O Príncipe Problemático

Volume 1 - Capítulo 83

O Príncipe Problemático

“Há pouco tempo tivemos nossa primeira briga”, disse Erna, trazendo à tona o evento vergonhoso.

A Duquesa Arsène ergueu o olhar do livro que lia pela primeira vez desde que Erna chegara, pontualmente para sua intrusão de quarta-feira. Erna falava sem parar há uma hora e não demonstrava sinais de que iria parar.

“Estou imaginando que você foi terrivelmente derrotada.”

“Não, Vovó, acho que ganhei, mas sem querer.”

“Ah, é?”

“É sim. As empregadas e os criados fizeram apostas sobre quem ia aguentar mais tempo. A minha empregada, Lisa, foi a única a apostar em mim e, como todo mundo apostou no Bjorn, igual a você, Vovó, a Lisa ganhou uma grana preta; ela até me comprou chocolates para agradecer.”

A Duquesa viu o sorriso orgulhoso no rosto de Erna e soube que era verdade. Ela riu da situação absurda.

Era claro que Erna não tinha a menor chance de ser uma princesa digna, falando sobre problemas conjugais para os outros. Diferente da Gladys, ela nunca teria compartilhado detalhes de qualquer discussão com Bjorn. Ela certamente estava se mostrando bem menos divertida que Erna.

Erna começou lentamente a se abrir e compartilhar detalhes da briga. A Duquesa fechou o livro e o colocou na mesa, junto com seus óculos de leitura. Charlotte saiu do parapeito da janela e se aconchegou no colo da Duquesa.

Enquanto a Duquesa ouvia a história, ela acariciava Charlotte, que ronronava satisfeita. Não parecia algo muito digno de se fazer, compartilhar os detalhes da briga e, no final, mesmo Erna tendo ganhado, parecia que ela não estava em uma posição favorável.

“Minha querida, por que você gosta tanto do Bjorn?”

Erna ficou surpresa com a pergunta e olhou para a Duquesa, sem saber ao certo como responder. A Duquesa olhou para ela com olhos preguiçosos, sonolentos, que pareciam os de Charlotte.

Todas as histórias que Erna compartilhara com a Duquesa fizeram a mulher pensar que Erna era completamente apaixonada pelo marido, mas o marido não nutria os mesmos sentimentos. Parecia um relacionamento muito unilateral.

“Para a maioria dos homens, tudo se resume à aparência, um homem não é nada além de um rosto, e o seu marido tem muito talento nesse quesito.”

“Hum, sim?” Erna não sabia se devia concordar ou questionar.

A declaração veio muito inesperadamente. A Duquesa raramente contribuía nas conversas, então ser atingida por palavras tão certeiras, ainda que verdadeiras, foi chocante.

“Só porque um homem parece agradável por fora não significa que ele seja agradável por dentro. Não existe uma lei universal que determine que algo ruim por fora é ruim por dentro, ou vice-versa. Sempre é melhor tentar arranjar um homem que seja pelo menos bonito por fora, para que, se ele acabar sendo ruim por dentro, pelo menos ele seja bonito.”

Erna nunca esperou que a Duquesa Arsène dissesse tal coisa, ou qualquer dama nobre, para o caso, mas ainda assim, a Duquesa continuou falando como se estivesse comentando casualmente sobre o tempo.

“Um rosto bonito sozinho pode trazer alegria, e essa alegria pode ajudar a criar paciência. Tenho certeza de que você entende bem, estando com o Bjorn e tudo mais.”

“Não é bem assim, Vovó, eu não sou assim.”

“Claro, mas não espere muito dele, senão você terá mais dessas discussões e, inevitavelmente, ele vai se cansar de você e das brigas constantes.”

Erna ficou ansiosa enquanto a Duquesa atingia suas emoções com palavras afiadas. Ela pensava que conhecia a Duquesa bastante bem, mas parece que sua arrogância só gerou ignorância. Havia uma grande diferença entre essa avó urbana e sua própria avó rural.

Havia algo na velha mulher que lembrava Erna de Bjorn. Ela pensava que isso seria o suficiente para lhe dar força para ir vê-la semana após semana.

Envergonhada, Erna olhou pela janela. Ela imaginou todas as coisas que Bjorn havia feito que a tinham deixado chateada e percebeu que os atos se encaixavam em outro rosto. Ela ficou brava consigo mesma por ter um lado tão esnobe.

A Baronesa Baden teria um ataque se soubesse como Bjorn realmente era.

“Posso ver que estou certa, não estou?” Um sorriso travesso surgiu no rosto da Duquesa, um sorriso que lembrava Erna de Bjorn.

“Na verdade, sim, é um pouco assim”, murmurou Erna, as bochechas coradas.

A Duquesa olhou para Erna, confusa. Ela tinha sido divertida de provocar, mas parecia muito séria olhando pela janela. Ela fora pega de surpresa pelas declarações da Duquesa. Isso foi totalmente inesperado.

A Duquesa explodiu em risadas, o que assustou Charlotte, que pulou do colo da Duquesa e se escondeu embaixo do sofá. O riso ecoou por toda a sala de visitas.

Ela pensou que Bjorn tinha chegado ao fundo do poço e estava procurando desesperadamente alguém que se casasse com ele. Pelo menos, parecia que ele tinha feito a escolha por desespero e estava simplesmente desistindo.

A Duquesa sorriu por um longo tempo enquanto olhava para Erna. Ela se levantou do sofá e acariciou a bochecha de Erna com a mão.

“O que você está olhando, tão longe?” perguntou a Duquesa.

Erna simplesmente olhou para ela, com olhos tristes. A Duquesa Arsène estalou a língua e saiu da sala de visitas. Erna a seguiu em seus passos, contemplando silenciosamente.


O quarto era decorado com papel de parede verde-claro, visível entre os retratos e as fotos. Parecia que a sala era uma exposição, registrando toda a história da família.

Erna seguiu a Duquesa Arsène com um pouco de excitação. Era a primeira vez que ela via qualquer coisa da mansão além da sala de visitas.

“É o Duque de Arsène?”, perguntou Erna, cautelosamente.

Ela ficou diante de um grande retrato que pendia no meio da parede. A Duquesa assentiu enquanto vinha ficar ao lado de Erna; a semelhança com Bjorn era impressionante.

“Eu era uma beleza bastante famosa quando era mais jovem. Recebia propostas de casamento do mundo inteiro.”

“De todos esses pretendentes, o Duque Arsène deve ter sido o melhor de todos. Ele certamente causou uma ótima primeira impressão. Ele deve ter tido uma personalidade incrível.”

“Bem, digamos apenas que eu tive mais sorte do que você”, disse a Duquesa brincalhonamente, se afastando para a próxima pintura.

Elas se moveram pela galeria lentamente, e Erna observou muitos rostos. Havia até um da Rainha Isabela e seus filhos quando eram muito mais jovens.

“Ah, Bjorn”, disse Erna, reconhecendo os gêmeos na foto.

“Você consegue adivinhar qual deles é ele?”

Erna ficou séria e estudou a pintura. Era muito difícil dizer quando eles eram tão jovens, mas a Duquesa levou Erna a outras pinturas feitas enquanto os gêmeos cresciam. Ela pôde ver suas personalidades se desenvolvendo com a idade, e Erna conseguiu adivinhar com precisão qual era o seu marido.

“Não importa o quanto um homem seja um rosto e você goste desse rosto, você não deve mostrar abertamente seus sentimentos. Seu marido é muito bom nisso. Você tem que aprender a esconder que gosta deles.”

“Sim?”, perguntou Erna, confusa.

“Significa pressionar quando você precisa pressionar e ceder quando precisa ceder. Agora, Erna, tudo o que você está fazendo é ceder, dando ao Bjorn o que ele quer.”

“O quê?”

“Sério, criança, você se casou com um homem sem nunca ter tido um relacionamento antes?”

“O que a senhora quer dizer, Vovó?”, disse Erna, olhando para seus pés como se estivesse sendo punida.

“Menina tola”, disse a Duquesa, estalando a língua mais uma vez e voltando-se para as pinturas.

A Duquesa levou Erna de volta à sala de visitas, onde elas terminaram o chá e se despediram.

“Vejo a senhora na semana que vem no palácio, Vovó.”

“Eu não vou”, disse a Duquesa severamente.

“Claro, vejo a senhora então, Vovó.”

A tola criança sorriu alegremente enquanto ia embora, deixando a tola declaração em seu rastro.


Depois de se arrumar antes do previsto, Erna seguiu pelo corredor dos casais até o quarto de Bjorn. Sua mente estava maravilhosamente clara, embora a preocupação em receber os convidados a tivesse mantido acordada.

“Bjorn?” Erna espiou cautelosamente pela porta. Bjorn estava em frente a um espelho, com criados ao seu redor, o deixando pronto, todos olhando para ela. “Posso entrar?”

“Parece que você já entrou”, Bjorn riu.

Os criados continuaram preparando Bjorn enquanto Erna entrava completamente no quarto. Erna olhou para o marido a uma distância segura dos criados que estavam em constante movimento. Ele estava usando uma gravata e estava escolhendo quais abotoaduras usar.

“Acho que essa seria melhor”, disse Erna.

Ela achou que seria melhor não interferir, mas não conseguiu se controlar. As ônix que Bjorn havia escolhido eram lindas, mas ela queria que ele usasse joias combinando com as dela.

Bjorn mudou de ideia e colocou as ônix de volta, pegando os safiras azuis. Erna olhou para o marido, e seus olhos brilharam junto com as safiras.

Eles iriam receber as famílias reais que estavam vindo para a cerimônia de abertura da Exposição Mundial. Eles também ficariam para celebrar o aniversário dos príncipes gêmeos alguns dias depois. A ideia de que sua reputação dependia de como ela passaria a próxima semana deixou Erna nervosa.

Os preparativos de Bjorn terminaram assim que um criado apresentou a Bjorn seu paletó e gentilmente o colocou em seus ombros. Bjorn se afastou do espelho e se aproximou de Erna. Ele era realmente mais bonito que seu avô.

“Acho que o que os adultos dizem está mais ou menos certo”, Erna sussurrou baixinho enquanto pegava a mão estendida de Bjorn.

“O quê?”, disse Bjorn.

“Não, nada, vamos”, disse Erna, corando um pouco.

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