O Príncipe Problemático

Volume 2 - Capítulo 151

O Príncipe Problemático

O choro de uma criança ecoava pelos barracos onde todos os sobreviventes tinham sido alojados. Levantando-se de onde estava agachada para cuidar da fogueira, Erna sentiu uma pontada aguda no lado ao se endireitar. Pôs a mão nas ataduras que envolviam sua cintura e foi até a criança que chorava.

“Descanse um pouco, minha senhora, eu cuido da criança”, disse Erna à mãe exausta, de rosto pálido.

Ela pegou o bebê, embalou-o em seus braços e começou a balançar, murmurando algo suave e reconfortante. A criança logo parou de chorar. Erna colocou a criança dormindo ao lado da mãe que também dormia.

“Você deveria descansar”, disse um voluntário de meia-idade. “Você parece que passou por maus bocados.”

“Não estou tão machucada assim, vou ficar bem”, respondeu Erna.

“Hmm, espero que até o fim do dia todos sejam transferidos para o hospital.”

Erna olhou em volta do barraco, cheio do barulho dos feridos gemendo em suas camas e do vento soprando pelas frestas da lona. Era o barulho do rastro de um acidente terrível.

Erna e Lisa se agarravam uma à outra enquanto eram jogadas para dentro do trem. Em algum momento, Erna perdeu a consciência. Quando recobrou os sentidos, despertada por uma dor lancinante, viu que o trem inteiro havia capotado, as janelas quebradas servindo agora como claraboias.

Ao perceber o que havia acontecido, ela e Lisa saíram do trem às pressas. Erna não conseguia se lembrar como foi capaz de levantar e carregar Lisa, mas juntas, elas tinham conseguido sair do vagão retorcido.

Assim que colocou Lisa no chão e estava prestes a desabar na neve, o som do mundo se partindo alertou a todos para mais um deslizamento de terra. Gritos de pânico foram abafados enquanto a lama engolia mais do trem. Os que haviam conseguido sair, choravam abertamente.

Erna e alguns dos outros sobreviventes correram de volta para o trem, fazendo tudo o que podiam para libertar aqueles que pudessem ser libertados, mas principalmente, Erna cambaleou em estado de choque. Quando o resgate chegou, homens fortes começaram a escavar o trem, enquanto as mulheres guiavam os sobreviventes para o acampamento improvisado.

“Sua Alteza?”, disse Lisa, tirando Erna de sua lembrança. “A senhora também não conseguiu dormir?”

“Não, dormi um pouco, acabei de acordar.” Poderia ser verdade, ela fechou os olhos por um ou dois segundos.

Lisa farejou enquanto remexia em uma sacola de ajuda humanitária, tirando uma cantimplora e uma barra de chocolate. Ela ofereceu a Erna.

“Desculpe, Sua Alteza, eu deveria ter estado a protegendo.”

“Está tudo bem, Lisa, de certa forma, você me protegeu, se machucando no meu lugar.”

“Mas eu sobrevivi graças a você.”

“Então acho que nos protegemos mutuamente”, Erna riu. “Está tudo bem, Lisa.” Erna esticou os braços e abraçou Lisa.

Apesar da chegada do resgate, a situação não melhorou muito. Os sobreviventes eram numerosos e tantos quantos mortos. Não havia transporte suficiente para aqueles que precisavam de atendimento médico urgente.

Erna e Lisa foram enviadas a um barraco improvisado com todos os outros feridos leves. Elas receberam primeiros socorros, comida e uma fogueira para se aquecerem. Elas se ajudaram e sobreviveram.

Erna agarrou Lisa com força, sem querer soltá-la, mas havia coisas que precisavam ser feitas, tarefas e trabalhos para mantê-las ocupadas até que pudessem sair dali e entrar em contato com a família. Elas precisavam juntar lenha, trocar curativos e cuidar dos idosos.

Enquanto Erna priorizava sua lista de tarefas, ela olhou para o barraco, estudando os rostos de todos ali. Naquele momento, o pensamento da família a atingiu e, naquele instante, outra criança acordou e começou a chorar.

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Bjorn deixou-se guiar por Leonid e, ao virar uma esquina, deparou-se com um aglomerado de grandes tendas, onde voluntários aguardavam o transporte, cercados por equipamentos de resgate e caixas de comida.

Ele parou e olhou para a fraca luz que cintilava através da névoa da neve. Sua respiração estava quente e colunas de umidade se elevavam para o céu. Erna estava a salvo. Levou algum tempo, mas sua mente dolorida finalmente se agarrou a esse fato.

Erna está salva e sã.

Antes que percebesse, seu corpo já se movia em direção ao acampamento dos sobreviventes. Ele havia sido levado ao limite e ficou surpreso ao ver que ainda estava de pé, ainda se movendo. Como poderia parar antes de encontrar Erna a salvo?

“Por favor, que ela esteja a salvo, por favor, Deus, que Erna esteja a salvo”, sussurrou a oração quase sem parar.

Bjorn mergulhou no barraco, a luz era forte o suficiente para cegá-lo depois de tanto tempo no escuro, procurando Erna. Ele olhou em volta da cena desesperadora de sobreviventes feridos deitados em camas improvisadas, enroladas em ataduras. Enquanto procurava, congelou ao olhar para a última cama de uma fileira.

“Bjorn?”

A mulher que estava cuidando de um bebê chorão na última cama da fileira olhou para cima e o viu. Seus cabelos ensanguentados, suas linhas cansadas e seus olhos cheios dele.

Por algum motivo, o nome que ele vinha gritando freneticamente a noite toda escapou de sua memória. Tudo o que Bjorn pôde fazer foi encará-la e rir.

Ele estava cheio de raiva e alegria profundas. A mulher à sua frente estava tão ressentida quanto o medo distante que ele sentira. Parecia que seu coração humilde havia afundado na lama, mas seus olhos eram poças perfeitamente delineadas de escura determinação. Ele era ao mesmo tempo servo e rei de seu pequeno domínio.

“Oh meu Deus, Bjorn.”

Os gritos assustados de Erna ecoaram pelo barraco. A atadura caiu de sua mão e rolou pelo chão até os pés dele. Erna teve dificuldade em articular suas palavras e simplesmente piscou para Bjorn com olhos grandes e brilhantes.

Um sorriso se espalhou pelo rosto de Bjorn. Depois de todo esse tempo, Erna estava bem e fazendo o trabalho de enfermeira. Ele estava atônito, mas por outro lado, sentiu um alívio imenso.

“O que… o que aconteceu? Por que você está aqui?”, disse Erna, lutando para manter a voz firme.

Ela não conseguia acreditar que o homem parado à sua frente, essa bagunça de um Príncipe, era Bjorn Dniester, mas aqueles olhos não poderiam pertencer a nenhum outro. Eles estavam tão frios quanto sempre e suaves, mas ela pôde ver algo novo neles, será que era medo que ela via?

Erna nunca havia confundido os príncipes gêmeos por causa de seus olhos, mas agora que Bjorn demonstrava algum medo, ela quase pensou que era Leonid quem estava diante dela.

“Bjorn… por quê… você?”

As palavras mal saíram de sua boca quando Bjorn caminhou pelo barraco e a abraçou. Ele a abraçou tão forte que ela sentiu como se ele fosse parti-la ao meio. O calor de sua proximidade e o fato de ela poder sentir suas batidas cardíacas irregulares a impediram de o afastar.

“Bjorn…”

Quando ela disse seu nome, ele olhou para ela, olhando diretamente em seus olhos, enquanto seus lábios tremiam ansiosamente, como uma criança perdida finalmente encontrando sua mãe.

“Estou bem…” disse Erna, e de repente, ela sentiu as lágrimas vindo aos olhos. Ela sentia falta de Bjorn. Não havia como esconder mais, então ela encarou resignada.

Quando pensou que poderia morrer, ela se arrependeu de não ter conseguido se despedir de todos os seus amigos quando deixou Buford e quanto a Bjorn? Ela queria apertar sua mão e dizer que tudo estava perdoado. Doía pensar em todas as cicatrizes que ela sofrera até aquele momento, mas pior ainda, se ela morresse sem lhe dizer. É estúpido, mas era assim que ela era.

Ela quer amá-lo, mesmo que doa.

Se apenas ela pudesse ver Bjorn novamente, ela não fugira mais. Não importa o quanto ela quisesse se afastar. Aqui estava um homem que ela não podia simplesmente descartar e que fazia parte de sua vida tanto quanto ela fazia parte da dele.

“Olha, estou bem, Bjorn, de verdade”, Erna sorriu, com bochechas vermelhas inchadas e olhos marejados. “Heh, er… foi um acidente bem grande, mas felizmente…”

“Eu te amo.”

O sussurro baixo de Bjorn interrompeu a fala de Erna e ela olhou para ele com olhos atordoados como se estivesse perdida em um sonho. Ela não tinha certeza do que tinha ouvido, devia haver algo mais errado com ela.

“Eu te amo, Erna.”

Ele estava apenas feliz por finalmente conseguir nomear as emoções que finalmente conseguia entender. Ele tinha uma sensação de que se lembraria desse momento pelo resto da vida.

Não havia engano, Erna explodiu em lágrimas. Bjorn a abraçou forte e não disse mais nada.

Era um amor que começou como um golpe de sorte na mesa de cartas, onde ele não teve escolha a não ser vencer.

Eu te amo

Minha royal flush

Era uma homenagem sincera à bela conquistadora que tinha domado seu coração.

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