Minha irmãzinha vampira

Capítulo 98

Minha irmãzinha vampira

Cinco minutos antes da grande fuga de Jin e Ysabelle…

A coalizão contra Eyghon estava parada diante da poderosa criatura, encarando o Senhor Demônio com sangue nos olhos. Fazia vinte e quatro horas desde a aparição de Eyghon, e os elites do mundo não perderam tempo em se reunir.

Sempre que o Senhor Demônio aparecia, permanecia no mesmo lugar por três dias completos. E, embora ninguém soubesse ao certo por que ele ficava parado, uma coisa era certa: toda vez que surgia, trazia morte e destruição com sua infinidade de invocações. Quando a poeira baixava, Eyghon sumia como um pesadelo que assombrava a humanidade.

O principal motivo pelo qual as várias raças do mundo deixaram de lado suas pequenas diferenças era justamente por causa dessa ameaça insuportável. Demônios Externos e Senhores Demônio eram uma praga que infestava o planeta, e um Senhor Demônio como Eyghon poderia ser a causa da próxima extinção em massa.

Por isso…

"Milhares de caçadores. Cento e cinquenta mil lobisomens. Cinquenta mil vampiros. E dez mil exorcistas… Será que já houve um exército maior?"

Lilith murmurou, com um olhar de admiração não disfarçada, sem saber o que fazer com a visão diante de seus olhos. Milhares de homens e mulheres estavam reunidos numa vasta cordilheira, muitos deles combatentes experientes e magos treinados. De seu ponto de vista, parecia que ela estava assistindo a uma maré de formigas marchar juntas em perfeita união.

Reunir um grupo de soldados com capacidades limitadas já era uma tarefa complicada, mas cada uma dessas “formigas” que ela via tinha, no mínimo, caçadores de classificação B — elite capazes de matar vários Demônios Externos com as próprias mãos.

Embora possam ter existido exércitos maiores no passado, a força que ela testemunhava era muito superior. Sem falar que, atrás desse exército de um milhão de soldados, havia inúmeras criaturas prontas para apoiá-los.

Desde Vampiros antigos como a Matriarca Inocência, até caçadores de classificação S, lobisomens Alfa e até arcebispos da Igreja Sagrada. Individualmente, eles tinham poder suficiente para enfrentar legiões de Demônios Externos, e se unissem suas forças… poderiam provavelmente acabar com o Senhor Demônio que invadia o planeta.

Embora, claro, fosse apenas uma possibilidade.

"Pelo que me lembro, não," respondeu Capella ao olhar maravilhado para sua jovem mestra. "Estamos presenciando a história sendo feita neste momento."

"Eu nem quero fazer parte dela," resmungou Lilith com um bufuto e virou o rosto para o lado.

Irina, a silenciosa beleza, sequer olhou para o exército. Ela encarava furiosamente o gigantesco Senhor Demônio, com os dentes batendo e os olhos vermelhos como sangue. Se não fosse Lilith a segurá-la várias vezes, a Venus de cabelo branco teria invadido a boca de Eyghon para arrancar seu amado irmão de lá.

Nem Irina nem Lilith desejavam participar dessa guerra. Contanto que Jin estivesse bem, elas se importavam menos se a aliança matasse ou não Eyghon. Infelizmente, como o homem fora completamente engolido pelo sanguinário Senhor Demônio, as duas eram obrigadas a participar dessa atividade terrível.

"Os comandantes já deram o plano?"

"Ainda não, devem nos avisar em breve."

Faltavam aproximadamente quarenta e oito horas para que o tempo de Eyghon no planeta acabasse. Nesses dois dias, uma quantidade inconcebível de destruição poderia ser causada pelo Senhor Demônio e suas invocações, por isso a aliança não poupou esforços em acelerar a união de forças.

Embora derrotar Eyghon fosse uma tarefa quase impossível, eles poderiam pelo menos conter os danos. Mas, para Irina e Lilith, esperar o Senhor Demônio fugir não era uma opção aceitável. Elas precisavam resgatar Jin de dentro do estômago de Eyghon.

"Não se preocupem, eu tenho certeza de que o General Enzo não abandonará sua única filha. Provavelmente dará uma ordem de ataque para ao menos machucá-lo."

"Só machucá-lo não basta… Precisamos encontrar uma maneira de entrar na criatura e resgatar Jin e Ysabelle."

Lilith franziu a testa ao pensar na única solução possível. As últimas vinte e quatro horas tinham sido exaustivas para a jovem, que mal conseguiu dormir. Ela carregava uma preocupação constante com a segurança de Jin, além de dedicar-se a estudar os poucos registros que a humanidade tinha sobre Eyghon.

Lilith se preocupava dia e noite, lutando para encontrar a melhor estratégia para trazer seu companheiro de sangue de volta são e salvo. Mas, infelizmente, a Fortaleza da Terra era muito misteriosa. Com sua habilidade de anular toda magia e imunidade a ataques físicos, quebrar as defesas do Senhor Demônio era quase impossível, quanto mais matá-lo.

Se quisessem salvar Jin e Ysabelle… só restava uma alternativa: entrar na barriga da fera.

"... duvido que Lorde Sirius concorde com esse plano."

"Claro que não; ele prefere ver Jin morto."

Disse Lilith com uma resposta seca. Desde que Jin e Sirius duelaram, a bela loira não tinha uma boa impressão do irmão. Principalmente porque Sirius quase matou Jin de forma mortal.

"Irina."

"O quê?"

A Deusa do Inverno virou-se com um olhar gélido, fazendo Lilith estremecer. Ela permanecia silenciosa há um tempo, e sua primeira palavra foi tão fria quanto sua expressão. Engolindo um gole de saliva, Lilith insistiu:

"Podemos contar com o apoio da Casa de Everwinter?"

"Dificilmente," respondeu Irina com firmeza, balançando a cabeça. "Minha idiota de avó não se importa com meu Senhor Irmão. Não há como ela sacrificar vidas de Everwinter por ele."

"Que pena... Acho que só podemos confiar na Casa Blackburn."

Naquele momento, Lilith achou por bem que fosse uma sorte a Ysabelle ter sido engolida junto com Jin. O carinho do General Enzo por sua única filha era bem conhecido na sociedade dos Vampiros, e ele provavelmente usaria de tudo para trazê-la de volta, mesmo se precisasse ir até a boca da fera.

"Podemos organizar uma reunião com o General?"

"Difícil de dizer..."

Capella coçou o queixo de leve, dando uma resposta suave. Como guardiã de Lilith, ela não queria colocá-la em perigo. Além disso, ela não tinha afeto especial por Jin ou pela garota Blackburn que fora engolida junto. Se Lilith entrasse na Eyghon, Capella teria que ir atrás.

E, não importa o quanto fosse dedicada ao seu dever, Capella não gostaria de jogar sua vida fora por alguém que nem gostava.

"Por favor, avise-o. Essa é uma ordem."

Percebendo a relutância de sua guarda, Lilith deu uma ordem firme. E, enquanto Capella resmungava baixinho, a fiel guardiã apenas acenou com a cabeça e fez uma reverência.

Antes que ela pudesse dar mais um passo…

ARRRRRRRRRRRRAAAAAAARRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR!!!

A terra começou a tremer. Um grito profundo e ensurdecedor foi ouvido, enviando ondas de choque pesadas pelo ar e criando vibrações capazes de quebrar ossos humanos comuns. Muitos dos elites presentes caíram ao chão, e suas cabeças começaram a doer intensamente. Fissuras racharam o terreno rochoso, enquanto o som do rugido podia ser ouvido de várias regiões do continente.

"O-que está acontecendo?!"

Lilith gritou, completamente chocada. Ambas as mãos tampavam os ouvidos enquanto lágrimas começavam a escorrer de seus olhos trêmulos. Ela fez um esforço enorme para levantar o queixo, e o que viu a seguir… a deixou completamente abalada.

Eyghon, o Senhor Demônio que se supunha estar dormindo e em estado de dormência… Estava agora totalmente acordado. Com a boca aberta ao máximo, Eyghon soltou um grito que pareceu rasgar a alma, um que revelou uma fração de emoção ao seu interior.

Ele estava confuso, relutante e… amedrontado.

Pela primeira vez em sua vida, o poderoso Senhor Demônio, a criatura que unificou o planeta e conquistou todas as raças. Um Demônio vindo de outra dimensão, uma monstruosidade imune a ataques mágicos e físicos. Um alienígena de pesadelo, do tamanho de uma cadeia de montanhas, cuja cada passo causava terremotos por toda a região.

Aquela criatura…

Estava com medo.

BRRRRRRRR!!!

"E agora?!"

Lilith virou-se para o som profundo de trepidação que ressoava ao seu redor. E, para seu completo espanto, Demônios Externos de todas as formas e tamanhos corriam em direção a Eyghon, como filhotes voltando para a mãe.

Milhares, senão milhões, de Demônios Externos tentavam retornar desesperadamente ao Senhor Demônio, contrariando sua usual rotina de espalhar-se pelo campo de batalha para causar o máximo de dano possível.

As forças da coalizão ficaram visivelmente surpresas com o movimento repentino dos Demônios Externos. Desprevenidos, muitos abriram os olhos em choque ao ver milhares das criaturas passando por cima de suas cabeças. Contudo, os generais e caçadores experientes não permitiriam que aquilo continuasse por muito tempo.

"Todos às suas posições! Aniquilhem cada um deles!"

As forças de elite rapidamente entraram em ação, com cada comandante gritando suas ordens. Como estavam aqui para caçar Demônios Externos, começar a batalha uma hora ou duas antes não foi um problema.

Guerreiros seguraram os monstros frenéticos enquanto magos lançavam feitiços de apoio ou destruição. Lobisomens usaram suas garras para despedaçar os Demônios Externos, enquanto Vampiros queimavam-nos com magia. E, no meio do caos, sacerdotes curavam os feridos, enquanto exorcistas davam suporte auxiliar.

Era uma sinfonia de sangue, e as vítimas eram nada menos que os invocações de Eyghon.

Pela estranha razão, os Demônios Externos estavam desesperados para retornar ao Senhor Demônio, tornando seus movimentos previsíveis e, assim, criando um alvo enorme em suas costas.

Lilith não conseguia compreender o que estava assistindo.

Chamá-lo de batalha era exagero. Era um massacre unilateral. Centenas de Demônios Externos caíam a cada segundo, muitos deles nem chegavam a um quilômetro de Eyghon. Cadáveres empilhados uns sobre os outros forçavam os atacantes a usar esses cadáveres como degraus para se mover pelo campo de batalha.

Era uma carnificina sem sentido, tudo acontecendo de forma tão súbita.

Sobre a origem de tudo isso…

ARRRRRRRRRRRRAAAAAAARRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR!!!

Eyghon continuava seu grito incessante, como se estivesse chorando de dor. Abriu a boca, engolindo o máximo de Demônios Externos que conseguiu, como uma baleia azul se alimentando de krill. E, mesmo assim, quanto mais engolia, mais sentia que precisava de mais. O Senhor Demônio invocava seus exércitos com cada suspiro.

Em poucos minutos, toda a cadeia de montanhas estava repleta de Demônios Externos, superando a força da coalizão na proporção de dez a um.

Arkudols, Ornoths, Astrons, Doggons, Okarins…

A lista de Demônios Externos perigosos era interminável. Muitos possuíam campos anti-magia, e uma grande maioria tinha defesas altas contra ataques físicos.

Se eles estivessem organizados e dispostos a lutar até a morte contra a coalizão… o planeta teria perdido pelo menos metade de seus combatentes mais elite naquele dia. Mas, felizmente para a aliança, os Demônios Externos não pareciam dispostos a entrar numa batalha total. Eles só queriam voltar para seu mestre.

E, quanto ao motivo… isso era um mistério para todos.

"Lilith! Essa é nossa chance!"

"Chance?"

"Exatamente!" Irina apontou seu dedo indicador com entusiasmo para a boca aberta de Eyghon. "Podemos invadir Eyghon junto com os Demônios Externos e salvar Lorde Irmão assim!"

"N-Você tem razão…"

Idealmente, Lilith gostaria de elaborar um plano detalhado. Como entrar em Eyghon? Quanto tempo teríamos lá dentro? Qual seria o melhor método para escapar? Como encontrar Jin no labirinto que era o estômago de Eyghon?

São inúmeros fatores a serem considerados. Contudo…

"Não, você tem razão! Uma oportunidade dessa não aparece todo dia! Apesar de não sabermos o que está causando o sofrimento de Eyghon, podemos usar essa chance para resgatar Jin!"

Nesse momento, a mente racional de Lilith deixou a cautela de lado. Agora, eles tinham uma oportunidade clara de salvar Jin, e quanto mais demorassem, maior a chance de perder essa janela de chance. Assim, com toda a força do seu ser, Lilith decidiu correr para as presas da fera e salvar o seu companheiro de sangue.

Mas, antes que ela pudesse mover-se…

BOOOOOM!!!

Uma coluna de luz carmesim saiu da carcaça de Eyghon. Um feixe de magia densa atravessou os céus, rasgando as nuvens e enviando uma sensação insuportável de pavor por toda a espinha dos Demônios Externos. Não, até mesmo os observadores comuns ficaram cegos diante daquela torre vermelha espetacular.

Sentiram-se privados de poder… Sem esperança… E, mais chocante ainda… Amedrontados por aquela estranha coluna de luz.

Não importava se eram Caçadores de classificação B ou Vampiros antigos. Aquele laser escarlate era algo de outro mundo, algo majestoso, algo… hegemonizante.

E Eyghon… O Senhor Demônio indomável… Fechou os olhos uma última vez antes de seu corpo inteiro colapsar no chão da montanha.

Choque e medo.

Essas eram as duas emoções que permaneceram na mente de todos.

O que aconteceu com Eyghon? Por que ele caiu? O que era aquele estranhíssimo e poderoso feixe vermelho?

Milhares de perguntas ficaram no ar, e poucos conseguiam sequer compreender o que tinha acontecido. No entanto, havia uma pessoa ali que viu o inacreditável. Ela nunca desviou o olhar de Eyghon, enquanto tentava desesperadamente sentir seu precioso irmão mais velho.

Por isso, ela foi a única a ver o que veio após a coluna de luz vermelha.

Os olhos de Irina ficaram frios ao ver uma jovem carregando um homem em uma posição de princesa. Saindo do buraco na carcaça de Eyghon, a mulher segurava o homem com delicadeza, como se ele fosse seu bem mais precioso, e seus olhos revelavam as emoções profundas que tinha por ele.

Era uma cena realmente tirada de um conto de fadas.

Incapaz de conter sua irritação, Irina cuspiu com uma voz fria:

"Se vangloria…"