela não gostava de banhos. Steph, ainda assim, lavava o cabelo de Shiro, e então arregalou os olhos ao ver Chlammy entrar.

“O quê, Chlammy, você tinha um corpo assim?”

“Hmph, sou do tipo que parece mais magra com roupas…”

Depois de ser tão provocada sobre sua aparência, Steph ficou espantada ao ver que Chlammy tinha uma silhueta tão ideal quanto a de uma modelo. Jibril e Fi também deveriam estar presentes. Sim, deveriam estar… E considerando que era um banho—obviamente, sem uma única peça de roupa. No entanto, Sora, vestido e de costas para elas, não tinha como verificar nada disso.

(Por favor… ó câmeras de nossos celulares e tablet. Eu acredito em vocês!)

As câmeras haviam sido posicionadas em três pontos estratégicos para evitar o risco de gravar uma menor nua—Shiro. De repente, enquanto Sora rezava para que desta vez suas câmeras capturassem uma imagem perfeita, suprimindo seu impulso de se virar, ele ouviu alguém se dirigir a ele.

>

“...Mestre, você esperava por isso?”

Arrancado de seus devaneios pela voz de Jibril atrás dele, Sora respondeu afirmativamente.

“Claro.”

Sem poder se virar (oh, paciência)—Sora chamou por cima do ombro.

“Fi… Uh, digo, Fiel, Sua Alteza?”

“Ohh? O que é isso de repente, agindo tão formal.”

Com a resposta de Fi, aparentemente bem próxima dele, Sora continuou.

“O feitiço que você está usando para disfarçar os seios da Chlammy, é uma ilusão? Ou você está realmente transformando-os?”

“Ora, estou transformando, mas já que mencionou isso—”

Ainda sorrindo, Fi falou.

“Chlammy, o jogo acabou, e, de qualquer forma, acho que disfarçar é um pouco desrespeitoso na comunhão nuua.”

Com um som como o de uma rolha sendo retirada de uma garrafa, a magia foi dissipada e, de volta à sua forma original—Chlammy de peito plano.

“Não admita isso tão facilmente, Fi! Se era para fazer isso, você nem deveria ter feito nada desde o começo!”

Por algum motivo, estranhamente simpatizando com o cruel dilema dela, Steph interveio.

“…Está tudo bem. Se você erguer a cabeça, coisas boas virão.”

“Não me olhe assim! Eles vão crescer!”

Chlammy interpretou erroneamente o conforto de Steph como sendo sobre seus seios; Fi retomou sem se abalar.

“Então, que tipo de magia você deseja?”

“Mm—que bom que chegamos ao ponto.”

Com Fi captando com precisão sua intenção, Sora assentiu grandiosamente e falou.

“—É possível você me transformar em mulher?!”

A força de sua voz reverberou além de suas costas, agitando o vapor que permeava o ambiente, como se convocasse um vento divino…

“Se eu tivesse isso, poderia contemplar o paraíso se desdobrando atrás de mim! Se eu fosse do mesmo sexo, não importa como alguém olhasse, seria completamente puro! Se isso fosse classificado como +18, então banhos públicos e águas termais também seriam! Seria perfeitamente, invencivelmente puro!”

“Se a lascívia que gira no seu coração for a mesma, acho que, fundamentalmente, seria a mesma coisa.”

“Não há nenhuma evidência física pela qual você possa provar o que está no meu coração!”

“Que fantástico, Mestre! Estou emocionada com sua disposição inabalável de levar adiante uma lógica tão absurda!!”

E então, Fi lhe disse.

“É possível, suponho.”

“Sério?!”

O esforço puro, exigido por sua razão, para reprimir o reflexo espinhal de se virar ameaçava causar dor nas costas a Sora. Ohhh… Ohh, uma deusa estava diante dele—não, atrás dele!

“No entanto, você não pode voltar atrás, não se importa?”

—Quê?

“Existem dois elementos mágicos que determinam seu sexo. Se você tiver dois do mesmo elemento, então é mulher; se forem diferentes, você é homem; por magia, é possível torná-lo mulher ao tornar os elementos iguais; no entanto, não sou capaz de reverter issso.”

...Por que, depois de vir para um mundo de fantasia, ele ainda estava sendo instruído sobre cromossomos X e Y? Shiro, com Steph lavando seu cabelo, respondeu por ele.

“…Não, obrigada…”

Sora, olhando para o teto—não, para o céu invisível, chorou lágrimas nada masculinas.

“Vamos lá, fantasia… Em um mundo com pactos e magia, como você não consegue simplesmente mudar o sexo de alguém?! Levanta essa bunda, mundo idiota; faz algum esforço!!”

Embora Sora tenha gritado, tudo o que ele podia fazer agora era pintar a vasta extensão celestial atrás de si em sua mente. E deixar tudo para o poder do esforço humano—confiando na ciência das três câmeras…

******

O Castelo Real de Elkia — a biblioteca. Sora e Shiro aparentemente haviam vindo direto para cá após saírem do banho. Shiro, com o cabelo ainda molhado envolto em uma toalha, estava intensamente rabiscando algo no quadro-negro. Ao lado dela, Sora mexia no tablet enquanto traçava linhas em incontáveis folhas de papel. O sol começava a se pôr, e tudo o que iluminava a sala era a chama trêmula de velas e o brilho do tablet de Sora. A atmosfera descontraída de momentos atrás havia desaparecido completamente de seus rostos sérios.

“—…”

Havendo pensado em dizer algo antes de ir embora, Chlammy ficou parada, observando. Incontáveis folhas de papel estavam espalhadas pelo chão, algumas riscadas, outras marcadas com um X. O significado da gama de símbolos que Shiro anotava no quadro, das incontáveis linhas que Sora desenhava, não era inteiramente compreensível para ela, mesmo com o presente das memórias de Sora. Contudo—ela tinha uma ideia. Depois de uma respiração profunda, Chlammy entrou na sala.

“...Essa é a sua estratégia para derrotar a União Oriental?”

“Mm, desculpe, não fale com a Shiro—bem, acho que mesmo que fale, ela não vai notar.”

Como se nem tivesse percebido a conversa, Shiro, sem piscar, continuava rabiscando inúmeras equações no quadro, como uma máquina.

“Eh, francamente, isso é a área da Shiro. Eu não tenho ideia; só estou agindo como assistente.”

O que Sora desenhava com a mão direita parecia claramente para Chlammy como mapas estratégicos. Contudo, o que ele olhava no tablet que manipulava com a mão esquerda—

“Você pergunta por que estou revisando as filmagens do banho agora há pouco?”

“...Se espera uma reação como a da Stephanie Dola vindo de mim, vai se decepcionar.”

“Não é muito convincente quando você está corando e cobrindo os seios.”

—Esqueça, ela estava errada em esperar ter uma conversa significativa com este homem. Quando Chlammy se virou com esses pensamentos, a voz de Sora a deteve.

“Você veio perguntar se podemos realmente vencer, não é?”

—Chlammy foi lembrada de como achava este homem desagradável. Ele parecia ter o hábito de interromper os pensamentos dos outros. Isso já era claro pelas memórias que ela havia recebido—mas, ainda assim. Havia uma coisa que pesava em sua mente.

“—Sim, é isso mesmo.”

“Você sabe a resposta, não sabe? Você tem minhas memórias.”

“Elas não explicam tudo.”

Sim, ela ainda não conseguia entender. A estratégia que Sora e Shiro haviam desenvolvido juntos era, de fato, uma obra esplêndida, um feito impressionante. Mas—por mais que ela analisasse, havia uma falha. E, mesmo assim, Sora, sabendo dessa falha, havia concluído que isso não era um problema. Não importava onde olhasse nas memórias de Sora, ela não conseguia encontrar a base para a confiança que o tornava tão seguro.

“É certamente possível na teoria. Mas teoria é uma coisa—”

Havia uma observação comum que ela podia fazer sobre o jogo de xadrez que haviam jogado, sobre a partida de Othello—não. Sobre toda a gama de jogos que Sora se lembrava de ter jogado—que era.

“Se vocês cometerem um único erro, estarão no fundo do abismo, não é? Como você pode chamar isso de ‘invencível’?”

—Sim, tantas partidas decoradas com vitórias nas memórias de Sora. Mas todas eram construídas sobre um equilíbrio extremamente perigoso. Como isso podia ser chamado de “invencível”? Mas então Sora falou, olhando para Chlammy como se genuinamente surpreso.

“Não é invencível se cometermos um único erro. É por isso que não podemos cometer um único erro, certo?”

—Era isso. Por mais que ela buscasse nas memórias de Sora, não conseguia encontrar a base para essa afirmação.

“Como você pode ter certeza de que não vai cometer um único erro?”

Enquanto Chlammy o encarava severamente, Sora ainda respondeu com uma risada.

“Ha-ha-ha, bem, isso é impossível. Se fosse só eu, com certeza eu estragaria tudo… mas—”

Fffft. Os olhos de Sora desviaram, e ela os seguiu—até a pequena gênia de cabelos brancos. Ferozmente escrevendo mais equações no quadro, a branca, branca, garota de onze anos.

“—‘Blank’ é outra história. Mesmo se eu errar, tem a Shiro.”

A frase que preenchia as memórias de Sora—“ ” não perde. Chlammy, tendo chegado tão longe, finalmente percebeu um fato que havia ignorado. O jogo de Othello que haviam jogado pela existência um do outro. As últimas três peças que ela não conseguiu capturar—três elementos mais importantes que o próprio ser dele. Agora, ela sentia que sabia o que eles representavam.

(…Entendi. É porque eu só tenho as memórias de Sora individualmente que isso não parece invencível… isso explica.)

A existência de uma irmã que ele valorizava mais do que a própria existência—Shiro. Se era isso que o fazia dizer que a estratégia do duo, embora parecesse caminhar em um penhasco equilibrando-se em uma corda de algodão, era invencível, então ela, que falhou em capturar essa confiança dele—nunca poderia entender sua segurança. Mas as inúmeras palavras que Sora havia dito para Shiro. E as inúmeras palavras que ele havia dito para si mesmo.

“—Você… encontrou suas asas, não foi.”

“Mm?”

E, imitando Sora, Chlammy sorriu e falou.

“—‘Ei, Shiro, dizem que as pessoas podem mudar, mas isso é realmente verdade’… certo.”

“Qu-quê?!”

—Lá estava. Ela queria ver sua expressão. Assim, Chlammy sorriu satisfeita ao ver o rosto corado de Sora e se virou.

>

“É meio constrangedor, mas devo dizer que respeito esse jeito de pensar. Por que não sente orgulho disso?”

“Cala a boca!”

“Deve ser difícil ter uma irmã tão boa assim. Acaba te deixando com algo a provar, não é—querido—irmão—mais velho.”

“Olha aqui, você—só vai embora já! As pessoas vão começar a desconfiar se você ficar muito tempo em Elkia!”

Enquanto saía, muitos pensamentos passaram pela cabeça de Chlammy. Mas ela decidiu não dizê-los. Em vez disso, virou-se—e deixou um breve comentário.

“—Eu acredito…no ‘potencial humano.’”

As palavras que vieram como resposta foram mal-humoradas, mas firmes.

“Sem dúvida. Você também é humana.”

Fechando os olhos diante dessas palavras, Chlammy deixou o castelo de Elkia.

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