
Capítulo 49
Nv. 99 Princesa da Chama Negra
Tinkle…
Com o som do sino de vidro, Jehwi saiu do supermercado com as mãos cheias de mantimentos e os colocou no porta-malas. Hoje era um dia em que a Princesa da Chama Negra não caçava. Mais precisamente, o quinto dia de sua suspensão de licença.
【A Criatura Mítica Viajante Felino das Trevas colocou as mãos na cintura e bufou, dizendo que não sabia que ele realmente iria dedurar.】
【Afinal, humanos não são confiáveis. — Eu sou o único em quem você pode confiar! — ela enfatizou novamente.】
Como o gato disse, Ijun realmente havia denunciado as ações individuais de Eunha para a Associação. Assim como fez com o Trapaceiro. Por isso, os dois foram suspensos de caçar por vinte dias.
Felizmente, Si-u não culpou Eunha. Talvez fosse por causa de Jehwi, já que ele trouxe uma oportunidade incrivelmente boa que compensaria a suspensão temporária.
— Aparecer numa transmissão?
— Sim. Foi uma oportunidade rara e difícil de conseguir. O jovem mestre… digo, o senhor Shin também me elogiou por isso.
Três dias atrás, Jehwi falou com uma expressão extremamente orgulhosa. Desde que apareceu no On Hunt, 2031, Caçadores Estelares MAIS QUENTES que o Verão, a Princesa da Chama Negra não tinha mais aparecido na televisão. O programa que ele conseguiu para ela era um talk show popular da emissora pública K, e prometia uma audiência muito maior que o Onhunt, um canal a cabo.
— Se você aparecer lá, não só mais pessoas vão te conhecer, como o seu valor também vai aumentar. O simples fato de estar lá já é prova disso.
Ele havia falado com aquela voz empolgada…
Eunha sentou-se no banco do carona, colocou o cinto de segurança e lançou um olhar para Jehwi. Jehwi estava rígido, com o celular na mão em vez do volante. Ao contrário de ontem, quando parecia animado, agora ele parecia abatido, como se alguém tivesse morrido.
— Vamos? — Quando Eunha, cansada de esperar, falou, só então Jehwi levantou a cabeça.
— Ah, certo. Vamos sim. Haha. — Jehwi coçou a nuca e enfiou o celular no bolso. Jehwi estava agindo estranho desde aquela manhã. Parecia debilitado, e ela pensou que fosse só por falta de sono, mas parecia que tinha mais coisa envolvida.
Eunha olhou de lado. A mão direita dele, pousada na alavanca de câmbio, tremia discretamente.
— Aconteceu alguma coisa?
— Hã? — Jehwi se assustou e bateu a cabeça no teto do carro. — N-não. Não aconteceu nada.
“…Aconteceu sim.” Eunha tinha certeza, mas não o pressionou por mais informações.
Nenhuma outra conversa se seguiu. Felizmente, chegaram com segurança ao destino, o túmulo da mãe dela. Mas Jehwi ainda parecia distraido.
Quando Eunha tirou as maçãs que comprara de uma sacola, Jehwi rapidamente ergueu a cabeça. — Ah, me dá aqui, por favor. Eu corto.
— Vai conseguir?
— Claro. Por favor, não subestime meu nível de dona de casa.
Jehwi ainda parecia fora de si enquanto segurava a faca de frutas. Alguns segundos depois…
— Ai, droga!
Eunha se aproximou de Jehwi, que havia se cortado e fazia uma cena.
— Por favor. Eu faço.
— N-Não. Eu quero fazer isso.
Jehwi riu e não entregou a faca.
— Este é o túmulo da sua mãe. Então ela também é alguém a quem devo prestar respeito.
— …É mesmo?
— Sim. É sim.
Jehwi continuou fatiando a maçã com empenho. Eunha achou que ouviu mais alguns grunhidos de dor, mas decidiu não tirar a faca dele.
Quando o sol se pôs atrás da floresta, Jehwi falou:
— Senhorita.
Eunha estava encarando a lápide, mas se virou lentamente. Os olhos de Jehwi, voltados para ela, pareciam complicados. A sombra em seu rosto não parecia ser apenas por causa do pôr do sol.
— Como é perder um familiar?
Eunha fechou os lábios com a pergunta inesperada. Como é? Era um sentimento que ela não conseguia explicar, nem queria.
Jehwi recobrou a consciência com o silêncio pesado e levantou a mão.
— Ah… Acho que não devia ter perguntado. Me descul…
— Arrependida.
— Hein? — Jehwi parou e olhou para Eunha.
— Me sinto arrependida.
Swish…
Um vento seco soprou. O vento parecia carregar o pôr do sol, sendo ao mesmo tempo quente e frio. No meio daquela atmosfera morna, o perfil de Eunha, banhado pela luz do entardecer, parecia profundamente imerso.
— Eu não estava ao lado dela quando ela morreu. Por que eu não estava lá? Eu devia ter ficado em casa se soubesse que isso ia acontecer. Se soubesse disso, não teria reclamado dos acompanhamentos do almoço.
Vergonha. Impotência. E remorso. A voz, misturada com todo tipo de emoção, não era nem fria nem quente, e surpreendentemente distante. Como esse vento que começou sabe-se lá quando.
— Esses pensamentos não saem da minha cabeça. Até agora.
— Entendo.
Jehwi não conseguiu dizer mais nada diante dela. Os olhos negros que encaravam a lápide se voltaram para ele.
— Parece que tem algo acontecendo.
Os olhos negros, tão escuros quanto o vazio do infinito, pareciam ver tudo. Jehwi hesitou, e murmurou em voz baixa:
— Dois dias… Desculpa mesmo, mas posso tirar dois dias de folga? Quer dizer, se puder tirar só um dia já fico grato.
— …Por quê?
Um longo silêncio se seguiu à pergunta de Eunha. O céu escurecia, e Jehwi falou com dificuldade quando os postes ao pé da colina começaram a se acender.
— Eu disse que tenho uma irmã mais nova.
— A irmã em Busan?
Jehwi assentiu, abatido.
— …Na verdade, não consegui mais contato com ela. Faz dois dias.
— Talvez ela esteja ocupada?
— Ela não me ignoraria só por estar ocupada. Perdemos nossos pais ainda pequenos, e ela é oito anos mais nova que eu. Me vê como um pai. Então algo deve ter acontecido…
Jehwi não conseguiu terminar a frase. Não conseguia evitar imaginar coisas terríveis.
— Instalei um app de rastreamento no celular dela, só por precaução. E quando rastreei a localização dela hoje de manhã…
Jehwi mexeu no celular e o entregou para Eunha. Um mapa de Busan apareceu na tela, menor que a palma da mão dela. E no meio, um ponto vermelho piscava.
— Essas são as últimas coordenadas dela, ali perto do Mercado Jagalchi de Busan.
— O Mercado Jagalchi?
— Isso. Um lugar onde surgiu um portão.
“Ah, agora que penso, acho que vi uma notícia dessas hoje de manhã. Haviam varios portões em Busan, e era basicamente só disso que a TV falava.”
Eunha, que estava olhando para o celular, disse hesitante:
— Se confirmarem que um civil foi pego por um portão, a Associação não enviaria agentes para lá? Como da última vez.
— Mas… — O rosto de Jehwi se nublou. Uma voz abatida se espalhou pelo ar pesado. — Há um boato de que o portão é um Portão Desconhecido.
De repente, o rosto calmo de Eunha se rompeu.
— Um Portão Desconhecido?
— A Associação emitiu uma ordem de evacuação para os moradores próximos. Mas eu acho suspeito que o leilão do portão ainda não tenha acontecido.
Portões Desconhecidos não eram leiloados. O Departamento de Portões não tinha a capacidade de prever esse tipo de portão, e mesmo que tivesse, eles eram perigosos demais para que guildas normais os limpassem. Por isso, não havia leilões de Portões Desconhecidos, e havia uma regra tácita de que guildas com Rank S deviam lidar com eles.
— Não quero pensar no pior, mas… Se o portão no Mercado Jagalchi não for um portão comum, mas um Portão Desconhecido, então minha irmã Jerim…
Jehwi não conseguiu continuar e apertou o celular com força. Eunha finalmente entendeu por que ele estava distante o dia todo.
Ela contemplou o perfil de Jehwi e, então, abriu a boca lentamente.
— Quer que eu vá com você?
— …Obrigado, mas não precisa. Não quero te causar problemas. Amanhã é um dia importante, não é?
— E se pedirmos ajuda ao Si-u?
— Hein?!
Jehwi pulou no lugar e balançou a cabeça vigorosamente. Tão vigorosamente que o som do movimento cortou o ar.
— T-tá tudo bem. De verdade. Nem sabemos se é mesmo um Portão Desconhecido, e minha irmã pode simplesmente ter perdido o celular.
…Pelo jeito que ele falou, estava claro que não queria pedir ajuda ao Si-u. Estava difícil convencer Jehwi, que parecia determinado.
— …Tá bom. Tire um tempo pra você.
Eunha assentiu.
— Eu consigo ir até a emissora sozinha. Não é minha primeira vez na televisão, então tudo bem.
— T-tem certeza?
— Sim.
Pensando bem, desde que Jehwi começou a cuidar de Eunha, ele vinha trabalhando todos os dias, inclusive aos fins de semana. Um ou dois dias de folga não fariam mal. Graças a isso, Eunha também poderia aproveitar um tempo sozinha pela primeira vez em muito tempo.
— Muito obrigado.
Jehwi se curvou diversas vezes em gratidão, até que, de repente, parou. E pediu algo com cautela:
— E… você poderia não contar isso ao jovem mes… digo, ao senhor Shin?
Jehwi franziu levemente o rosto, como se aquilo o incomodasse. Mesmo com uma relação de confiança de longa data, Jehwi ainda parecia ter dificuldade com Si-u.
Eunha sorriu de leve, achando engraçado ele ficar tão tenso só de mencionar o nome dele, e assentiu.
— Tudo bem. Não vou contar.
— …Obrigado!
Depois disso, Jehwi não suspirou. Não pisou bruscamente no freio nem virou o volante de repente. Chegaram com segurança ao estacionamento, e Jehwi pegou os mantimentos no porta-malas e os levou até o décimo sétimo andar.
— Certo então. Vou direto para a estação de Seul. Volto até amanhã à tarde no mais tardar.
— Boa sorte.
— Obrigado! Boa noite!
Ele ainda devia estar preocupado com a irmã. Jehwi correu até o elevador. Observando suas costas, Eunha se perguntou como seria se ela também tivesse irmãos.
No dia seguinte…
【Assessor Park】 【7:23】
Srta. Lee, cheguei em Busan ontem no último trem.
Obrigado por me dar um dia de folga.
Ela tinha uma mensagem de Jehwi. Eunha estava deitada na cama e tocou devagar na tela.
【Eu】 【7:24】
Como foi?
【Assessor Park】 【7:24】
Fui até a república onde ela mora, mas parece que ela não volta pra casa há dois dias >﹏<
Acabei de chegar no Mercado Jagalchi. Vou dar uma olhada por aqui e volto pra Seul até o fim da tarde no mais tardar.
A gravação começa às 14:00h, né? Me desculpa por não estar aí com você T^T
Boa sorte!!! ฅ^•ﻌ•^ฅ
Eunha riu com o emoticon de cachorro torcendo e respondeu:
【Eu】 【7:25】
Cuide-se também.
【Assessor Park】 【7:27】
Sim! Logo mando a localização da emissora e os contatos da roteirista! 😀
O tempo passou e já eram 12:09h. Eunha segurava o celular, que não tocava. Jehwi tinha dito que a avisaria, mas ainda não havia notícias. Ela precisava sair logo.
— …Será que ele tá ocupado?
Ele tinha um trabalho principal, e era extremamente pontual e responsável. Era muito estranho Jehwi simplesmente sumir.
【Eu】 【12:09】
Senhor Park?
E a localização da emissora e o contato da roteirista?
Tique-taque.
O tempo passou. Eunha terminou de se arrumar e checou o celular de novo.
<0 mensagens recebidas>
<0 chamadas perdidas>
Enquanto encarava a caixa de entrada vazia, o celular vibrou de repente.
<Olhos azuis> 010-XXXX-XXXX
Era Si-u.
— Alô.
—Sou eu. Já saiu?
— …Estava prestes a sair.
— Entendo. Parece que Jehwi se atrasou um pouco.
— Não. Eu que dormi demais.
— Dormiu?
— Sim.
— …
Parece que ele realmente não acreditou que Eunha tinha dormido demais.
— …Eu estava meio cansada ontem. Por que ligou?
Eunha decidiu mudar de assunto de propósito.
— Ah, é que…
Felizmente, Si-u não perguntou mais nada.
— A gravação de hoje é uma ótima oportunidade em muitos aspectos, mas só queria dizer que seria bom não chamar atenção como da última vez.
— Por quê?
— Ultimamente, mais pessoas têm prestado atenção em você.
— Não era isso que você queria?
— Bem… Era, mas…
Si-u hesitou.
— …Enfim, por favor. O melhor agora é evitar chamar atenção.
— Ok, vou desligar. Preciso ir.
Click.
Eunha desligou e soltou um leve suspiro. Mentir não combinava com ela.
Ele ainda está…
Eunha tocou no celular.
<1 nova mensagem>
A tela brilhou de repente. Será que ele finalmente mandou uma mensagem? Eunha abriu a caixa de mensagens amarela e conferiu o conteúdo.
【Assessor Park】 【13:02】
Dtys
— …?
Um erro de digitação? No momento em que ela inclinou a cabeça, o celular vibrou de novo e chegou outra mensagem.
【Assessor Park】 【13:02】
socorrooo