Nv. 99 Princesa da Chama Negra

Capítulo 7

Nv. 99 Princesa da Chama Negra

— …Não está aqui. — Eunha vagou pelo portão vazio, parou e murmurou. O quinto monstro nomeado não aparecia. Parecia que já tinham se passado algumas semanas. Nunca o portão ficara tão silencioso por tanto tempo, o que era estranho.

【O portão foi reiniciado.】

【- – – Carregando – – -】

【Nv. 30 Tigre Negro de Olhos Vermelhos se revela!】

Essa não era a única coisa estranha. Os tigres, que normalmente avançavam assim que a viam, de alguma forma haviam se tornado dóceis. Eles continuavam a ressurgir, mas não atacavam primeiro, apenas reagiam se Eunha atacasse. Às vezes, os monstros até fugiam sem sequer mostrar os dentes.

“Isso é resultado de aprendizado iterativo?”

Ela se lembrou de um documentário sobre orcas que havia assistido. Por que as orcas, apesar de serem extremamente violentas, não atacavam humanos em primeiro lugar, de todas as espécies? Havia muitas hipóteses, mas a principal era que elas se lembravam de humanos massacrando outras orcas.

Eunha virou-se para o Tigre Negro de Olhos Vermelhos. O monstro choramingou e começou a fugir.

“O aprendizado iterativo também pode ser aplicado a monstros?”

Impossível. Eunha inclinou a cabeça enquanto o perseguia. Pelo menos, os monstros que enfrentara até agora não pareciam tão inteligentes.

Bam!

O tigre caiu no chão com um baque surdo. Mesmo que mostrassem bandeira branca, Eunha nunca perdoaria um monstro facilmente. Agora que estava equipada com vários saques e poderes únicos, monstros de Nv. 30 não passavam de capangas para ela.

“Parece que hoje também voltarei de mãos vazias.”

Enquanto isso, Eunha se virou com o rosto enevoado. O número de reinicializações que lembrava já passava de vinte. Sua experiência lhe dizia que o quinto monstro não apareceria hoje. Queria dar mais uma volta para ter certeza, mas seu corpo não estava bem. Talvez por ter gasto tempo vasculhando o portão em vez de descansar. Parecia melhor voltar e se recuperar.

De volta à cabana, Eunha olhou para seu reflexo em uma poça d’água. O sangue espirrado da batalha anterior desenhava uma linha vermelha de sua bochecha até o pescoço. Isso horrorizaria qualquer um, mas Eunha, acostumada, levantou a manga e limpou calmamente o rosto.

【A Criatura Mítica Viajante Felino das Trevas acorda de sua soneca. Ela se espreguiça, vai até você e esfrega a bochecha em sua perna.】

— Foi um dia inútil — respondeu Eunha com uma voz desolada, contrastando com o bom humor do gato. — Será que consigo mesmo sair daqui?

【A Criatura Mítica Viajante Felino das Trevas inclina a cabeça e pergunta se você deseja partir. Pergunta se não foi você quem escolheu ficar desde o início, olhando como se não conseguisse entender.】

Não estava errado. Eunha havia escolhido ficar no lugar de seu colega. Uma janela de mensagem amarela apareceu novamente diante dela enquanto permanecia em silêncio.

【A Criatura Mítica Viajante Felino das Trevas adverte em silêncio que o exterior é perigoso.】

Mas Eunha pensava diferente.

— Não acho que um monstro conseguiria me matar se eu saísse nesse estado.

Provavelmente não era uma ilusão arrogante. Cada monstro nomeado era dez níveis mais forte que o anterior. O primeiro era Nv. 68, o segundo Nv. 78, o terceiro Nv. 88 e o quarto impressionantes Nv. 98. O nível máximo de um monstro era dito ser 99. Em outras palavras, Eunha havia derrotado quase o monstro mais forte existente.

【A Criatura Mítica Viajante Felino das Trevas tenta seduzi-la docemente, dizendo que seria melhor viver feliz ali, sozinha com ele.】

Apesar do que o gato dizia, Eunha saiu da cabana no dia seguinte, e no outro, para caçar. Não encontrou saque, nem pistas. Nem mesmo a sombra do quinto monstro nomeado.

“Mas que inferno?”

Talvez fosse necessário cumprir alguma condição específica para fazê-lo aparecer, ou simplesmente poderia ser um erro interno do sistema. Esse erro também poderia explicar por que os monstros não a atacavam primeiro ultimamente.

“Deixa pra lá.”

Eunha recostou-se na parede da cabana e ficou olhando para o vazio, exausta. Fitando as marcas de risco que havia feito na parede com olhar turvo, levou a mão até a pulseira dos desejos em seu pulso esquerdo, quase por hábito.

“O aniversário de morte da minha mãe já deve ter passado.”

Ela não tinha como medir o tempo com precisão, mas era provável. Não importava o quão ocupada estivesse com caçadas, Eunha sempre visitava o túmulo da mãe todos os anos, sem falhar, porque não havia mais ninguém para fazê-lo.

“Parece que já se passaram dois anos.”

Isso significava que o túmulo de sua mãe estava abandonado há dois anos ou mais. Deveria estar coberto de ervas daninhas e poeira, ou talvez até mesmo um animal o tivesse revirado. Quando essa imagem lhe veio à mente, Eunha saltou de seu lugar.

【A Criatura Mítica Viajante Felino das Trevas morde a barra do seu vestido. Ela se deita a seus pés, dizendo que vocês tinham combinado de jogar o jogo de palavras, e pergunta se você esqueceu.】

— …Desculpe. Mas eu quero sair daqui o quanto antes.

As pessoas eram astutas. Eunha não se sentira assim quando decidiu que jamais conseguiria escapar, mas agora havia uma diferença, mesmo que fosse a mais tênue esperança.

【A Criatura Mítica Viajante Felino das Trevas olha para você com olhos tristes.】

— Me desculpe.

A janela de mensagem amarela se despedaçou no ar como peças de quebra-cabeça à vontade de Eunha. Ela deixou a cabana sem olhar para trás, sem deixar espaço para qualquer dúvida.


Seul, Coreia. 18:31h

Gwanghyeon Kim, um líder de equipe afiliado à Associação de Jurisdição dos Caçadores, encarava uma folha de papel em sua mão.

Nome: Si-u Shin

Número de Registro:

Afiliação: Guilda Lobo

Vigor: S

Mana: S

Poder de Combate Geral: S

Potencial: 120%

Habilidades Únicas: Afiliação com a Natureza

Observações: Não registrado (uma licença deve ser emitida)

<Resultado da Avaliação: Rank S>

Revisar os resultados repetidamente não fazia diferença. A avaliação não exibia detalhes sobre contratos com Criaturas Míticas, porque as Míticas não queriam isso. Mas mesmo que não estivessem visíveis, Gwanghyeon já sabia que Si-u era a encarnação do Cão. Ele levantou os olhos dos resultados da medição e olhou para o jovem à sua frente.

Vestindo um moletom largo, Si-u parecia irritado por estar ali, com um fone de ouvido em uma orelha e o queixo apoiado na mão. Ele escondia cabelos lisos e azul-escuros dentro do capuz enquanto sugava o canudo de sua bebida. Havia a ilusão de que água fluía dentro dos olhos azuis de Si-u. Caso contrário, talvez ele apenas estivesse para bocejar.

Gwanghyeon começou com extremo cuidado e cortesia: — Uhm, o tutorial é obrigatório, então mesmo que você tenha sido avaliado como Rank S, não podemos deixá-lo de lado.

— …Vai parar de me incomodar depois disso? — Si-u o encarou pela primeira vez. Fazia exatamente 49 minutos que estavam conversando naquele café, e Si-u só havia escutado em silêncio. A parede de gelo que parecia inquebrável finalmente começava a ceder.

Gwanghyeon assentiu fervorosamente, temendo perder a chance: — Claro. Você será aprovado como um caçador oficial assim que completar o tutorial, e poderá continuar caçando da forma que desejar. Se quiser, pode sempre entrar em contato com nossa Associação…

— Entendido — interrompeu Si-u, levantando-se. Ele colocou o outro fone, enfiou as mãos nos bolsos e lançou um olhar a Gwanghyeon com seus olhos azuis. — Te vejo em uma hora, então. Vou deixar minha mochila aqui. — Si-u nem sequer levou sua bagagem ao sair do café.

O portão de Rank B que Gwanghyeon mencionara estava por perto. Quando Si-u chegou à entrada, um policial de plantão o reconheceu e se aproximou.

— Você é o caçador Si-u Shin?

— Sim.

O policial observou o jovem. “Então este é o filho do Mestre da Guilda Lobo…”

Ele já havia chamado muita atenção por ser o próximo herdeiro da Guilda Lobo, a maior da Coreia, provavelmente desde que nasceu. Mas por algum motivo, nunca havia se revelado ao público. Somente alguns poucos sabiam que ele era o caçador Rank S ‘Lobo Branco’, de quem tanto se falava atualmente. O Si-u que conheceu pessoalmente era diferente do que imaginava. Aquele boato de que ele era fraco devia ser só isso, um boato.

“Ele é só um universitário por fora… Esquece, estou corrigido.”

Sua aparência se destacava demais para ser comum. O cabelo, que parecia tinta azul derramada sobre preto natural, brilhava ainda mais sob a luz da rua. Seus olhos, calmos como um lago e incolores como a água, eram mais transparentes do que azuis. Era comum a cor das íris mudar como efeito do Despertar, mas essa coloração era extremamente única. O sexto caçador Rank S da Coreia, com tal aparência, seria extremamente popular se revelasse seu nome e rosto reais ao mundo. Por que ele escondia sua identidade?

Reprimindo perguntas que jamais ousaria fazer em voz alta, o policial falou: — A Associação nos contatou com antecedência. Por favor, avise quando estiver pronto. Abriremos o portão.

— Pode abrir agora — respondeu Si-u com firmeza.

“Vai entrar no portão assim mesmo?”, O policial arregalou os olhos em descrença. Si-u usava apenas um moletom e jeans. Parecia que tudo o que levava era o celular no bolso de trás. Caçadores de alto rank normalmente usavam armas ou armaduras especiais, mas ele estava muito vestido de forma simples.

Mas o que poderia fazer? Se Si-u mandasse abrir, ele tinha que obedecer. O policial estendeu a mão até o dispositivo de ativação do portão. Ao acioná-lo, a barreira que ocultava a entrada desapareceu. A fenda esverdeada se abriu como uma boca o convidando para entrar.

— Que horas são?

— São 19:23h.

— Obrigado. — Si-u não hesitou ao correr para dentro do portão.

— Ah, caçador Shin. Precisamos que preencha o formulário de consentimento pri…

O policial tentou detê-lo, mas Si-u já havia desaparecido dentro do portão.

— …Será que ele vai ficar bem? — Um policial mais novo se aproximou e perguntou baixinho, preocupado com o jovem caçador que saltara sozinho em um portão de Rank B. Ele não sabia que o jovem era o sexto caçador Rank S da Coreia, além de filho do Mestre da Guilda Lobo.

O policial mais velho coçou a garganta como se quisesse dizer algo, mas apenas deu de ombros e seguiu as regras. — Parece que vamos voltar cedo pra casa hoje.