Volume 2 - Capítulo 144
O Príncipe Problemático
O Príncipe tinha jogado a luva [1], era a única explicação para ele ter saído na neve e começado a rolar uma bola.
O homem, com títulos tão pomposos e importantes — Primeiro Príncipe de Lechen, Grão-Duque e um, o Príncipe Herdeiro —, nada disso importava agora enquanto Lisa e Erna assistiam boquiabertas a ele começar a construir um boneco de neve.
Seu ajudante parecia igualmente perplexo, circulando o Príncipe, oferecendo ajuda o máximo que podia, embora não fizesse ideia do que estava acontecendo e parecesse como se o céu e a terra tivessem trocado de lugar.
“Ei, Alteza”, Lisa disse para Erna, ela entendeu o que estava acontecendo.
Erna, que não parava de observar o Príncipe com uma expressão cética, finalmente voltou sua atenção para a construção do boneco de neve. Lisa sentiu alívio enquanto elas continuavam a construir. Erna, hesitantemente e com muito cuidado, colocou flores no boneco de neve, enquanto Lisa amarrava uma fita em seu pescoço.
“Pronto, este boneco de neve é para você, Alteza”, disse Lisa.
O boneco de neve bem-feito era tão bonito quanto Erna. Erna olhou para o boneco de neve com ternura e bateu as mãos. O riso dela era tão cristalino quanto o céu azul sem nuvens.
O som fez Bjorn parar o que estava fazendo e ele se virou para olhar para Erna. A pele pálida e os olhos escuros ainda eram motivo de preocupação, mas vê-la sorrir lhe trouxe algum alívio.
Ela tinha chorado até o esgotamento na noite passada, até não haver mais lágrimas para derramar. Ele a tinha abraçado naquele momento, oferecido o conforto que pôde, mas assim que ela parou de chorar, ela o afastou com firmeza e se distanciou mais uma vez.
“Alteza, está…” o ajudante gaguejou.
Bjorn estava ocupado com sua própria bola de neve. Era do tamanho apropriado para a parte inferior de um boneco de neve, mas faltava alguma coisa, a bola de neve não atendia aos rigorosos critérios do Príncipe.
“Precisamos nos esforçar mais”, disse Bjorn, gesticulando para o campo imaculado coberto de neve diante deles. “Você não acha?”
Bjorn continuou rolando a bola de neve gigante, seguido de perto pelo ajudante, que murmurava o tempo todo. Seus pios se misturavam aos dos pássaros nas árvores.
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Enorme.
Quando Bjorn terminou de rolar a bola de neve para o boneco, ele era enorme. Realmente enorme.
Erna observava de perto do seu boneco de neve enquanto o Príncipe não dava sinais de parar, até que a bola atingiu proporções ridículas. Se comparado a uma casa, o boneco de neve dela, ao lado da criação dele, não passava da altura da chaminé.
Quando ele terminou de construir seu boneco de neve, ele eclipsou a tentativa de Erna e Lisa. Era difícil acreditar que Bjorn realmente conseguiu fazer um boneco de neve tão grande, com nada além de seu ajudante para ajudá-lo. Doía admitir, mas o Príncipe era realmente bom em fazer bonecos de neve.
“Acho que ficaria perfeito se tivesse meu brasão”, disse Bjorn, recuando e admirando sua obra.
Bjorn usou as mãos para trabalhar na neve da barriga do boneco de neve. Esculpindo com cuidado e precisão o brasão real o melhor que pôde. Apesar de ser apenas um boneco de neve, ele se sentiu compelido a terminar o que havia começado com perfeição absoluta.
Enquanto isso, o ajudante tinha corrido para dentro da casa e quando voltou, Bjorn estava admirando sua obra, e o ajudante estendeu um charuto vitorioso para ele.
Por que diabos ele trouxe aquilo para cá?, pensou Bjorn.
Enquanto considerava o futuro do ajudante, ele ouviu um riso suave e seus olhos encontraram os de Erna. Embora houvesse uma rigidez em seu olhar quando se entreolharam, seus lábios se curvaram em um sorriso, em vez de uma carranca, e Bjorn retribuiu o sorriso.
Ele pegou o charuto do ajudante e o colocou na boca do boneco de neve, agora finalizado com o brasão dos Dniester.
“Este sou eu e aquele é você”, disse Bjorn, apontando para cada boneco de neve. Erna examinou o boneco de neve com o charuto e o outro com todas as flores.
“Por que você fez ele tão grande?”, perguntou Erna.
“Porque eu sou grande.”
“Acho que seria assustador à noite.”
“Se você tiver medo, eu posso te confortar.”
“Não.” Erna retrucou com uma expressão séria no rosto, as bochechas coradas e linda.
Bjorn olhou para sua adorável esposa, os olhos semicerrados contra a luz brilhante do sol refletindo na neve. Ao se lembrar das coisas absurdas que havia feito ontem, só para ver aquele rosto, ele explodiu em risos.
Quando chegou ao seu destino final e planejava ficar lá para a noite, não parecia haver razão para ir a Buford se o clima impossibilitasse a viagem.
No entanto, quando a buzina do trem começou a ecoar, uma emoção inexplicável surgiu nele. Era um impulso irracional que o empurrava a voltar. Bjorn se virou e rapidamente atravessou a plataforma, embarcando no trem em movimento, contrariando o comportamento esperado de um príncipe de Lechen.
Naquele momento, sua decisão foi motivada unicamente por sua devoção inabalável a Erna. Bjorn Dniester, afinal, era simplesmente um homem devoto àquela mulher.
Tudo em Erna estava em constante mudança, o que dificultava sua previsão. Isso o deixava constantemente confuso, mas uma coisa estava clara: ele era uma deliciosa bagunça.
A Sra. Fitz o aconselhara a ir a Buford e reconquistar o que desejava, como um Dniester, mas quando se tratava de Erna, parecia mais um jogo sem regras e ele sabia que poderia ser derrotado a qualquer momento.
Ele amava a emoção disso, jogar um jogo onde não conseguia dizer qual era a mão vencedora, ele não queria parar. Ele jogava de bom grado porque a vitória não era mais sua principal preocupação.
Soltando um suspiro de resignação, Bjorn olhou para o céu. Erna havia revelado seu coração e agora era a vez dele. Era avassalador e assustador, mas ele não queria mais evitá-lo.
Bjorn abaixou-se e pegou um punhado de neve, formando outra bola.
“O que você está fazendo agora?”, perguntou Erna.
“Bebê Dniester”, disse Bjorn após um momento de consideração, e voltou a fazer o pequeno boneco de neve. “Nosso filho.” Ele disse.
Erna ficou sem palavras e ruminou sua curta resposta várias vezes, sem entender o que ele estava fazendo ou porquê.
Por quê? Por que agora?
Erna piscou e lentamente se aproximou de Bjorn, que estava absorto em fazer o pequeno boneco de neve. Enquanto Lisa e o ajudante os observavam, decidiram se retirar silenciosamente, de modo que apenas Erna e Bjorn permanecessem na neve juntos.
“Por que você é assim?”, disse Erna, “por que você está fazendo isso por uma criança pela qual você não tinha interesse?”
Erna podia sentir o veneno da raiva em suas palavras e sentiu uma onda de emoção. Ela havia aberto seu coração para Bjorn, mas agora estava se arrependendo. Ela sentia uma mistura de vergonha com a raiva, como se ele tivesse invadido seus sentimentos mais íntimos e revirado tudo.
“Você está mesmo me compadecendo por minha tolice? Do contrário…”
“A notícia da nossa gravidez me alegrou também”, disse Bjorn, enquanto completava o corpo. “Como eu não poderia, Erna? Era nosso filho.”
Erna olhou para ele com espanto, sem dizer nada, mas com a boca se movendo e tremendo.
“Eu pensei que isso a protegeria do mal causado por seu pai e ninguém ousaria afastar minha esposa, a mãe do meu filho. Mesmo do ventre, a criança cumpriu seu papel. Ela possui a bravura de um Dniester.”
Bjorn sorriu e suspirou, e mais uma vez abaixou-se para construir outro boneco de neve. Apesar de suas mãos estarem ficando vermelhas de frio, ele mal parecia notar seus dedos congelados.
“Eu admito que não priorizei a criança tanto quanto deveria, mas você sempre foi o meu primeiro pensamento, então eu me concentrei no que eu precisava fazer para te proteger. Isso me consumiu tanto que tudo o mais, mesmo que seja meu filho, eu o colocarei em segundo lugar.”
Enquanto a conversa silenciosa continuava, um boneco de neve de bebê foi concluído. Bjorn vasculhou a cesta que Lisa havia trazido, procurando por uma flor adequada. Ele encontrou um delicado floco-de-neve. A mesma flor que florescia em abundância nas florestas quando eles visitaram no ano passado.
A imagem de Erna naquele lindo dia de primavera, parada entre as pequenas flores, veio à mente de Bjorn. Seu filho, concebido naquele dia maravilhoso, teria se transformado em uma dama encantadora, muito parecida com sua mãe, se tivesse nascido com segurança neste mundo.
“Nossa filha teria sido tão adorável quanto você.”
[1] - Expressão idiomática que significa desafiar alguém, propor uma disputa. No contexto, o Príncipe está agindo de forma inesperada e aparentemente sem sentido (construindo um boneco de neve), como se estivesse lançando um desafio implícito à expectativa de comportamento formal e sério.