Poder das Runas

Capítulo 192

Poder das Runas

Capítulo 192: Vivendo no Agora

A porta do cofre estava quente, como se fosse viva.

Ash teve a sensação de que ela o chamava, silenciosamente perguntando se ele desejava entrar. Sem pensar muito, simplesmente pensou, Sim, e sua mão escorregou pela superfície de madeira sem resistência alguma.

Pensei que ela abriria... Uh... sei lá...

Ignorando o fato de que ela não tinha se aberto de forma normal, mas ainda assim permitia sua passagem, Ash entrou em seu Cofre da Alma.

**

A cena lá dentro não era o que ele esperava ver. O espaço não era grande, apenas suficiente para acomodar todos os seus pertences. Nem mais, nem menos.

O osso de dragão antigo brilhava com um brilho dourado em um canto, enquanto uma pilha organizada de moedas reluzia sutilmente em outro.

Tudo o que possuía estava disposto sem caos, organizado de forma equilibrada e estável, como se o cofre mesmo rejeitasse desordem.

O chão sob seus pés era completamente preto, como ágata. O mesmo acontecia com as paredes e o teto. Contudo, não estavam vazios.

Símbolos rúnicos brilhantes cobriam cada superfície, lançando uma luz tênue que mantinha o espaço suavemente iluminado, apesar da escuridão dos materiais. Conferia a todo o ambiente uma sensação antiga, arcana.

Até os pedestal onde seus itens importantes repousavam brilhavam, pulsando com uma energia sutil. Enquanto os objetos menos relevantes estavam dispostos no chão ou sobre prateleiras fixadas nas paredes e no chão.

Sério... tudo preto? Não dá pra criar algo um pouco mais criativo...

Seu pensamento sarcástico era direcionado à sua própria natureza. Ainda assim, não podia mentir — gostava do lugar. Era antigo, quase milenar.

Como algo que pertencia a uma era esquecida. Misterioso... embora ele soubesse que não havia realmente mistério por trás disso.

Embora o espaço parecesse fixo, Ash acreditava que fosse um tipo de cofre adaptável — que se ajustava para acomodar seus pertences, mudando o suficiente para guardar tudo sem desperdiçar espaço.

E agora... ele tinha a habilidade perfeita para armazenar todos os artefatos do Dragão....

...Tesouro.

Não, isso não devia fazer...

Ele sabia que, sob a influência de memórias estrangeiras, tinha tomado ações claramente antiéticas. Sem-vergonha, vilanesco, e até... depravado.

Embora o que acontecera não pudesse ser desfeito, o que viria a seguir ainda era uma escolha dele.

Ele poderia mudar.

Não, ele precisa mudar.

Seus atos haviam provocado conflitos entre os dragões, espalhando discórdia onde antes havia união. Mesmo que tivessem agido conforme sua lógica, o que ele fizera... foi algo diabólico.

Não posso... Não deveria pegar nada agora...

Ele decidiu. Não pegaria mais nada do tesouro dos dragões. Por mais tentadores que fossem os artefatos... por mais que pudessem fortalecê-lo, ou até Elysia, seu coração não era tão insensível ao ponto de ignorar seus erros.

Sentia que, se o fizesse, cruzaria uma linha sem volta e perderia sua humanidade. Como se já a tivesse perdido... talvez um pouco.

Embora, se outra situação semelhante ao que aconteceu com a Árvore do Mundo surgisse, talvez eu tivesse que pegar o que for necessário...

E tudo bem... talvez.

Deixando esse pensamento descansar, ele voltou sua atenção para outro lugar. Ainda havia uma coisa a que podia acessar.

A Biblioteca Dracônica.

...Falando em biblioteca.

Vamos criar a habilidade, pra qual quase falhei 200 vezes...

Deixando o cofre para trás, Ash se viu novamente em frente à Árvore da Alma, com as costas voltadas para ela.

Ele murmurou baixinho: "Criação de Habilidade."

E então, após alguns momentos de processamento silencioso...

[Criação de habilidade bem-sucedida]

Os olhos de Ash se iluminarem, e ele apressou-se em convocar a descrição da habilidade, ansioso para ver o resultado — mas antes que pudesse lê-la, todo seu Espaço da Alma tremeu.

***

[Visão de Elysia]

Ele ficou muito tímido...

Elysia pensou com um sorriso travesso no rosto enquanto observava Ash fugir ao ouvir suas palavras,

Claro que ela estava brincando. Ainda eram crianças, não mais do que 15 anos, mesmo que suas mentes já tivessem passado dos vinte, moldadas por batalhas, perdas e o peso de coisas bem além da sua idade.

Elysia se levantou e fez alongamentos, levantando os braços acima da cabeça, com a espinha fazendo um estalido ligeiro. Ela moveu o corpo um pouco, rodando os ombros, afrouxando seus membros rígidos.

Embora meu corpo esteja cheio de energia, sinto-o rígido e lento. Preciso treinar de novo e melhorar meu condicionamento.

Tenho que ficar mais forte e rápida... pra poder ficar ao lado dele, sem ser um peso pra ele.

Ela não queria passar pelo que já tinha passado, por sua própria burrice e fraqueza, embora fosse estranho.

Mesmo sabendo que sua mentalidade mudou de repente, ainda havia um conflito estranho entre sua decisão de pensar, 'não me importo com os outros, eles podem morrer se quiser', e, devido a esse conflito, sua forma de pensar se transformava em 'Vou proteger os outros apenas se tiver força, se não, ignorei-los'.

Embora houvesse semelhanças, entre elas havia uma diferença de céu e terra.

De qualquer forma, tudo o que acontecera, ela iria precisar de um tempo para se adaptar. E, pra ser honesta, Elysia estava...

...Muito feliz com essa mudança.

Essa mudança é boa. Pelo menos, não vou mais cometer os mesmos erros. Este não é a Terra, é um mundo de fantasia, e acho que a bondade aqui não é recompensada com mais bondade...

Aqui, a bondade era fraqueza, a não ser que fosse respaldada por força. Sua compaixão poderia facilmente se tornar uma maldição se ela não tomasse cuidado. Pode muito bem se transformar na ruína deles ambos — pelo menos, tudo indicava isso.

Então sim... ela acolhia essa mudança.

Quando ela estava prestes a invocar sua janela de status novamente para verificar seus atributos e entender melhor como iniciar seus treinos...

Uma luz intensa surgiu do cômodo da caverna em que Ash tinha entrado há poucos minutos.

’Curioso...’

Ela caminhou rápidamente na direção dela, querendo ver o que Ash estava fazendo, mas a cena dentro da sala era simplesmente...

...de tirar o fôlego.

Ash flutuava sentado com as pernas cruzadas. Seus cabelos voavam ao vento, mesmo sem janela ou vento algum. Seu corpo brilhava como um farol.

Cercado por torrentes de mana e...

Runas...?

O que são esses...

Sem saber o que eram as Runes, ela ficou confusa, mas, ainda assim, observava Ash como um adorador diante de uma divindade. Não exatamente assim... mas de uma forma positiva. Sim.

Por que sinto que ele fica mais legal e poderoso sem parar... Preciso começar a treinar também...

Embora estivesse hipnotizada por Ash — como sempre estava — desta vez, algo dentro dela acendeu com mais do que obsessão.

Desta vez, chamas de determinação... junto com obsessão... queimavam intensamente em seu peito.

***

O tremor do Espaço da Alma não cessou, ao contrário, aumentou ainda mais. Logo, Ash gritou.

Foi um grito desesperado que rasgou o espaço solitário, ecoando infinitamente pelo vazio silencioso.

Suas memórias, antes congeladas pelo passar do tempo, estavam sendo arrancadas — como se alguém estivesse puxando fios que se enredaram por tempo demais na trama de sua alma.

A dor que sentia era como tirar uma pedra que havia ficado cravada em sua carne por quem sabe quanto tempo... uma que se fundiu com músculo e osso, tornando-se parte dele. Era uma dor de rasgar, mas intensificada, porque não vinha do corpo, e sim da alma.

E a dor da alma... não só doía, como dilacerava.

Apesar de já ter suportado vários tipos de dor antes, essa era completamente diferente.

Estava em outro nível. Embora, de algum modo, consiga controlar seus gritos após um tempo, a dor não diminuía. Pelo contrário, aumentava.

Todo o Espaço da Alma tremer. Logo, as memórias que estavam congeladas começaram a ser puxadas para fora, em direção às raízes da Árvore da Alma.

Pelas raízes, elas eram lentamente absorvidas pela Árvore da Alma e sumiam. Era um processo lento no começo, mas, com o tempo, a velocidade aumentou.

Assim, 10 dias se passaram no Espaço da Alma... até que, por fim, a última memória foi absorvida pela Árvore da Alma.

Embora no mundo exterior apenas 10 minutos tivessem passado, para Ash pareceu um pesadelo se estender além da razão.

Ele desmaiou em algum momento do meio, quando a dor ficou insuportável. Mas acordou quando as memórias se tornaram finas, quando a pressão ao redor do seu coração começou a diminuir...

Grogue, Ash se levantou.

Mas então, os arredores tremeram novamente, quase fazendo-o cair de novo.

Maldição, deixe-me ficar de pé, droga...

Mas desta vez, não era a vibração do Mar da Alma. Em vez disso, vinha da Árvore da Alma.

A árvore voltou a se mover, e outra porta se formou no lado leste do tronco, ao lado da porta do Cofre.

Ironicamente, palavras apareceram acima de ambas as portas, indicando: {Cofre} e {Biblioteca} respectivamente.

Quando a porta se formou, Ash de repente sentiu algo mudar dentro de si.

Como se mil correntes invisíveis tivessem acabado de se soltar de seus ombros.

Sintiu... libertado.

É difícil de descrever, mas naquele momento, parecia que todo o peso—a tensão nos músculos, a tempestade de pensamentos conflitantes na mente, a sensação de peso no peito—desapareceram de repente.

O corpo dele não se sentia leve, não... parecia certo.

A mente, que antes guerreava na lama de traumas remanescentes e overstimulation, agora avançava como um motor hiper-tunado.

Antes, parecia que seu cérebro subia uma colina com um pneu careca... agora, era como se dirigisse um Bugatti Chiron.

A clareza que ele sentia agora... era a mesma que a Pensamento Omni lhe oferecera.

E, o mais importante, ele se sentia calmo. Excessivamente calmo.

Não havia ruídos de fundo, distrações desnecessárias, pensamentos passageiros. Tudo estava quieto. Silencioso. Focado.

Sem um único pensamento disperso, percebeu que só pensava no presente... não no futuro, nem no passado.

Ele vivia no presente.

***