O Príncipe Problemático

Volume 1 - Capítulo 66

O Príncipe Problemático

O Príncipe era um contumaz. Ele se fazia de marido atencioso quando queria, mas na maioria das vezes agia como se tivesse completamente esquecido que tinha uma esposa, exatamente como hoje.

“O Príncipe é um marido tão ótimo”, disse Lisa com sarcasmo. Ela havia se acostumado tanto a dizer isso que nem percebia que continuava repetindo. Achava que não existia homem vivo que desfrutasse da mesma liberdade que o Príncipe Bjorn.

“Hein? O que você disse?”

Erna estava ocupada examinando folhetos turísticos da cidade em que estavam. Ela levantou os olhos brevemente para dar um sorriso a Lisa. Ela não parecia infeliz, como uma Grã-Duquesa que tinha que curtir sua lua de mel com a empregada, porque era exatamente isso que ela estava fazendo naquele momento.

“Nada”, disse Lisa olhando para seus pés.

Quando o chá que elas pediram chegou, Erna colocou o folheto de lado. O salão de chá do hotel era famoso por sua porcelana requintada e confeitaria colorida, e foi apresentado exatamente como mostrado no folheto.

Ela havia planejado tomar chá com Bjorn naquela manhã, mas o jogo de cartas da noite anterior se estendeu até altas horas da madrugada e quando o Grão-Duque voltou para seu quarto, estava bêbado feito um gambá e Erna estava prestes a levantar para se arrumar para o café da manhã.

Os convidados que os visitaram eram todos membros importantes da Família Real e amigos de longa data de Bjorn. Eles certamente fizeram a visita com dignidade, mas essa intenção desapareceu rapidamente após o jantar, quando o vinho do Porto foi servido junto com um baralho de cartas.

“Meu Deus, que coisa linda, como posso comer isso?” disse Lisa. Ela deveria se sentir triste por Erna ter que tomar chá com sua empregada, em vez do marido, mas os doces fizeram Lisa esquecer toda a sua irritação com o Grão-Duque.

“Coma à vontade”, disse Erna.

Lisa hesitou, alcançando uma fatia de limão bem colorida. Algo nas palavras de Erna soou ameaçador e Lisa não tinha certeza se a Grã-Duquesa queria que Lisa comesse todos os doces, sabendo que ela era uma doce criatura.

O dia todo elas tinham seguido o plano de Erna diligentemente, tecendo uma teia por toda a cidade, parando apenas para apreciar as pequenas coisas que ela avistava em seu passeio meticulosamente planejado. Ela era tão diferente de Bjorn, que era preguiçoso e insensível.

“Está tão bom”, disse Lisa se afundando na cadeira.

A fatia de limão derreteu na boca de Lisa. Nada como aqueles biscoitos secos que ela sempre comia quando ela e Erna iam ao salão de chá da loja de departamento, para deixar flores.

Foi no verão passado que ela estava tomando chá com uma fatia seca, que provavelmente não seria comida. Agora, em apenas duas estações, ela estava no hotel mais luxuoso, comendo a comida mais luxuosa.

“Vossa Alteza, realmente parece que melhoramos de vida.”

Erna soltou uma risada deliciosa. Não era uma risada tão alta que fizesse todos os olhos no salão de chá se voltarem para ela. Os outros visitantes não conseguiam tirar os olhos de Erna porque ela estava tão bonita, não que Erna tivesse percebido.

Eis Lisa Brill, a não tão vaidosa obra-prima, a Grã-Duquesa de Lechen.

Erna continuou oferecendo a Lisa os doces na pequena bandeja e Lisa comeu cada um que foi oferecido. Parecia que Erna estava tentando fortalecer sua vontade e ela comeu bem.

Lisa se perguntou por que Erna queria visitar um lugar conhecido como Museu do Esgoto. Ela supôs que não importava, contanto que a Grã-Duquesa gostasse. Talvez fosse porque elas teriam que navegar para chegar ao museu. Lisa pensou na cara do Príncipe Bjorn quando ele descobrisse que o roteiro da esposa terminava com uma visita aos esgotos.

“Vossa Alteza, por que essas pessoas estão na fila assim?”, perguntou Lisa. Havia uma longa fila de pessoas passando pela vitrine do salão de chá. Ia até o final da rua e contornava o lado do grande edifício.

“Elas vão subir até o topo da cúpula daquela catedral ali”,

disse Erna, apontando. A Catedral ficava diagonalmente em relação ao salão de chá do hotel e no topo havia uma grande cúpula dourada. Lisa conseguia ver pontinhos minúsculos andando por ela.

“A catedral foi construída duzentos anos atrás pela rainha quando ela ia se casar com o príncipe de Lechen. Dizem que, se você subir até o topo com sua pessoa amada quando o sino tocar, esse amor durará para sempre. Quando a catedral foi construída, o casal real de Felia fez exatamente o mesmo.”

Erna falava como se vivesse na cidade há anos. Ela havia estudado Felia assim que soube que iria visitá-la em sua lua de mel. Era também a maior razão pela qual ela estava ansiosa para vir aqui.

“Ah, meu Deus, então você deveria ir com o Príncipe Bjorn, não comigo.”

Erna olhou para a cúpula e acenou com a cabeça. “Sim, irei.” Ela já havia feito planos para isso, quando estavam deitadas na cama no barco para Felia.

Seu aniversário seria em dez dias e ela não queria que seu vigésimo aniversário passasse despercebido depois de se casar com o Príncipe Bjorn. Ele havia concordado em subir na catedral com ela e Erna se sentiu envergonhada depois de se preocupar tanto com a possibilidade de ser rejeitada.

Era difícil demonstrar alegria naquele momento, com Bjorn se movendo tão bruscamente dentro dela. Era uma conversa romântica compartilhada em uma situação tão bárbara. Olhando para trás nos últimos três meses, Bjorn sempre estava mais disposto a fazer as coisas quando solicitado durante suas relações amorosas.

Deveria lembrá-lo de sua promessa?

Depois de pensar um pouco, era uma promessa feita com sinceridade, enquanto eles olhavam nos olhos um do outro. Ele até lhe deu seu sorriso mais doce. Há a chance de ele ter esquecido o aniversário da esposa, no entanto.

“Vamos?”, disse Erna, depois de examinar os pratos limpos à sua frente. Erna deu um sorriso que iluminaria os esgotos de Felia.

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Erna estava chegando. O som de seus passos sozinho teria sido um sussurro suave, mas ela veio com sua empregada. O ritmo apressado chegou até a porta.

Houve uma batida suave ao mesmo tempo em que a porta se abriu. Ela era uma dama tão estranha e teimosa, que entraria sem permissão e demonstraria maneiras desnecessárias ao fazê-lo.

“Bjorn, espero não estar te incomodando.”

Erna o viu sentado no sofá, em frente à lareira, lendo uma revista. Ele a dobrou e olhou para ela. Ela estava com um vestido de veludo verde, com fitas e babados. Ela parecia mais uma caixa de presente hoje.

“Seus convidados foram embora por conta própria?” Erna olhou em volta do quarto lentamente, fazendo a pergunta incisiva com um sorriso suave.

“Bom, talvez.”

“Que alívio, achei que eles poderiam ter saído de quatro”, disse ela sarcasticamente.

Bjorn riu enquanto jogava a revista na mesa e movia a perna do sofá. Erna rapidamente agarrou o lugar vago e sentou-se ao lado de Bjorn.

“Ah, Bjorn, eu fiz um passeio de barco hoje, pelo museu do esgoto.”

“O quê?” Bjorn não podia acreditar no que acabara de ouvir.

“O museu do esgoto, você não sabia? Eu fui lá esta tarde, foi incrível. Você sabia que existe uma enorme rede de túneis grandes, longos e complicados bem debaixo dos nossos pés? Era exatamente como aquele romance que li, sobre o protagonista escapando pelos túneis.”

Enquanto Bjorn se maravilhava com o fato de alguém ter achado uma boa ideia fazer um museu para tal coisa, Erna continuou a recitar todos os mistérios que havia aprendido em sua viagem.

“Fiz um passeio de barco e o guia me ensinou a encontrar coisas que caíram nos ralos.” Ela parecia particularmente orgulhosa disso.

Bjorn estava grato que o filho predileto de Felia o tivesse emboscado na noite passada. Era muito melhor lidar com os cachorros bêbados de Felia do que com um passeio de barco por um esgoto.

“E então você voltou para cá, dos esgotos?” Bjorn se afastou um pouco no sofá, abrindo o espaço entre eles. Sua caixinha de presente perfeita era uma aventureira do esgoto. Erna o viu se afastar e franziu o nariz.

“O que você está fazendo? Você acha que eu fui nadar nos esgotos ou algo assim? É isso que você pensa, você, que quebrou sua promessa e foi beber e jogar cartas?”

Erna se moveu ao longo do sofá atrás de Bjorn, fechando o espaço que ele acabara de criar. Cada vez que ele se movia, Erna também o fazia, até que ela estava praticamente sentada em seu colo. Bjorn riu enquanto se deixava cair da ponta do sofá, envolvendo os braços na cintura de Erna e a puxando com ele. Ela ainda cheirava a flores doces.

“Seu chapéu parece triste”, disse Bjorn, tirando seu chapéu pesado e jogando-o na mesa. “Acho que ele não era para os esgotos.”

Ele tirou a capa dos ombros dela e começou a enrolar o vestido dela. Erna deitou-se calmamente em seu corpo e ofegou ao sentir as mãos dele em sua liga.

“Você não pode apenas me olhar por um segundo?”, disse Erna, agarrando o pulso dele, “A Lisa trabalhou muito neste vestido.”

“Mas você é mais bonita nua”, Bjorn desenrolou a liga com muito cuidado. Erna não apreciou muito o elogio.

“Meu Deus, Bjorn, você diz coisas tão ofensivas, como você se sentiria se eu dissesse isso para você?” Erna o olhou furiosa.

Erna se arrependeu de suas palavras quando Bjorn ficou seminu em um instante. Ele estava sorrindo para ela, como se essa demonstração fosse resposta suficiente.

“Não me diga”, Erna apressadamente colocou a mão sobre os lábios levemente entreabertos do marido. “Não, não responda.”

Bjorn ficou quieto como ela esperava, mas seu silêncio era muito mais sujo do que a resposta que ela tentara bloquear.

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