
Capítulo 74
Minha irmãzinha vampira
"Perseguam eles!"
Bem no meio de um desfiladeiro rochoso, quinze silhuetas saltaram de pedra em pedra, perseguindo dezenas de sombras. No entanto, aquelas sombras não eram entidades sem forma, eram monstruosidades terríveis, em todas as formas e tamanhos. Algumas delas eram versões selvagens de felinos de topo de cadeia, como tigres e leões, enquanto outras eram versões exageradamente grandes de avestruzes e outras aves grandes, que não conseguiam voar.
Mas, independentemente de suas características, todas compartilhavam de uma mesma e distinta qualidade… Elas não eram deste mundo.
"Não podemos deixar um Demônio Exterior escapar! Cerquem-os agora!"
Os quinze humanoides continuaram sua perseguição caótica, determinados a não deixar nem um centímetro para os Demônios Exteriores. Surpreendentemente, assim que atingiram uma distância aceitável, mais da metade deles começou a se transformar rapidamente.
Seus músculos se expandiram e sua pele cor de carne foi logo coberta por pelagem cinza. Suas cabeças humanas se estenderam de maneira anormal, com seus rostos sendo puxados para fora, formando uma imagem selvagem de focinho de lobo. Suas mãos se transformaram em garras afiadas como navalhas e seus pés cresceram até proporções semelhantes às de um yeti.
"Awoooooo!!!"
Uivos capazes de arrepiar os pelos de qualquer um ecoaram pelos cânions, deixando os Demônios Exteriores momentaneamente perplexos, enquanto olhavam inconscientemente para trás. Contudo, essa foi uma percepção brutal. No instante em que pararam por apenas um segundo, seus perseguidores aproveitaram-se e atacaram.
Alguns dos seres que eram meio-homem, meio-monstro desapareceram de vista enquanto avançavam mais rápido do que o vento. Com força física que superava qualquer criatura viva do planeta, os predadores lançaram garras cortantes que rasgaram a carne dos Demônios Exteriores, transformando-os em uma massa de carne desfeita.
Um após o outro, esses seres míticos dilaceraram seus oponentes. Como predadores que caçavam apenas por esporte, eles nem se preocupavam em consumir suas vítimas. Depois de matar um Demônio Exterior, pulavam para o próximo. E assim por diante. Eventualmente, a quantidade de Demônios Exteriores foi reduzida à metade antes mesmo que os demais companheiros entrassem na briga.
E isso não era aceitável.
"Não deixem os Lobisomens dominarem o destaque! Não podemos deixar que eles fiquem com todo o crédito!"
Um dos vampiros disparou, com o rosto avermelhado de raiva. Por serem fisicamente inferiores, os vampiros estavam exaustos da perseguição e só podiam assistir enquanto seus aliados avançavam uma passo à frente. Mas, agora que haviam alcançado os outros, não podiam permitir que os Lobisomens fizessem toda a obra.
Todos os vampiros restantes correram com o que sobrou de energia e começaram a lançar seus feitiços. Bola de fogo, Espigões de Terra, Raios...
Vários feitiços foram lançados, atingindo e destruindo vários dos Demônios Exteriores que tiveram a sorte de escapar do ataque dos Lobisomens. E, pelo que tudo indicava, os Demônios Exteriores que ousaram invadir seriam totalmente exterminados.
Mas, antes que o último Demônio Exterior pudesse ser dizimado…
"GRESSSS!!!"
"Porra-...!!!"
Um Demônio Exterior em forma de pterodáctilo deslizou do céu com as garras estendidas e o bico completamente aberto. Sendo o predador que era, o Demônio não atacou os Lobisomens, que rasgavam seus companheiros em pedaços com força física superior, mas sim, mirou na parte mais fraca.
Um verdadeiro Vampiro Estense, que mal treinara seu corpo. Exausto de tanto correr, seus sentidos estavam profundamente embotados e ele não conseguiu perceber o perigo até ser tarde demais. O pterodáctilo mergulhou com uma fúria oculta em seus olhos furiosos.
Se fosse morrer, ao menos levaria um de seus caçadores com ele.
Porém, antes que o Demônio Exterior pudesse arrancar-lhe o coração… Uma seta negra voou mais rápido que o som, atingindo em cheio o pterodáctilo e mandando-o voar dezenas de metros para longe.
Enquanto o Demônio Externo caía ao chão, uivou de dor, confuso quanto à origem do objeto estranho que mudou sua trajetória. Com um grito de lamento, olhou para o seu peito e viu uma magnífica espada de argila negra emergindo de seu corpo.
Ele tentou se mover, mas a espada tinha se cravado fundo na rocha dura. E, justo quando ia recuperar o equilíbrio, uma faísca negra saiu das bordas da katana e rapidamente pegou fogo, envolvendo o Demônio Externo em uma chama ardente que o consumiu por completo.
A Vampira, que quase fora estraçalhada pelo Demônio Externo, engoliu em seco, quase tendo sua alma ceifada. Com o coração acelerado, ela virou-se na direção de onde vinha a espada negra, na esperança de identificar a sua salvadora.
E não demorou muito para ela descobrir quem era.
Indiferente como se não estivesse em um campo de batalha, uma jovem mulher, vestida de cabeça aos pés com uma armadura de obsidiana e prata, surgiu do nada. A armadura tinha alta capacidade defensiva, embora fosse extremamente ajustada ao corpo, permitindo alta mobilidade e ventilação.
Isso era essencial, pois ela era altíssima e tinha curvas exageradas, difíceis de esconder em combate.
À medida que a jovem se aproximava da Vampira, ela tocou uma vez debaixo do queixo, fazendo a viseira que cobria seu rosto se retrair forçadamente. Naquele momento, o vampiro que ela havia salvado, sem perceber, prendeu a respiração enquanto admirava as feições perfeitas da guerreira que o tinha resgatado.
Seu cabelo preto, sedoso, caía de modo leve até os ombros, sem passar nem um centímetro além. Mas isso não era uma coisa ruim, pois realçava bastante seu rosto sem marcas, esculpido. Seu nariz pontudo e sua boca pequena pareciam incomuns para uma guerreira tão dura, mas apenas aumentavam seu charme. E, mais importante…
Seus olhos profundos, semelhantes a de um gato e de ágata,.
Encantavam a alma de quem ousasse olhá-los, convidando qualquer homem a se perder neles.
"Você está bem?"
"Senhora Ysabelle!" O Vampiro se levantou de repente, em posição de honra, e saudou a mulher. "Obrigado por salvar minha vida miserável! Estou profundamente honrado por você ter dedicado seu tempo para salvar uma alma tão inútil quanto a minha!!!"
"Hum…"
A mulher chamada Ysabelle franziu levemente o rosto e verificou a segurança do subordinado. Assim que percebeu que ele não tinha ferimentos graves, ela perdeu totalmente o interesse pelo homem e virou-se de costas.
"Descanse. Quando exterminarmos os Demônios Exteriores, voltaremos ao acampamento."
"U-Entendido!"
A Vampira de cabelos negros balançou a cabeça e virou-se para os outros soldados ao seu redor. Principalmente, os Lobisomens, que estavam ocupados rasgando os restos da carne dos Demônios Exteriores pedaço por pedaço. Apesar de estar horrorizada com as cenas, ela ainda se aproximou deles e falou:
"Captain, recue com seus homens."
"Por que? Seus homens estão cansados demais para continuar?"
Em contraste com o tom respeitoso dos vampiros, os Lobisomens não foram tão corteses. Olharam para Ysabelle como se estivessem insultados por uma Vampira feminina estar mandando neles.
Seus subordinados se irritaram com o insulto e avançaram como se quisessem fazer o Lobisomem comer suas palavras. Mas, a guerreira os deteve com uma mão levantada e balançou a cabeça.
"Nós eliminamos todos os Demônios Exteriores que escaparam de nossa rede. Só estou informando vocês disso. Mas, se seus homens quiserem perseguir fantasmas no cânion, fiquem à vontade. Eu não vou impedir."
"..."
O capitão dos Lobisomens encarou Ysabelle e ficou pensativo. Depois de algum tempo, o meio-bestial sorriu, exibindo seus dentes afiados e soltando um hálito horrível e repugnante.
"Você é uma guerreira combativa. Dá para entender por que nosso Alfa gosta de você. Talvez seja só uma questão de tempo para você se juntar à nossa matilha."
"... Seu bicho fedorento! Como se atreve a insultar nossa Mestra assim! Você vai-..."
"Parem!"
Ysabelle interrompeu sua subordinada levantando a mão. Contudo, isso não significava que ela iria deixar a frase no ar. Seus olhos de ágata escureceram até tornar-se vermelhos profundos, e uma chama obsidiana envolveu o Lobisomem infeliz, como uma serpente pronta para dar o golpe mortal.
"Não tenho interesse no seu Alfa, Capitão. Espero que entendam isso. Se não fosse nossa aliança, nem um segundo eu dedicaria a ele para falar."
"Heh… Por que tanta resistência? Não se preocupe, nosso Alfa certamente será delicado com você."
"... Você tem muita coragem, para alguém cuja vida está em risco."
"Sério? Minha vida realmente está em perigo?" O Lobisomem sorriu horrivelmente e aproximou seu focinho do de Ysabelle. "Você realmente vai tentar me queimar?"
A expressão de Ysabelle se aprofundou, enquanto suas chamas criadas tremulavam como línguas efêmeras, nenhuma delas cruzando a linha de chegada para queimar a couro do Capitão Lobisomem. Mil pensamentos passaram por sua cabeça naquele momento, mas, no final… Sua mente tomou uma decisão.
"ARGHHH!!!"
O Lobisomem arrogante, que exalava confiança poucos instantes antes, agora era envolvido por uma chama pálida, branca e preta. Incapaz de suportar o calor, caiu no chão e tentou desesperadamente apagar as chamas.
"-quente!!! ESTÁ QUEIMANDO!!!"
"Capitão!!!"
Os outros Lobisomens imediatamente correram para ajudá-lo, mas não conseguiram salvar seu líder, pois as chamas misteriosas queimavam rápido demais. Por mais que tentassem, o Capitão permanecia envolto em fogo e sem chance de escapar.
"Sua vadia! Tire as chamas agora mesmo!"
"Fica tranquilo, isso não vai matá-lo."
Ysabelle bufa sarcasticamente e assiste impassível enquanto o homem queimava. Somente após um minuto completo, ela finalmente cedeu e tirou as chamas que criara. Infelizmente, o dano já estava feito.
A maior parte da pelagem do Capitão fora incinerada, deixando-o apenas com a pele chamuscada. Coberto de queimaduras de terceiro grau, levaria vários tratamentos mágicos e hospitalares para se recuperar plenamente.
Mas isso deixou de ser problema de Ysabelle.
"V-Vocês… ousem nos atacar?"
"Se fosse vocês, pensaria seriamente em fechar a boca."
Ysabelle abriu a palma da mão e criou mais uma daquelas chamas misteriosas. Ao ver isso, os inúmeros Lobisomens recuaram inconscientemente. Então, fizeram a escolha mais sábia: ao invés de enfrentarem a Vampira que poderia incinerá-los num piscar de olhos, cuidaram das feridas do companheiro e se calaram pelo resto do tempo.
Com a paz restabelecida, Ysabelle virou-se e voltou a caminhar calma em direção aos seus subordinados. Foi quando uma mulher de meia-idade surgiu na escuridão e começou a sussurrar algo em seus ouvidos.
O rosto de Ysabelle passou por uma série de emoções enquanto as palavras chegavam até ela.
Primeiro, sua raiva virou choque. Depois, um sorriso radiante apareceu em seus lábios. Até que, por fim, uma expressão de misto de desgosto e surpresa pôde ser vista.
Sem perceber, Ysabelle virou-se para um ponto aleatório e olhou ao longe, como se estivesse focando em algo que estivesse muito, muito distante. As emoções a dominaram e, com um grito pungente, ela sussurrou:
"Jin…"