O Príncipe Problemático

Volume 2 - Capítulo 145

O Príncipe Problemático

“Como… como você sabe?” Erna perguntou, olhando para Bjorn sem entender.

“Perguntei ao médico.”

Memórias de uma tarde de fim de verão lhe vieram à mente. No dia seguinte, depois de limpar os pertences da criança, ele havia visitado o médico.

Na clínica, Bjorn pediu um relato detalhado de tudo o que sabiam sobre a criança, desde a confirmação da gravidez até o infeliz aborto espontâneo.

Naquele dia, o médico deu uma explicação completa, abordando todos os aspectos, incluindo o sexo do bebê, embora Bjorn não conseguisse se lembrar dos detalhes da explicação que se seguiu devido ao choque avassalador.

O médico o tranquilizou várias vezes de que o aborto espontâneo era algo comum e não era culpa de ninguém. Ele também ofereceu conforto mencionando que a possibilidade de um filho saudável nascer no futuro ainda existia.

Não é culpa de ninguém.

Bjorn recebeu a confirmação que procurava, fazendo a visita cumprir seu propósito.

“Nossa filha… era uma menina.” Bjorn declarou calmamente.

“Por quê?”

Erna deu um passo em direção a Bjorn, segurando as mãos no peito como se estivesse rezando. Mal havia um passo entre eles, o boneco de neve entre eles, adornado simplesmente com uma flor de neve. Bjorn sentia as lágrimas, ficou em silêncio e desviou o olhar. Para onde quer que ele olhasse, tudo era branco puro, coberto de neve, e o sol brilhante lhe ardia os olhos.

“Menina ou menino, eu não sabia qual íamos ter, então saí e comprei duas bonecas”, disse Bjorn.

“Uma boneca?” Erna disse. Seus olhos se encheram de lágrimas mais vermelhas que a tonalidade congelada em suas bochechas.

“Sim, um presente para nossa filha, no mesmo dia em que a perdemos.”

Bjorn não pôde deixar de dar uma pequena risada. Palavras que tinham sido tão difíceis de imaginar antes fluíam livremente como seda.

“Me ocorreu naquele dia, de todos os dias, que todos os problemas haviam sido resolvidos e eu finalmente pude entender todas as coisas que havia feito de errado, para você e para todos. Bem, foi uma coisa atrás da outra, não é?”

“Um presente para nossa filha, você?” Erna teve dificuldade em pronunciar as palavras.

“Não era o tipo de presente que você não gosta, eu escolhi pessoalmente, enquanto toda a loja estava em alvoroço com minha presença.”

Bjorn tentou sorrir, mas não conseguiu reunir forças. Uma sede repentina o dominou, como se lixa estivesse arranhando sua garganta. Ele sentiu um desconforto que lhe desfiava os nervos, do tipo que normalmente o faria procurar um charuto.

“Comprei um ursinho, um com fitas azuis e outro com fitas rosas. Era tão fofo e macio, que me lembrou você.” Mesmo sabendo que estava falando bobagem, Bjorn não conseguiu se conter.

As lembranças que ele tentou reprimir vieram em uma onda vívida de pelos macios e quentes em suas mãos, o cheiro de algodão, o brilho de seus olhos e nariz. Bjorn conseguia se lembrar dos detalhes da vendedora sorrindo para ele, das multidões de pessoas amontoadas para ter apenas um vislumbre dele. O tempo todo, ele não sabia que sua filha estava morta.

“Depois que comprei o urso de pelúcia, vi algo bonito, algo que realmente achei que você gostaria e eu queria te mostrar que eu queria ser um bom marido e um pai melhor. Mas o tempo todo, você estava sofrendo, sozinha.”

Bjorn tentou rir para disfarçar, mas não conseguiu. Ele tinha sido um idiota, que não conseguia se afastar de empreitadas sem sentido porque tinha muito o que queria dar. Neste ponto, os presentes amaldiçoados pareciam ser os culpados de toda sua desgraça.

“Eu deveria ter simplesmente ido para casa. Se eu tivesse, pelo menos você não teria ficado sozinha.”

Bjorn calmamente limpou as gotas de água em sua bochecha e penteou o cabelo cuidadosamente. Mesmo com a perda da compostura, ele ainda se mantinha alto e orgulhoso.

“Bjorn…”

Erna não conseguia acreditar no que estava ouvindo. Ela sabia que Bjorn nunca mentiria dessa maneira, então sabia que era assim que ele realmente se sentia. Ela não conseguia acreditar naquele momento.

“Por que você não me contou antes?” Erna estendeu a mão para ele com uma mão trêmula. “Por quê? Por que você não me contou?”

Bjorn respirou fundo e abriu os olhos. Olhando através de sua franja, seus olhos cinzentos tinham um brilho semelhante a um campo nevado frio e brilhante.

“Eu estava com medo, Erna.” A voz de Bjorn era plana e calma. “Eu não conseguia encontrar as palavras e não queria inventar desculpas. Eu estava com medo de encarar a verdade e simplesmente queria ignorá-la, viver como se nada tivesse acontecido. Abortos espontâneos são comuns, o nosso não era um infortúnio único, então pensei que, com o tempo, as coisas ficariam bem e poderíamos tentar novamente.”

Seu rosto refletia a luz do sol e parecia bonito, mas ligeiramente distorcido pela tristeza em seus olhos.

“Não é irônico, o filho que eu reivindiquei como meu, nasceu fora do casamento com outro homem. Enquanto minha filha verdadeira, meu sangue de verdade, foi perdida em um acesso de raiva por um idiota desprezível.”

Bjorn olhou para Erna em silêncio por um momento. Pensamentos e emoções confusos que tinham sido fumaça ressurgiram em sua mente, claros e vívidos como neve recém-caída.

Ele queria deixar claro que aquilo não era culpa dele, para se livrar da culpa e do remorso.

Por causa dele, Erna passou por uma série de eventos terríveis que a enfraqueceram mental e fisicamente. Tudo era tão claramente culpa dele, porque ele não apoiou sua esposa como um bom marido.

Nenhum dos abusos de Walter Hardy, ou a verdade sobre Gladys eram responsáveis pela condição de Erna. Ele havia levado sua esposa ao limite e ignorado suas necessidades. Ele havia infligido a ferida mais profunda ainda.

Pensar que Erna continuaria a suportar era egoísta e tolo. Lágrimas ameaçaram surgir novamente em seus olhos. Tudo o que ele precisava fazer era segurar a mão da esposa e dizer que a amava, uma confissão simples de seus sentimentos, mas, no fim, ele não conseguiu pronunciar essas palavras.

“Eu deveria ter te protegido, quando ouvi a notícia de sua gravidez, se eu tivesse te dado os parabéns e te assegurado que eu cuidaria de tudo, te dizendo para não se preocupar, talvez pudéssemos ter protegido nossa filha. Ou se eu não tivesse te abraçado daquela forma naquela noite. Nossa filha talvez ainda estivesse viva. Sempre que penso nisso, sinto que estou ficando louco.”

Bjorn se lembrou da noite em que finalmente desistiu de sua saudade por Erna, que estava aterrorizada, incapaz de chorar. Ele olhou para Erna e sentiu um desejo avassalador de abraçá-la, de sentir seu corpo quente contra o dele. Ele queria encontrar consolo em seu doce aroma. Consumido por esse desejo por Erna, ele deu um passo em direção a ela.

“Eu sei que é tudo minha culpa.”

Ele havia matado a filha deles.

Bjorn sentiu que finalmente poderia enfrentar o abismo de culpa e tristeza que havia enterrado fundo em seu interior. Ao fazer isso, ele finalmente entendeu o que precisava dizer a Erna.

“Me desculpa.”

Bjorn olhou diretamente nos olhos de Erna e fez um pedido de desculpas silencioso. Os dois se olharam em silêncio por um tempo, o vento suave farfalhando o vestido de Erna e a cauda do casaco de Bjorn.

“Eu nunca consegui adivinhar o que eu deveria fazer, então enterrei meus sentimentos fundo, como um covarde.” Bjorn riu novamente, apenas para não chorar.

‘Desculpa’

Erna pareceu perceber que as palavras que ela havia ouvido ele dizer na noite passada, quando estava em seus braços, não eram fruto de sua imaginação criada pela nevasca.

“Me desculpa por não ter chorado com você, eu queria me desculpar e lamentar, mas eu tinha medo de admitir que era minha culpa. Eu achei que ia te perder e, bem, acabei te perdendo de qualquer jeito.” Bjorn tentou manter a compostura, mas estava ficando mais difícil.

Erna riu. Ela riu até chorar, como se fosse uma vilã em algum conto. Ele preferia esconder isso para sempre, para que ela pudesse odiá-lo até o fundo do coração, porque era isso que ela achava que ele merecia, então o que diabos ela deveria fazer agora, com o coração tão marcado?

“Tenho certeza que você já percebeu isso, mas seu marido, Erna, é um idiota, que queria acreditar que tudo poderia ser consertado com dinheiro e presentes. Até agora.”

Erna o observou e involuntariamente apertou os lábios. Ela agarrou o tecido de sua saia e ficou firme no campo de neve, os bonecos de neve parados como sentinelas silenciosas. Ela estava determinada a não ser afetada pelo amor tóxico desse homem novamente.

“Eu estava ocupado comprando aqueles presentes frustrantes, então nem pude me despedir dela quando ela nos deixou.”

A luz solar invernal lançou um brilho pálido em seu rosto tranquilo. Bjorn diminuiu suas respirações rápidas e olhou para o boneco de neve brilhante e branco.

O boneco de neve em sua mão, ainda, se transformou em uma menina. Com longos cabelos castanhos e olhos azuis brilhantes. As fitas em seu cabelo flutuando como asas de borboleta quando ela pulava em seu campo de neve. E quando ela o olhou, a criança exclamou animada: “Papai!”, acenando com sua mãozinha.

A criança tinha o mesmo sorriso amoroso de sua mãe e Bjorn sabia que se ele abraçasse a criança, ele seria preenchido com o cheiro de biscoitos quentes.

Bjorn levantou a mão livre e enxugou as lágrimas do rosto de Erna, depois acariciou suavemente sua bochecha.

“Mas eu nunca a considerei como nada. Ela foi minha primeira filha e nosso primeiro bebê precioso. Todas essas palavras e desculpas podem ser tarde demais, mas ainda são sinceras.”

Era hora de ambos acordarem do sonho, de escapar do pesadelo que haviam criado juntos.

“Então, Erna… quando os bonecos de neve derreterem, vamos deixar nossa filha ir com eles, vamos deixá-la finalmente descansar. Assim, como seu desejo, ela poderá ir para um lugar melhor.”

Bjorn olhou para Erna com um olhar suave como a luz do sol da primavera.

“Desta vez, eu estarei lá com você, para ajudá-la a se despedir.”

Enquanto ele sorria, os gritos de Erna irromperam no campo de neve silencioso.

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