
Capítulo 399
Reformation of the Deadbeat Noble
História Paralela – 3 O Cepo
“Merda, tô ferrado…” Jack, ex-membro da gangue de bandidos Crepúsculo, pensou enquanto permanecia parado, atordoado. Ele apertava o mapa que Ian havia lhe dado.
Como foi que acabou nessa enrascada?
Ele não conseguia pensar direito. Apenas alguns dias atrás, levava uma vida de luxo no sul do continente, fazendo tudo o que queria. Matava quem atravessasse seu caminho, pegava tudo o que desejava. Pensava que, contanto que mantivesse a cabeça baixa diante do líder Zeke e do vice-capitão Kel, aquela vida duraria para sempre.
“Droga, meu azar é demais. Como fui esbarrar com monstros assim…”
Jack repassava os acontecimentos daquele dia em sua mente. Ian havia permanecido calmo, mesmo diante da aura aterrorizante do capitão, mas a habilidade de Judith, uma das quatro maiores espadachins do continente, era simplesmente apavorante; impossível de descrever com palavras. Como alguém era capaz de invocar uma aura da espada com mais de vinte metros?
Só de pensar em ser alvo de alguém tão monstruoso, suas pernas tremiam. A percepção de que sua vida estava completamente arruinada fazia Jack querer cair no chão e chorar desesperadamente.
— Não… Ao menos ainda estou respirando. — Ele sacudiu a cabeça com força e firmou a expressão.
De algum modo, ele sobreviveu. Desde que seus pais o venderam como escravo de mina na infância, uma maré de azar sempre perseguiu Jack. Apesar de inúmeros acidentes e brigas, de algum jeito ele sempre conseguia se manter vivo; e mais uma vez havia feito a escolha certa. Vencer o medo profundo do capitão e seguir os conselhos de Ian o tornaram o único sobrevivente do Crepúsculo.
Ele ficaria bem. Teria uma vida longa, muito longa. Claro, teria que manter a cabeça no lugar. Mas realmente manter a cabeça no lugar…
— Pra isso, não posso mais fugir agora.
Ele não fazia ideia de onde estava. Parecia a região central do continente, mas por conta de seu total desconhecimento geográfico, não conseguia identificar qual território era apenas olhando ao redor. Tudo o que sabia era que aquele lugar era bem mais sofisticado do que onde costumava viver. Por outro lado, Ian e Judith provavelmente conheciam esse lugar como a palma da mão.
“Em vez de tentar fugir por aí num lugar como esse, é melhor só obedecer e fazer o que mandam”, pensou Jack. “Certo. Parece que minha cabeça tá funcionando melhor que o normal. Tô mandando bem!”
Achando que havia desviado com sucesso de uma morte idiota, Jack deu um tapinha nas próprias costas. Essa atitude positiva era essencial, ele precisava manter isso. Murmurando algo para si mesmo, seguiu o mapa de Ian em direção a um bar chamado Cepo.
Quando chegou, notou que o exterior era estranho, mas inofensivo. Bem, parecia ser um bar familiar e aconchegante por fora, mas aquilo não tirava o fato de ser um lugar que discriminava baseando-se em status social. Claro, isso não importava. O que importava era o que havia dentro.
Respirando fundo, Jack decidiu entrar e descobrir as coisas por si mesmo. Imediatamente deu de cara com dois homens de seu tamanho.
— E quem diabos é você?
— O que está fazendo aqui, otário?
Os dois brutamontes não eram os únicos no bar. Algumas pessoas de uniforme limpavam as mesas, e uma figura que parecia ser o barman arrumava frutas e ervas atrás do balcão. Mas a presença daqueles dois caras enormes fazia Jack se sentir sufocado.
O clima ficou tenso. Jack sentia que a qualquer momento os socos começariam a voar. Eram bem rudes, provocando-o no meio de tudo aquilo. Isso o irritou, e ele respondeu:
— Fechem essa matraca e venham se têm algum problema!
— Quê?
— Seu maluco filho da…
Thwack!
Crash!
— Ugh! Desgraçado…
— Eu mandei você calar a boca! Vai ficar latindo até quando, hein?! — Jack rugiu, após socar o mais claro dos dois no queixo.
Qualquer pensamento de se manter calmo e agir com compostura já havia desaparecido de sua mente. Ele não conseguia evitar. Se fosse do tipo que controlava o temperamento até diante de alvos fáceis, não teria acabado vivendo como um marginal de beco.
Esquecendo completamente o motivo de estar ali, Jack começou a socar feito louco. Os dois homens no bar fizeram o mesmo.
— Morre!
— Filho da puta!
— Ha, sabe com quem você tá falando? Sou membro da Crepúsculo!
— Quem foi o idiota que inventou um nome tão lixo?
— Vai se ferrar!
Num piscar de olhos, os três lançaram o Cepo no mais puro caos. Surpreendentemente, mesmo com a pancadaria entre os brutamontes, os funcionários permaneceram calmos. Apenas balançaram a cabeça algumas vezes e continuaram observando a luta de um canto do prédio, sem demonstrar nenhum sinal de pânico.
O barman disse em voz baixa:
— Em cinco minutos… em cinco minutos fará trinta minutos passados da hora. Já deve estar quase na hora… Hei.
Pow! Crack! Bang! Thud!
— Ei! Já chega. Se forem mais longe, vai virar briga até a morte…
Bang! Crack! Snap!
— Aargh! Desgraçado…!
— Morre! Morre!
— Dane-se. Façam o que quiserem… Hm?
Justo quando o barman estava prestes a desistir de tentar contê-los, o rangido de uma porta se abrindo ecoou pelo salão. Um jovem entrou, atraindo a atenção de todos de forma estranha.
Entre os frequentadores do bar, a mudança de comportamento de Jack foi a mais drástica. “Tô ferrado.”
O azar sempre perseguiu Jack. Isso significava que, quando se tratava de vida ou morte, seus instintos ficavam muito mais aguçados. Por isso, não se deixou enganar pela aparência do jovem, embora nem todos fossem tão perceptivos assim.
O brutamontes, com o rosto coberto de hematomas, falou:
— Phew… E quem é você agora?
Ele tentou recuperar o fôlego enquanto analisava o jovem. Tinha cabelos loiros bonitos, olhos azuis e roupas simples, mas que exalavam um ar de luxo. Mas o que mais chamou atenção foi a perna direita, uma prótese de aço. O brutamontes o olhou como uma fera que acabara de encontrar sua presa.
O loiro sorriu de forma selvagem, prestes a se mover, quando estourou uma garrafa na cabeça do gigante.
Thwack.
— Guh…
— O quê… quem diabos é esse cara?!
Era comum ver nobres bêbados começarem confusão e brigas. Pegavam qualquer coisa ao alcance, e como essa briga em particular acontecia num bar, a chance de envolver uma garrafa era bem alta. Mas… aquele jovem não tinha acabado de entrar?
“Será que ele já estava bebendo antes de vir pra cá? Não, isso não é o importante!”
Olhando mais de perto, o jovem parecia corado, ou os olhos estavam semicerrados… mas de novo, isso não importava. O que importava era que era um maluco que recorria à violência sem hesitar. O que importava era que, mesmo com uma perna protética, era um lutador muito mais habilidoso que Jack.
Um arrepio percorreu sua espinha. Seus instintos gritavam: “Cuidado com onde anda.”
Imediatamente, Jack se ajoelhou em silêncio e abaixou a cabeça. Sem nenhuma desculpa, estava pronto para aceitar qualquer punição.
O jovem loiro observou aquilo em silêncio… Sem dizer uma palavra, puxou outra garrafa e a quebrou na cabeça de Jack.
— Guh…
— Você é esperto, gosto disso. Peguei leve com você — disse o jovem.
— Rusell, por que demorou tanto assim?
— Ah, Sr. Barman. Me desculpe. Eu… perdi a hora…
— São 4:30h da tarde.
— Hã… Desculpa. Eu ainda tava bêbado, achei que era de manhã.
— Você acha mesmo que isso soa como uma desculpa aceitável?
— Provavelmente não… Mas, ei, que tal me deixar escapar dessa se eu limpar essa bagunça? — perguntou Rusell, inclinando a cabeça. — Mas falando sério, por que estavam brigando antes mesmo de a gente abrir?
Rusell começou a revistar os bolsos dos desmaiados. Logo, encontrou itens que podiam provar suas identidades. Jonathan, um mercenário de patente bronze do grupo Hammer; e Jack, sem identificação, mas com uma carta de recomendação de Ian.
“Ah, esse cara é o pior de todos. Bem ágil pra um canalha.”
Enquanto avaliava a identidade dos bandidos, um deles gritou:
— Khaaap!
Lançou um soco contra Rusell. Foi um ataque surpresa, aproveitando uma breve distração do jovem.
Thwack!
— Simba… Ele é um mercenário de patente ouro, hein? Mas por que luta tão mal?
— Ouro? Quem é ele?
— Diz que é Karus, o Lobo Cinzento? Não sei muito sobre ele. Deve estar só de passagem… Hã, hãm…
— O que foi, moleque? — o barman lançou a Rusell um olhar desconfiado — e com razão.
A expressão de Rusell ficou estranha. Parecia estar tramando algo.
— Nada, só percebi que é um desperdício.
— O quê?
— A bebida. Só consegui beber metade de uma garrafa, e a outra nem foi aberta… Não. Preciso ser reembolsado por esse tal de Karus.
— Vai atrás dele?
— Nah. Se eu botar esses caras pra trabalhar, ele vai acabar vindo atrás da gente.
Ao ouvir isso, o barman soltou um longo suspiro e disse:
— Tentar fazer você voltar ao trabalho de novo… Fico me perguntando quando o Kubharu vai finalmente chegar aqui…
— O quê? Ele tá sendo detido num bar? Por causa de dano à propriedade?
— Sim. Aparentemente, ele quebrou várias garrafas caras, então disseram pra ele pagar a dívida trabalhando…
O líder do grupo mercenário de patente ouro, Karus, o Lobo Cinzento, reagiu com uma mistura de incredulidade e irritação.
— Ha, sério mesmo. Esses caras do bar, e aquele Simba… Todos eles são um pé no saco, nem sei com quem gritar primeiro.
Após uma longa missão escolta, Karus havia dado uma semana de folga para seus homens e os alertado para não causarem encrenca, mas suspeitava que um ou dois poderiam acabar se metendo em confusão. Tudo bem. Podia usar esses incidentes como oportunidade para impor disciplina e definir o tom certo dentro do grupo.
Mas não só alguns deles tinham entrado numa briga, seu subordinado ainda estava detido? Por três dias inteiros? Como se fosse um servo contratado? Aquilo era um assunto completamente diferente.
— Temos uma reputação a zelar como grupo mercenário de patente ouro. Não podemos deixar isso passar. Vamos.
Karus partiu em direção ao Cepo com dez de seus homens mais confiáveis. Estava de muito mau humor, com uma expressão tão carregada quanto suas intenções. Claro, tecnicamente estavam errados ali, mas prender seu homem sem permissão e usá-lo como capacho? Ele não toleraria isso.
— Não sei quem esse cara acha que é, mas não vou ficar satisfeito até quebrar pelo menos uma das pernas dele.
— Dizem que ele já perdeu uma.
— É mesmo? — Os olhos de Karus brilharam com perigo. — Então ele não vai conseguir se levantar de novo no futuro.
Claro, a segurança no território Lloyd era conhecida por ser rigorosa, então vigilantismo privado era geralmente malvisto; no entanto, quem começou foi o outro lado. Além disso, Karus tinha contatos nos escalões superiores da segurança, então, com um pouco de dinheiro por baixo da mesa, não deveria haver problemas.
Se o outro lado também tivesse conexões poderosas, aí seria diferente. Mas ele duvidava muito disso.
“O dono de um bar pode até ter alguma influência com um oficial de baixa patente, mas não chega aos meus pés. Conheço o capitão da guarda”, pensou enquanto chegavam diante do Cepo.
Um portal vermelho vibrante se materializou bem diante dos olhos de Karus.
— Aqui estamos, o Cepo. É meu orgulho e alegria.
— Oh, é tão legal! Adorei o letreiro em forma de toco!
Um orc enrugado e um gato falante saíram do portal. Isso por si só já era o suficiente para fazer qualquer um recuar de susto, mas o verdadeiro impacto veio com a aparição do espadachim mais renomado de todo o continente, Airen Farreira, logo após.
— Oh? Você chegou cedo, pai.
E o jovem com a chamativa perna protética de aço o chamou de ‘pai’.