Terramar: O Mar Encoberto

Capítulo 1062

Terramar: O Mar Encoberto

Charles estava sentado no sofá, esperando calmamente por alguma coisa.

Os olhos de sua concha humana estavam sem foco, enquanto seu olhar se conectava aos descendentes que ele havia enviado para o Núcleo. O que exatamente tinha acontecido no núcleo, e quanto tempo lhe sobrava? Ele precisava saber a resposta dessas perguntas.

A luz estranha vindo de cima transformava humanos em entidades estranhas.

Para piorar, a Marinha da Ilha da Esperança não podia oferecer muita ajuda.

Ele tinha que usar seu corpo principal para tampar o buraco que levava ao Núcleo. Os únicos capazes de assumir a tarefa de explorar o núcleo eram seus descendentes, que haviam devorado sua carne e sangue.

Após devorarem a carne e o sangue de Charles, suas aparências se tornaram ainda mais bizarras, mas também ficaram ainda mais fortes. Tornaram-se tão poderosos que conseguiam resistir à influência daquela luz.

Justamente então, houve um estalo, e Charles perdeu a conexão com todos os seus descendentes. É verdade que a força deles havia aumentado drasticamente, mas isso era válido apenas quando comparados aos humanos do Mar Subterrâneo.

As condições no Núcleo tornaram-se extremamente imprevisíveis, e as chances de os garotos saírem vivos eram praticamente zero.

Quando Charles levantou a cabeça, Sparkle virou-se para ele e perguntou preocupada: "Papai, como foi dessa vez?"

Charles balançou levemente a cabeça, mas não havia decepção em seu coração. Essa já era a décima quinta rodada, e a falha já não importava mais neste momento.

Charles bateu com o dedo no apoio do braço, e um monstro deformado, com três cabeças, foi teleportado à sua frente.

Tinha um torso quase esférico, seis membros terminados em pinças tipo caranguejo, e três cabeças, cada uma com três olhos semelhantes a peixes, dispostos em padrão triangular. Também possuía uma língua macia e flexível de dois metros de comprimento.

Comparado ao Charles atual, parecia ainda mais bizarro. O monstro de três cabeças era um dos descendentes de Charles, mas ele tinha completamente esquecido sua existência até então.

Charles não esperava que os produtos defeituosos criados pela Fundação naquela época fossem realmente úteis algum dia.

Olhos brotaram por toda a superfície do monstro de três cabeças, e então ele começou a rastejar silenciosamente em direção ao túnel que levava ao Núcleo.

A expressão de Sparkle era complicada enquanto ela olhava para seu irmão que partia.

"Papai, provavelmente ele também vai morrer."

"Ah," respondeu Charles, soando nem triste nem feliz. É claro que eles morreriam. Iriam morrer em troca de algumas informações sobre o que estava acontecendo no núcleo.

"Mas são seus filhos, papai. Você devia tomar cuidado. Sua humanidade está se deteriorando um pouco rápido demais," disse Sparkle com uma expressão de preocupação no rosto.

Charles lançou um olhar de surpresa para ela. "Você tem razão, mas acho que a morte deles não tem nada a ver com minha humanidade. Nunca os considerei meus filhos, afinal."

"Na verdade, a criação deles foi um erro em si. O fato de eles poderem trazer algum valor, mesmo que pouco, significa que seu nascimento não foi em vão."

A boca de Sparkle se abriu, parecendo querer dizer algo, mas Charles já tinha voltado sua atenção para o monstro esférico de três cabeças.

Quando o monstro esférico de três cabeças chegou ao Núcleo, deparou-se com uma tempestade rugindo fora do colossal buraco que levava ao núcleo. A luz roxa intermitente no céu e a tempestade furiosa faziam o núcleo parecer estar no meio de um apocalipse.

A Fortaleza de Buracos Colossais devia estar bem ao lado do buraco colossal. A Ilha da Esperança havia estacionado ali muitas tropas, mas agora, a fortaleza simplesmente desapareceu. Não havia nada além de uma floresta feita de terra, concreto, aço e carne.

A floresta de terra, concreto, aço e carne parecia estar conectada, e às vezes tremia por algum motivo. Pelas roupas embutidas nos troncos das "árvores", era fácil deduzir como a floresta tinha sido formada.

O monstro de três cabeças logo desviou o olhar. Estava sob o controle de Charles, que fez com que ele flutuasse em direção à luz roxa no céu.

Logo depois, houve um uivo, e uma raiz de árvore, que se estendia por centenas de quilômetros, caiu pesadamente ao chão.

No entanto, a visão terrível não assustou Charles nem um pouco. Ele já havia se acostumado com cenas assim. O Núcleo passava por mudanças imensas, e entidades bizarras tão fortes quanto Divindades estavam morrendo em grande quantidade.

A identidade de seus autores e se o poder que portavam poderia ajudar Charles eram perguntas ainda sem resposta. Claro que Charles mesmo precisava descobrir essas respostas.

Charles observou o ambiente por um tempo antes de deixar uma sugestão hipnótica para continuar procurando pelo alvo. Então, ele relinquiu o controle do corpo do monstro esférico de três cabeças.

Não é que ele não quisesse monitorar todo o processo; Charles simplesmente tinha a sensação de que alguém o procurava. Apoiado no sofá, começou a falar consigo mesmo, dizendo: "Ainda não tive avanço algum. E você?"

"Os humanos não servem. Quando expostos a essa aura, eles não passam de três segundos. Confie em mim, tentei."

"Hum, tudo bem. Vou te procurar em breve."

Charles pediu para Sparkle ficar em casa, obediente, antes de se manifestar dentro de uma de suas conchas humanas. Em breve, ele chegou ao local de encontro—um lugar estranho onde planos se cruzam.

Charles não foi o primeiro a chegar, pois já havia vários Charles ali antes dele. Comparado à reunião anterior, algumas caras antigas tinham desaparecido, e algumas novas tinham aparecido.

Aquelas ausências provavelmente tinham perdido o controle e se tornado de verdade um deus. Com o tempo, mais e mais Charles inevitavelmente se tornariam deuses, e talvez ele fosse o próximo.

Quando a mesa longa ficou cheia de Charles, ele bateu com o dedo nela e declarou: "Vamos fazer nossos relatórios de progresso."

Charles não era o único investigando o núcleo. Cada um tinha seu próprio plano ao explorá-lo.

Charles queria aproveitar a vantagem numérica para descobrir exatamente o que acontecia no núcleo e de onde vinha aquela aura estranha, capaz de mutar quase tudo.

A ideia era boa, mas a realidade era cruel. Nenhum deles conseguiu encontrar sequer um indício, incluindo Charles, que usava seus filhos para explorar o núcleo em busca de pistas.

Fhtagn era poderoso, mas pelo menos podia ser visto.

O que exatamente aconteceu com 002? Ninguém tinha ideia— absolutamente ninguém.

O ar na sala ficou um pouco opressivo. Os rostos de todos estavam sem expressão, silenciosamente mostrando que tinham feito praticamente nenhum progresso.

"Preciso avisar que estou ficando sem tempo. Tenho no máximo cinco dias. No sexto dia, virei um deus, e vocês terão uma pessoa a menos para usar," disse um velho Charles de cabelos brancos.

Charles percorreu com o olhar os Charleses. "Então, vou ser breve. Os planos de contingência estão quase prontos. Nosso prazo pode variar de alguns dias até um ou dois anos."

"Diante disso, acho que podemos tentar uma abordagem mais radical."

Vendo que todos olhavam para ele, Charles explicou: "Acredito que o motivo de ainda não termos avançado não é por alguma variável desconhecida; é simplesmente porque somos fracos demais."

"Porém, uma quantidade enorme de poder e conhecimento é veneno para nós; pode nos transformar instantaneamente em deuses."

"Se quisermos quebrar esse impasse, precisamos pensar em uma maneira de ficar ainda mais fortes sem erodir nossa humanidade."

"Você tem algo útil para dizer? Meu tempo é precioso," disse um Charles jovem, com uma expressão de impaciência.

"A ideia veio enquanto eu olhava o mar outro dia. Enfim, vocês já ouviram falar daquela tal joaninha gigante das Águas Ocidentais?"