The Perfect Run

Capítulo 56

The Perfect Run

Por um longo momento, Ryan não disse uma única palavra.

Ele havia colocado sua máscara de lado na mesa, perto do tabuleiro de xadrez, e continuava olhando para sua xícara de café fumegante. O mensageiro podia se perder na escuridão amarga da bebida suave e deliciosa.

Qualquer coisa para aliviar a tensão na sala.

“Sua xícara não está envenenada,” disse Livia antes de limpar a garganta. Ela usava um suéter preto de gola alta, elegante, mas casual. “Se eu quisesse que você estivesse morto, você já estaria.”

“Veneno não funcionaria de qualquer forma.” Ryan deu de ombros, antes de pegar os biscoitos e mergulhá-los no café. “Mas ainda há dois assassinos bem do lado de fora da porta, e as pessoas chamam este lugar de Deathland Motel. Agora que penso nisso, parece um pouco com um parque de diversões de terror…”

“É para a minha segurança.” Livia colocou as mãos ao redor da xícara de café, para sentir melhor o calor em seus dedos. “Pelo que posso perceber, meu eu anterior parece ter perecido abruptamente.”

“Não fui eu,” protestou Ryan.

“Como posso ter certeza?” Ela perguntou com uma expressão de descontentamento no rosto. “Sei que você mentiu sobre sua habilidade para o meu eu antigo. Você disse a ela que poderia saltar entre realidades alternativas, quando na verdade você podia voltar no tempo.”

“Era verdade de forma metafórica,” Ryan respondeu sem emoção antes de comer o biscoito. Era bem doce, mas não tão bom.

“O que é outra maneira de dizer que você mentiu,” Livia retrucou, impassível. “Eu teria trazido o Crypto para este encontro se pudesse, mas ele teve um acidente relacionado ao hóquei. Presumo que você esteja por trás disso?”

“Eu o avisei!” Ryan protestou. “Eu avisei o Luigi que se ele continuasse estragando minhas jogadas, as coisas não iriam bem entre nós!”

O mensageiro fez questão de mirar o contador de verdades em cada loop, mesmo naqueles em que não se juntou aos Augusti. Se é que havia algo, Ryan considerava isso uma defesa preventiva.

“O que confirma minhas preocupações,” disse Livia com uma expressão de descontentamento, olhando em seus olhos. “Você não quer que seu segredo seja revelado e usará violência para encobri-lo, se necessário.”

“Fale por você mesma, senhorita Duas Poderes.”

Ela se encolheu. “Eu… eu não vejo do que você está falando.”

“É isso mesmo,” Ryan disse, realmente tentado a deixar a mesa de qualquer forma, consequências que se danassem. “Olha, você pode me dizer o que exatamente quer? Ou então vou sair pela porta.”

“Se você tentar sair deste quarto agora, não terei escolha a não ser caçar você,” declarou Livia, com os olhos cheios de determinação. “Seu poder é grande demais para ser ignorado, e não tenho certeza de que você não será uma ameaça para minha família no futuro.”

O mensageiro lançou um olhar fulminante para ela, mas ela se manteve firme.

“Ryan, a única razão pela qual ainda não fui ao meu pai com minhas suspeitas, é porque meu eu anterior parecia apreciar você,” ela o avisou. “Eu até cancelei a Vulcan quando ela quis rastreá-lo. Não desperdice esta oportunidade.”

Ryan tentou descobrir como lidar com isso. Ela não se lembrava dos loops, mas parecia capaz de transferir informações de um para o outro, o que a tornava incrivelmente perigosa.

Ele poderia negar sua vantagem cancelando seu poder? Ele sempre poderia tentar fazer o Cancel se voltar contra seu empregador, mas isso parecia um tanto exagerado e difícil. Se a filha de Augustus realmente pudesse interagir com universos alternativos além de seu alcance, então nem mesmo a morte resolveria o problema permanentemente. Ela voltaria a caçá-lo no próximo ciclo, e isso sem considerar quaisquer contingências que ela tivesse colocado em prática.

Isso não era o pior cenário, mas estava bem perto.

“Vou perguntar novamente então,” Ryan disse. Ele não queria soar frustrado, mas toda a situação o deixava extremamente inquieto. “O que você quer?”

Livia respirou fundo, reunindo suas forças. “Eu quero a verdade.”

“A verdade?” Ryan repetiu a palavra, enquanto o peso de inúmeros anos caía sobre seus ombros. “A verdade me causou tanto sofrimento, que acho que desisti dela. Alguns não acreditaram em mim. Alguns acreditaram e enlouqueceram. Alguns chegaram ao ponto de tentar me destruir, porque não queriam esquecer. E alguns…”

Os pensamentos do mensageiro se voltaram para Jasmine.

“Alguns acreditaram em mim e tentaram ajudar. E, ainda assim, eu continuei morrendo, e eles esqueceram. De novo, e de novo, e de novo.” Ryan soltou um suspiro pesado. “Esses são os piores, porque eu nunca me acostumo com eles.”

O olhar de Livia traiu um toque de compaixão, mas ela recuperou sua postura fria. “Acho que entendo,” disse ela. “Não posso dizer que consigo compreender totalmente o que você passou, mas acho que vejo seu ponto.”

“Não, você não pode. E agradeça por isso.” Ryan pegou sua própria xícara de café. “Você não contou ao seu pai, mas contou a mais alguém?”

“Por quê?” Seu tom se tornou defensivo. “Você quer me silenciar?”

“Não.” Ryan não poderia, mesmo que quisesse. “Mas mais da metade dos seus ‘Olympians’ são idiotas assassinos. Não quero que nenhum deles saiba meu verdadeiro poder.”

“Se você não planeja agir contra eles, então não deve ter nada a temer.”

“Ah, é mesmo?” Ryan respondeu de forma seca. “Seu pai rastreia pessoalmente todos que remotamente suspeita serem uma ameaça para ele. O que você acha que o Lightning Butt fará se souber que posso viajar no tempo?”

“Eu…” Seu argumento parecia ter atingido o alvo. “Eu poderia convencê-lo a mudar de ideia.”

“Não acredito em você,” Ryan respondeu secamente. “E não vamos falar sobre Bliss.”

“Isso não tem nada a ver com nossa conversa,” argumentou Livia, seu corpo tenso. “Não tente mudar de assunto.”

“Tem tudo a ver,” insistiu Ryan, tomando um gole de seu café. “Bliss causa esterilidade em humanos sem poderes. Eu costumava pensar que os Genomas eram poupados desse efeito colateral desagradável graças ao seu metabolismo aprimorado, mas não mais. Narcinia pode criar vida como desejar, então não há como ela não saber, e ela é boa demais para não ter corrigido esse problema. Portanto, não é um bug; é um recurso.”

Os dedos de Livia tremiam ao redor da xícara, suas feições faciais se contraíram.

“Por que um cartel faria a maioria de seus clientes estéreis? Não fazia sentido para mim, até que vi seu pai e sua equipe. Pessoas como Mars desprezam humanos normais, como gado.” Ryan bufou. “Seu pai quer matar normies. Bliss não é um produto, é uma arma.”

“Você acha que eu queria isso?!”

A explosão repentina fez Ryan recuar na cadeira, enquanto a raiva rompía a máscara de Livia.

“Você não acha que já tentei mudar isso?!” Agora era a vez dela de rosnar para ele, a raiva reprimida subindo à superfície. “Você não acha que tentei fechar aquele laboratório da morte mil vezes? Você acha que quero que as pessoas associem o nome da minha família a uma droga que mata milhares a cada ano? Você acha que quero isso?”

Ryan não disse nada, atônito, enquanto Livia colocava as mãos no rosto.

Ela… ela parecia estar lutando contra as lágrimas.

“Meu pai não cederá,” disse ela, sua voz fraca. “Ele me ouvirá em quase tudo, mas Bliss… é seu projeto favorito. Seu legado. Narcinia… aquela garota poderia melhorar tanto o mundo. Ela é um milagre. Mas meu pai… meu pai não quer salvar ninguém. Ele prefere ser o rei de um cemitério.”

Livia não parecia mais a filha régia e confiante de Augustus. A máscara havia caído, e por baixo, Ryan só via uma jovem mulher com pressão demais e expectativas indesejadas jogadas sobre seus ombros.

Naquele momento, ela parecia tão vulnerável que a raiva de Ryan desapareceu. “Livia, você não precisa fazer isso, se não quiser,” ele disse, segurando a mão dela na sua. Seus dedos estavam tão frios ao toque. “Mesmo que sejam sua família. Você tem o direito de ir embora.”

“Eu tenho que ir,” ela respondeu, afastando sua mão e enxugando as lágrimas. “Alguém pior tomará conta da organização, caso contrário.”

Livia demorou alguns segundos para recuperar a compostura, respirando fundo enquanto Ryan observava.

“Eu só quero proteger minha família, Ryan,” disse ela. “Se… o que quer que eles sejam, ainda são minha família. Meu pai… meu pai é o que é, mas ele ainda é meu pai no final das contas. Você entende?”

Essas palavras fizeram Ryan estremecer, pois o levaram de volta aos dias mais sombrios de sua infância.

“Não quero que eles morram,” Livia disse com um suspiro. “É tudo o que peço. Quero protegê-los. De Dynamis, do Meta. De você, se necessário.”

“Você não será capaz de proteger eles das consequências de suas ações.” A ameaça do Carnaval já pairava sobre o império de Augustus.

“Eu sei, mas ainda preciso tentar protegê-los. Se…” Ela lutou para encontrar suas palavras, as sobrancelhas se apertando em frustração reprimida. “Eu só quero saber que você não os ameaçará. Que não está aqui para nos matar. Se você puder garantir isso, então… então eu guardarei seus segredos e deixarei você em paz. É só isso.”

Ryan abriu a boca, a fechou e então decidiu tranquilizá-la. “Não quero matar você ou sua família, Livia.”

Agora que o mensageiro pensava sobre isso, não era isso que ele sempre quis? Alguém capaz de se lembrar dele? Seu primeiro instinto era a paranoia, mas ela não tinha sido nada além de útil no ciclo anterior. O Lightning Dad era um colossal idiota, mas sua filha parecia… legal, por falta de um termo melhor?

“A questão é que eu…” Ryan disse, tentando encontrar suas palavras. “Sempre esperei que algo assim acontecesse. Que alguém como você aparecesse e se lembrasse de mim. Mas agora que finalmente aconteceu, não tenho ideia de como lidar com isso. É…”

“Novo?” ela sugeriu com um suspiro.

“Sim,” ele disse, acenando com a cabeça. “E não de uma maneira engraçada. Eu me acostumei a controlar tudo em um loop, e agora você está ameaçando tirar todo meu progresso.”

“Eu entendo,” Livia respondeu, com um sorriso forçado. “Eu me sinto exatamente assim em relação a você. Nunca conheci alguém imune ao meu poder antes. É… um pouco assustador e perturbador. Eu não sei o que esperar.”

Ambos estavam com medo um do outro.

O dilema do ouriço atingiu novamente!

Eventualmente, após um longo minuto de reflexão, Ryan tomou uma decisão. Era um movimento muito arriscado, mas ele havia apostado suas fichas na mesa há muito tempo. Ele poderia muito bem ver o que acontece.

“Certo, se você quer a verdade completa sobre meu poder, então eu a darei.” Ele seria tão honesto com ela quanto fora com Len e Jasmine. “Mas a confiança é uma via de mão dupla.”

Ela considerou sua proposta por um tempo, seu rosto pensativo. “O que você quer em troca?”

“Eu também quero a verdade.”

“Como posso saber que você não usará nenhuma informação que eu lhe der contra mim na sua próxima tentativa?”

“Que garantia eu tenho de que você não enviará seu exército de Genomas atrás de mim?” Ryan deu de ombros. “A questão é que, se nenhum de nós estiver disposto a correr riscos, então só há um jeito de isso acabar entre nós. E…”

Ele olhou para essa mulher, que tanto lhe lembrava outra pessoa.

“E eu não quero ir para lá.”

A filha de Augustus nada disse, refletindo sobre isso enquanto tomava um gole de seu café. Eventualmente, ela tomou uma decisão.

“Tudo bem,” Livia declarou, colocando a xícara de volta na mesa. “Eu aceito seus termos.”

“Primeira pergunta então,” Ryan perguntou, olhando para as paredes. “Por que este motel?”

Isso a fez rir um pouco, aliviando um pouco a tensão na sala. “É a primeira coisa que você deseja saber?”

“É aconchegante, mas não sou fã da pintura das paredes. Você deveria experimentar um roxo, combina bem com tudo.”

“Felix e eu o usamos como nosso ‘refúgio’, de certa forma,” Livia admitiu, olhando para o tabuleiro de xadrez. “Era um refúgio privado que usávamos quando queríamos escapar de nossas famílias. É discreto, e os poucos que sabem sobre isso mantêm a boca fechada. Desde que você se juntou ao Il Migliore, achei que seria um bom terreno neutro.”

Ryan fez um som de desprezo. “Vou dar uma bronca no gatinho pela falta de gosto então.”

“Como ele está?” ela perguntou, seu tom suave como se tivesse medo da resposta. “Felix?”

“Você não deveria saber com seu poder?” Ryan perguntou, antes de responder com sinceridade. “Ele está bem, se decepcionado. Il Migliore não é tudo isso que falam, mas ele vai se recuperar. Não acho que ele voltará, porém.”

“Não, ele não voltará,” Livia concordou com um suspiro. “Seus pais acreditam que ele ‘vai amadurecer’ e voltar ao redil, mas eu sei melhor. Ele sempre foi teimoso demais para o próprio bem.”

Após um breve silêncio, Ryan decidiu abordar o elefante na sala. “Como você se lembrou?”

“Você primeiro, Ryan,” ela pediu, olhando em seus olhos. “Você primeiro.”

“Você quer a versão curta ou a longa?”

“A longa,” disse ela firmemente.

Ryan considerou fortemente mentir para ela de qualquer forma, mas decidiu contra isso. Estranho como fosse, o mensageiro cumpria suas promessas, mesmo que fosse o único a se lembrar delas.

Então ele contou a ela, sem omissões.

Livia ouviu suas explicações com uma expressão inexpressiva, até que ele chegou ao final de sua história. Ele teria dado tudo para saber o que ela pensava, mas seu rosto de poker era quase tão bom quanto o de Ryan.

“Entendi,” foi tudo o que ela disse, assim que ele terminou sua narrativa.

“Se você quiser me matar, agora é a hora,” Ryan respondeu. “Ou pelo menos, você pode tentar.”

“Eu…”

Livia parou, e o mensageiro teve certeza de que ela considerou mentir para ele também.

“Você está certo, Ryan. Eu tenho dois poderes. Não apenas um.”

Mas no final, ela era uma mulher honrada.

“Você bebeu dois Elixires,” Ryan disse. “Como seu pai.”

“Fui eu quem fez isso primeiro,” ela admitiu. “Bebi um Elixir Azul, que me concedeu a habilidade de ver linhas do tempo paralelas. E com esse poder, percebi que tanto meu pai quanto eu poderíamos possuir até dois poderes sem efeitos colaterais em realidades alternativas.”

“Uma peculiaridade genética?” Ryan perguntou, a princesa acenando com a cabeça em confirmação. “E quanto ao seu tio e tia?”

“Eles não herdaram os genes necessários. Nas realidades em que beberam um segundo Elixir, sempre ficaram psicóticos. E mesmo no meu caso, um terceiro Elixir teria me transformado em um monstro.”

Livia limpou a garganta e ajeitou o cabelo, como uma professora se preparando para uma aula. “De qualquer forma, meu poder me permite ver e ouvir através dos sentidos de eus alternativos. Um número limitado.”

“Quão limitado?” Ryan perguntou, enquanto roubava um segundo biscoito.

“Seis,” a princesa disse, com os olhos semicerrados. “Se você quiser uma metáfora, posso assistir até seis telas de plasma ao mesmo tempo. Posso mudar os canais, mas não posso desligá-los. Meu poder está sempre ativo.”

“E você percebeu que eu poderia voltar no tempo falando com esses eus alternativos?”

“Sim e não,” Livia admitiu. “A questão é que eu não percebo esses outros Livia diretamente. Eu uso um hub. É difícil para eu descrever, mas eu constantemente me vejo em dois lugares. Aquele onde estou agora e um lugar azul onde posso selecionar os canais. Eu tenho seis telas, mas as assisto em uma sala.”

Ryan imediatamente entendeu. “E você pode interagir com essa ‘sala azul’?”

“Sim, posso gravar vozes e anotações, como um arquivo,” ela acenou com um sorriso, feliz que ele compreendesse. “Na verdade, eu percebi notas que não me lembrava de ter escrito. Presumi que meus eus alternativos também tinham acesso a esse lugar e registravam informações… até que conheci você.”

“Você manteve notas sobre mim,” Ryan adivinhou. “Notas com datas, sobre como conheceu um fora da lei charmoso que seu poder não podia perceber.”

“Não chamaria você de charmoso,” a princesa brincou com ele. Agora que ambos se abriram, a tensão entre eles havia diminuído lentamente. “Mas sim. Se tivesse sido registrado por um eu alternativo, então ela não deveria ser capaz de perceber você. A forma como nos conhecemos também era diferente, e eu tive a intuição de que você já me conhecia.”

“Mas como você percebeu que eu estava viajando no tempo?”

“Não sei nada sobre videogames,” admitiu a filha de Augustus com um sorriso tímido. “Então eu pesquisei o que seu nome significava. Conectei os pontos rapidamente, e fez sentido.”

Ryan piscou para Livia, tentando ver se ela estava falando sério. Não podia ser… “Você descobriu, e nem é uma gamer? Não há palavras para descrever minha imensa decepção.”

“Estou surpresa que você tenha corrido tal risco com um nome assim,” disse ela. “A menos que fosse outra garrafa jogada ao mar?”

Talvez. Ryan ignorou a pergunta, focando na mecânica do poder dela.

“Elementos me fizeram pensar que todos os verdadeiros Genomas extraem seus poderes de uma dimensão superior, que incorpora a essência de suas cores.” Quanto mais pensava nessa teoria, mais Ryan começou a acreditar nela. “Uma dimensão de energia para o Vermelho. O cruzamento de todo o espaço-tempo para o Violeta…”

“Um universo de pensamentos e informações para o Azul?” Livia adivinhou sua teoria.

“Acho que você é como eu,” Ryan explicou. “Uma parte de você, talvez uma presença psíquica, existe nesse Mundo Azul. Isso permite que você registre informações fora do espaço e do tempo e veja através de realidades alternativas.”

“Mas não minha consciência,” Livia percebeu. “O que é por isso que minhas memórias não se transferem quando você sobrescreve nosso universo. Eu me pergunto por que não percebi a passagem do tempo nessas realidades alternativas. Algumas deveriam ter continuado por anos, se você não as afetasse.”

“Porque não acho que você realmente vê universos paralelos, ou pelo menos não como você os entende,” Ryan respondeu. “Acho que seu poder cria e sustenta esses universos.”

Livia refletiu sobre isso, antes de entender sua teoria. “Você acha que eles não são realmente universos que existem fisicamente, mas sim simulações elaboradas?”

“Possibilidades que colapsam sempre que você para de observá-las. Elas só começam a existir quando você usa seu poder.”

“Mmm, nunca vi as coisas assim,” a princesa admitiu. “Mas isso explicaria por que você não aparece em nenhum deles. Você é o controlador. Aquele que decide se a realidade atual e todos os seus ramos possíveis existem ou não. Seu poder supera o meu.”

“Ambos?” Ryan brincou com ela.

“Podemos verificar,” disse ela com um sorriso arrogante. Ele havia ativado um instinto competitivo dentro dela. “Quero dizer, se você quiser.”

Ryan aceitou o desafio, levantando a mão e movendo os dedos em direção a si mesmo. “Pode vir, princesa.”

Ele sentiu algo nas costas—

O tempo parecia avançar rapidamente, e quando Ryan recuperou a consciência, o peão branco e o cavalo preto no tabuleiro de xadrez haviam se movido. Livia, no entanto, parecia extremamente confusa.

“Isso é tudo que você tem, Violeta?” Ryan provocou-a.

“Isso é muito estranho,” Livia admitiu com uma carranca. “Você pode tentar sua parada de tempo em mim, Ryan? Eu gostaria de verificar algo.”

Ele fez isso, e ela congelou como tudo o mais. Ao contrário de seu pai, ela não pode se mover no tempo parado.

“Acho que senti você ativá-lo,” Livia disse quando o tempo retomou, antes de notar um biscoito em sua mão. “Mas claramente, não sou imune a isso.”

“Bem, seu pai é,” Ryan deu de ombros. “Um de vocês foi o suficiente.”

“Oh, realmente?” Livia piscou algumas vezes seguidas. “Isso… isso explicaria algumas coisas.”

O mensageiro levantou uma sobrancelha. “Como assim?”

“Às vezes, papai parece gaguejar ou parar no meio da frase antes de repetir a si mesmo. Meu tio achou que era a idade chegando, mas ninguém se atreveu a confrontar meu pai sobre isso. Ele é muito sensível a envelhecer, e suponho que não queria que nos preocupássemos.”

“Deve ter sido bem irritante do ponto de vista dele,” Ryan disse com um sorriso ao imaginar a cena.

“Acho que ele estaria dividido entre recrutá-lo por seu poder ou matá-lo por ser uma irritação.” Livia riu, antes de devolver seu biscoito ao restante. Ryan supôs que ela estava sendo cuidadosa com seu peso. “Se ele souber sobre você, pelo menos.”

Ryan prometeu a si mesmo que um dia faria uma pegadinha temporal em Lightning Butt. “Deixe-me adivinhar, você apagou o tempo e pulou por ele?”

“Isso é uma referência a algo?” Livia perguntou, e o olhar de Ryan a deixou desconfortável. “Por que você está me olhando como se eu fosse uma miserável?”

Dói ser uma pessoa culta cercada pela ignorância. Ele teria que fazer a educação dessa mulher um dia.

“Meu tempo aprimorado me disse que o tempo avançou alguns segundos, e tenho certeza de que ambos jogamos uma rodada de xadrez,” disse ele, olhando para o tabuleiro. “Você cria uma anomalia temporal onde o tempo flui para frente, e como nunca experimentei um apagão como esse antes, presumo que isso afete apenas uma pequena área.”

“Muito bom palpite,” ela concedeu. “Sim, eu crio uma anomalia temporal localizada onde o tempo se comporta de forma estranha. Os eventos prosseguem como deveriam, se eu não tivesse usado meu poder, mas todos, exceto eu, estão em transe seguindo um script. Nessa anomalia, sou a única capaz de ajustar minhas ações e aplicar força aos objetos, tornando-me invulnerável; e quando o tempo retorna ao normal, apenas eu me lembro das minhas ações.”

Livia cruzou os braços. “Ou pelo menos… é assim que funciona com todos os outros.”

“Mas não comigo,” Ryan disse com um sorriso. “Meu tempo-fu é mais forte que o seu!”

“Posso ver os resultados de suas ações, mas não interagir com eles,” ela admitiu com uma carranca, seu orgulho ferido. “Eu coloquei um peão branco à frente, e o cavalo preto se moveu sozinho. Como se você fosse um fantasma capaz de afetar o mundo físico, mas imune à retaliação. Talvez seja porque você existe parcialmente neste Mundo Roxo.”

Se seus poderes interagissem de forma tão estranha, Ryan não se atreveria a convidar Acid Rain para a mesa. “Então, nessa anomalia temporal, eu sou, o quê, intangível? Invulnerável?” Livia respondeu à sua pergunta com um aceno, e o mensageiro se lembrou da Ilha Ischia. “Acho que você pode ter salvado minha vida uma vez assim.”

Livia deve ter tentado ‘pular’ o tempo em uma tentativa de sobreviver à explosão de Bahamut, mas seu poder provavelmente acabou antes que pudesse encontrar abrigo. Enquanto Ryan já estava na batisfera, e a interferência estranha de seus poderes fez o dispositivo se mover para longe. Ou pelo menos, era seu melhor palpite. Ele precisaria de mais tentativas e erros para descobrir como seus poderes realmente interferiam um com o outro.

A expressão da princesa mudou de curiosa para azeda, seus olhos olhando para o café. “Ryan, por que você se juntou aos Augusti no passado e agora trabalha para nossos inimigos? Que jogo você está jogando?”

“Longa história, mas concordei em destruir a fábrica de Bliss em nome de outra organização,” Ryan disse. “Ou então eles tomariam as rédeas e matariam muitas pessoas.”

Ela fez um som de desprezo. “Entendi.”

“Vejo que você não está contra isso.” Ryan franziu a testa, enquanto sua intuição disparava. “No último ciclo, você insistiu que eu fosse à Ilha Ischia quando estava inspecionando as defesas. Mesmo que não houvesse razão para eu ir lá. Você queria que eu sabotasse aquela fazenda de drogas.”

“Devo ter suspeitado que algo estava errado com você então,” Livia respondeu enquanto desviava o olhar. “Quem pediu que você fizesse isso? Dynamis?”

“Não.”

Ela olhou em seus olhos. “Então quem?”

Ryan hesitou. Lembrou-se de como ela interagiu com Shroud na última vez, e teve a sensação de que sua rivalidade com o Carnaval era pessoal. Se ela soubesse, os Augusti rastreariam Shroud, e o mensageiro não queria que seu aliado translúcido morresse. “Não posso te contar.”

Instantaneamente, sentiu a tensão subindo novamente na sala. “Entendi,” Livia disse com um tom gélido. “Então, como eu morri da última vez?”

“Você realmente quer saber?” Ryan perguntou, e ela acenou com a cabeça de forma decidida. “O Meta te assassinou com um laser orbital.”

A princesa piscou enquanto digeria sua resposta e então franziu a testa. “Você está mentindo.”

“Eu gostaria de estar,” Ryan respondeu, a memória daquela catástrofe azedando seu humor. “Estou trabalhando para evitar isso.”

“É impossível, eu deveria ter visto isso chegando,” Livia protestou.

“Você continuou vendo a si mesma morrendo em realidades alternativas.”

“Então isso só pode significar duas coisas,” ela disse, com os braços cruzados. “Ou o Meta-Gang tem um método para contra-atacar meu poder, ou decidiram me atacar primeiro em cada universo alternativo que observei. Alguns dos meus outros eus deveriam ter sobrevivido, caso contrário.”

O Meta realmente tinha acesso ao bunker de Mechron e à tecnologia dentro dele, mas Ryan considerava a segunda opção mais provável. Conhecendo Big Fat Adam, ele deve ter decidido direcionar seus ataques a qualquer precog capaz de alertar sobre seus planos de destruir Nova Roma primeiro.

Infelizmente, isso fez com que Livia fizesse apenas mais perguntas, e não menos. “Como eles conseguiram um laser orbital em primeiro lugar?”

Ryan pesou os prós e contras de contar a ela sobre o arsenal de Mechron, antes de perceber que o risco era simplesmente grande demais. Augustus havia destruído isso em um ato de fúria vingativa no ciclo anterior, mas neste? No auge de seu poder? Esse deus em potencial provavelmente decidiria reivindicar o bunker para si mesmo. “Não posso te contar.”

“Você não pode me contar?” Livia lançou um olhar fulminante para o mensageiro. “Você preferiria deixar Adam, o Ogro, colocar as mãos em uma arma de destruição em massa do que me contar?”

“Olha, não é que eu não confie em você,” Ryan protestou, “mas você terá que dizer ao seu pai para lidar com isso, e—”

“Meu pai não é perfeito, mas ele não come crianças no jantar.”

“Essa é a barra que você estabelece para a decência humana?” Ryan respondeu de forma ríspida. “Você sabe que ele assassinou os verdadeiros pais de Narcinia, para usá-la como refém contra Leo Hargraves?”

“Os pais dela eram saqueadores, que mereciam o que receberam,” Livia argumentou, cerrando a mandíbula com raiva. “E cuidado com o que diz. Hargraves assassinou minha mãe.”

Oh? Isso explicou algumas coisas. Ryan anotou essa informação para mais tarde, decidido a confrontar o Sr. Veja-Através sobre isso.

“Só estou dizendo que você deveria investigar, porque a fonte parecia bastante confiável.” Apesar de todos os seus defeitos, Ryan havia aprendido a confiar em Shroud ao longo dos últimos ciclos. O desejo do vigilante de fazer o bem era genuíno, embora extremo. “Ele disse que a mãe dela queria ajudar o mundo e que ela tinha o poder para isso.”

“Quem te contou isso?” Livia perguntou, sua expressão de descontentamento se aprofundando. “Você também não vai me contar? Tenho certeza de que é a mesma organização que pediu para você destruir a Ilha Ischia.”

Ryan cruzou os braços, mantendo sua posição. “Não posso te contar.”

“Por quê?” Ela levantou as mãos em incompreensão. “Por que Ryan? Você diz que não quer prejudicar minha família, mas está disposto a trabalhar com pessoas que estão. Então, por que eu deveria confiar em você?”

“Porque eu posso corrigir tudo.”

“E se você estiver errado?” Livia balançou a cabeça. “E se você explodir a Ilha Ischia com Narcinia ainda dentro, e isso grudar? E se o Meta-Gang conseguir te matar permanentemente? Você fala sobre confiança, mas só me conta metade da história!”

“Então, o que acontece se eu perguntar sobre a invulnerabilidade do Lightning Butt?” Ryan respondeu, o tom elevando-se entre eles. “Você vai me contar?”

“Por que você precisaria saber isso, se não pretende ir atrás dele?” ela respondeu com raiva. “Não vou ficar parada enquanto um Psicopata trama meu assassinato e quem sabe de quantos outros, Ryan! Então, por que eu deveria confiar em você para ajudar enquanto você está decidido a me manter no escuro?”

“Porque eu não quero que ninguém morra!” Ryan rosnou enquanto levantava um dedo para a princesa, no limite de seus nervos. “Você incluída!”

Desta vez, suas palavras a silenciaram.

“Você sabe o que é ser eu?” Ryan perguntou, a frustração que ele vinha reprimindo por décadas subindo à superfície. “Ter o poder de ajudar a todos, sabendo que cada vez que salvo, as coisas grudarão? Que se eu deixar alguém morto quando poderia tê-los protegido, então será minha culpa? Você sabe como seria fácil simplesmente dizer, ‘que se dane, não me importo mais’ e nunca olhar para trás?”

Após essa explosão, os dois caíram em um silêncio embaraçoso e tenso. Eles haviam chegado a um impasse.

“Acho que você deveria ir,” Livia disse, segurando os braços como se estivesse se protegendo. “Está tarde, e as pessoas farão perguntas.”

Sim, eles estavam terminados. Por enquanto.

Sem mais palavras, o mensageiro pegou sua máscara e se dirigiu à porta.

“Ryan.”

Ele congelou, sua mão na maçaneta da porta.

“Eu não me importo com o resto da organização, mas se meu pai, meu tio e minha tia morrerem por causa de seus esquemas, eu destruirei você,” Livia o avisou. “O mesmo vale para Felix, Fortuna e Narcinia.”

“Tudo bem, eu tenho uma lista própria,” Ryan respondeu com o mesmo tom gélido. “Len Sabino, os órfãos sob seus cuidados, minha equipe atual, Mathias Martel, Jamie, Ki-jung, Lanka, Narcinia, Jasmine e meu gato. Se vocês visarem qualquer um deles, eu juro que vocês nunca me verão chegar.”

Livia suspirou. “Não acabou. Eu vou te chamar novamente.”

“Claro,” respondeu o viajante do tempo, enquanto abria a porta e saía. “O que você disser.”

Quando o relógio marcou meia-noite, Ryan dirigiu o Plymouth Fury até o porto.

“Bem, aqui estamos,” disse o viajante do tempo, virando-se para seu parceiro. “Você tem certeza de que não quer ir comigo? Eu sei que você odeia Dynamis, mas eles me prometeram um condomínio com uma vista da cidade inigualável.”

Silêncio. Len não dissera nada desde que deixaram o motel. Talvez sua medicação tivesse acabado e ela achasse o mundo da superfície cansativo.

Ou talvez ela esperasse que o Cancel e os Killer Seven saíssem da floresta para atacá-los. Mas até agora, Livia não havia enviado ninguém.

“Eu sei que você pensa que precisa de uma overdose de antidepressivos para que funcionem, Shortie, mas por favor, siga o tratamento,” Ryan implorou. “É para o seu próprio bem.”

“Riri.” Len olhou em seus olhos, sem se preocupar em esconder sua preocupação. “Por que você contou tanto para ela? Você não pode voltar atrás agora.”

Por que?

Ryan poderia dizer que não tinha escolha. Que com o poder de Livia, era melhor ser sincero e tentar construir um bom relacionamento, em vez de ir para a matança. Poderia dizer que queria que as coisas mudassem, mesmo que isso significasse correr um risco.

Mas isso teria sido uma mentira.

A verdade era que suas razões eram mais profundas do que isso.

Um psicopata invencível tentando empurrar sua filha para uma situação com a qual ela não se sentia confortável e transformando-a em um alvo porque não podiam prejudicá-lo diretamente?

Como Len poderia perguntar-lhe o porquê?

“Porque eu já vi isso antes,” Ryan disse, olhando para o Mar Mediterrâneo. “E não acabou bem da primeira vez.”

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