
Capítulo 4
A Empregada Secreta do Conde
Não era fácil cuidar do mestre cego, e Vincent estava desconfiado demais. Segundo os rumores, Paula era a décima pessoa contratada depois que ele se trancou no quarto. No começo, todos aceitavam o trabalho, mas a maioria não aguentava muito tempo – ou desistia, ou simplesmente desaparecia.
Além dos desaparecimentos misteriosos, Paula achava que entendia por que ninguém durava muito. Talvez por ser cego, ele fosse sensível a cada som, cada movimento, e tão afiado quanto isso.
E ele estava preso na cama. Mal se mexia, exceto por breves deslocamentos quando necessário. Principalmente quando alguém entrava no quarto – ele logo se cobria com o lençol, como se quisesse sumir.
Além disso, o temperamento era péssimo. Tudo o que ela levava virava pelo avesso. Ao mesmo tempo, ao menor sinal de movimento, ele se encolhia sob os lençóis, escondendo-se como um animal acuado.
Um gato de verdade.
Felizmente, Vincent só tinha um momento de relativa calma: quando o mordomo aparecia. Aquele senhor idoso que trouxera Paula visitava o quarto uma vez por dia, e, durante essas visitas, os dois pareciam ter conversas sérias. Nesses momentos, Vincent não se enrolava nos lençóis e assumia uma postura quase formal. Toda vez que espiava, Paula se perguntava se ele não era, originalmente, uma pessoa séria e intensa.
Então pra que todo esse teatro?
O prato que voou perto do seu rosto se espatifou na parede. Ela já estava cansada até de olhar para trás.
“Saia.”
Paula suspirou fundo e fechou os olhos com força. Vincent encolheu os ombros, mas seus olhos — vazios — permaneceram abertos.
“Acho que o senhor não gosta de mim.”
“Exato. Não gosto. Então suma.”
“O que há de errado comigo? Se me disser, posso melhorar.”
“Tudo. De um a dez.”
Isso não é bom.
“Farei o possível para agradar o senhor.”
“Não precisa. Some da minha frente.”
Ah, como eu quero te dar um soco.
Criança teimosa precisa é de uma boa noite de sono. Paula olhou para a cabeça de Vincent.
Será que não posso acertá-lo só uma vez?
“O que você está pensando?”
“…”
“Nem pense em besteira. Eu te mato.”
Sensível pra essas coisas, hein?
Ela encolheu os ombros e se virou para recolher os cacos do prato.
Que desperdício.
Aquilo valeria uma boa grana no mercado. Com um ar de lamentação, ela lambeu os lábios e juntou os pedaços.
Bom, vamos trocar os lençóis antes de pensar na comida.
“Senhor, preciso trocar os lençóis.”
“Não se aproxime.”
“Se o senhor pudesse sair da cama por um instante…”
Foi quando ela se aproximou para puxar os lençóis. Algo voou e acertou sua testa. O impacto foi forte o suficiente para deixá-la tonta por um segundo. Quando recuperou o equilíbrio, viu o que a atingira: um relógio de mesa.
Ao pegá-lo, notou que o ponteiro das horas parara, quebrado.
Maluquice.
“Se não gosta, pode dizer não. Por que ser tão perigoso assim…?”
“Por quê? Tem medo de morrer? Ninguém liga se você morrer mesmo.”
Paula ergueu o olhar do relógio e o fixou nele. Vincent, raramente visível sob os lençóis, parecia indiferente, mesmo depois de atirar coisas nela.
Não, na verdade, ele estava rindo dela.
“Gente como você é óbvia. Pessoas que fazem qualquer coisa por dinheiro. Coisas sujas, obcecadas por grana. Será que gente assim tem medo da morte? Aposto que você só está aqui pelo dinheiro. Caso contrário, não aceitaria a proposta de um estranho tão fácil.”
“…”
“Sabe por que te contrataram? É porque você é competente? Confiável? Não, nada disso. Porque não importa se eu te matar. Se souber bajular, já é útil o bastante. Se for irritante demais, não há problema em te eliminar. Essa é você.”
As palavras dele a perfuraram como uma lâmina. Cada sílaba mutilava seu interior. Como alguém podia ser tão cruel? Dizer coisas tão duras? Mesmo assim, as lágrimas não vieram — ela já estava acostumada com esse tipo de coisa.
Criticar é fácil. Era fácil atacar o outro como se fosse natural, como respirar, e se sentir melhor com isso.
As pessoas sempre fizeram isso com ela.
Até seu pai e sua única irmã agiam assim. Elevavam sua própria dignidade pisando nela, e esse era o valor da sua existência.
Então, não doía.
Não doía mais do que as surras do seu pai.
Claro, isso não significava que não fosse desagradável.
“Que coisa mais cruel.”
“O quê?”
“Que azar o meu, ter um mestre tão impressionante.”
O rosto de Vincent ficou vermelho. Era patético vê-lo encarar o vazio.
Ele rosnou, com os dentes cerrados:
“Você. Cuide da sua língua.”
“Já que mencionou, o senhor está certo. Sou obcecada por dinheiro. Ele é tudo pra mim.”
“O quê?”
“Como o senhor disse, ninguém se importa se eu morrer. Se eu desaparecer, ninguém virá me procurar. Se o senhor ordenar minha morte agora, não posso resistir. Então não tenho motivo para ter medo. Se ainda assim não gostar de mim, é só me matar. E, se for me matar, agradeceria se fosse rápido. É mais limpo que tortura. Ah, e pode ficar tranquilo — ninguém virá me vingar. O senhor achou a pessoa certa.”
“…”
Ele finalmente calou a boca. Por um instante, um reflexo de surpresa apareceu em seus olhos vazios. Foi breve. Quando Paula se aproximou novamente, ele logo recuperou a postura defensiva.
“Então, senhor…”
Ela ignorou as mãos dele tateando, procurando algo para arremessar.
Ele já não tinha mais nada para jogar, afinal.
Aproveitando seu constrangimento, ela parou diante da cama.
“Com licença.”
E puxou o lençol com força.
Ele nem teve tempo de reclamar e rolou na cama. Um segundo depois, Vincent caiu no chão com um baque.
“O que você está fazendo?!”
“Trocando os lençóis, senhor.”
Enquanto ele tentava protestar, ela o empurrou e puxou o resto do lençol, substituindo-o por um novo.
Fingiu não ouvir os gritos.
Em seguida, ajoelhou-se diante dele, que ainda se debatia no chão, e começou a desabotoar seu pijama. Vincent, percebendo, tentou impedi-la, mas ela segurou sua mão, pressionou-a contra o chão com o joelho e continuou.
“O que está fazendo? Não me toque!”
“Por quê? Ora, o senhor tem um ótimo corpo.”
“O quê?”
Ele ficou confuso por um instante, mas logo revirou o corpo todo, tentando se livrar. Sua força era maior do que ela esperava, e ele quase a derrubou. Com um movimento brusco, ele conseguiu libertar uma mão, agarrou sua cabeça e a empurrou. Mas ela não cedeu.
Sua cabeça foi jogada para trás, mas ela não soltou o pijama. Apertou a mão dele com mais força com o joelho e torceu o corpo, tentando puxar a roupa. Foi uma confusão — mãos se debatendo, corpos se chocando.
Depois dessa luta, ela finalmente arrancou o pijama e jogou-o para trás, por cima do ombro.
Fazia cerca de um ano que ele perdera a visão. Disseram que ele ficou trancado no quarto e mal comeu direito por meses.
Ele estava magro demais.
O corpo exposto não tinha carne.
As costelas saltavam. Os músculos, definhados. Por fora, até que parecia normal, mas sem a roupa, era lastimável. Quando segurava seu braço, sentia só os ossos, mas não imaginava que fosse tão frágil. Havia também pequenos hematomas pelo corpo.
Pensando bem, o rosto que vira de perto também estava pálido e esgotado. Não sabia se ele dormia direito, mas as olheiras eram profundas. Seus olhos verdes, sem foco, e os lábios rachados soltavam uma respiração pesada.
Se eu apertar, ele quebra.
Mesmo sendo um homem adulto, ela teve essa impressão.
E isso a incomodou.
Sem pensar, ela tocou seu rosto. Ele estremeceu e desviou do contato.
Paula baixou o olhar e cerrou os lábios.
Que pena.
Retirou a mão lentamente.
Tirou o joelho que pressionava sua mão e o empurrou de volta. Assim que seu corpo caiu, fraco, ela puxou suas calças.
Deixarei a cueca por hoje.
Levantou-se com o pijama sujo e pegou um novo no armário. Ele se encolheu o máximo que pôde, braços em volta do corpo magro. Suas costelas salientes eram tristes de se ver.
“Se quiser continuar vestindo roupas fedorentas, não posso impedir. Mas, como empregada do senhor, tenho o dever de mantê-lo apresentável. Seria ótimo se o senhor estendesse os braços para eu vestir o pijama novo.”
“Vou te matar.”
“Sim. Agora, os braços para cima.”
Segurou seus braços finos. Ele resistiu, mas a força era fraca. Nunca imaginara que um homem pudesse ser tão frágil. Era o reflexo de uma vida trancada no quarto.
Em vez de forçá-lo, pendurou o pijama no próprio pulso e o ajudou a vestir. Ele se agitou, mas começou a pôr a roupa sozinho. Talvez tivesse vergonha de estar nu. Fingindo não notar, ela ajustou as mangas para facilitar.
“Aqui estão as calças. E a cueca.”
“…”
Nenhuma resposta.
Ela nem esperava uma.
Pegou as roupas sujas e foi até a cama. Tirou a fronha e trocou os lençóis. Ao ver a cama limpa, sentiu um pouco de orgulho e olhou para Vincent. Felizmente, ele já vestira as calças.
Aproximou-se dele, satisfeita com sua aparência arrumada. Vincent tentava se levantar, apoiando-se no chão. Quando ela estendeu a mão para ajudar, ele a afastou com força. Então, tateou no ar e rastejou de volta para a cama sozinho.
Teimoso.
“Senhor, é para o lado direito.”
“Cale a boca.”
Mesmo resmungando, ele se virou com cuidado para a direção correta e pegou a roupa.
Mas espera aí…
E a cueca?
“Senhor, precisa trocar a cueca também.”
Vincent se enfiou na cama ao ouvir isso…
Ela perdeu as palavras ao vê-lo se encolher no canto, envolto no lençol. Por via das dúvidas, cheirou o ar.
Um cheiro desagradável.
Será que…?
“O senhor não trocou a cueca?”
“Saia.”
“Não, está suja. Com licença, senhor.”
Assim que se inclinou, o lençol se moveu, e algo surgiu de dentro dele.
A arma que encostou em sua testa.
O susto foi tão grande que ela congelou, certa de que ele puxaria o gatilho.