
Volume 1 - Capítulo 22
O Príncipe Problemático
Como um cavalheiro se despedindo após uma conversa agradável, Bjorn silenciosamente prestou uma cortesia a Robin Heinz, que se esforçava para fazer contato visual. Era difícil encontrar qualquer vestígio da briga unilateral que acabara de acontecer em qualquer lugar na aparência de Bjorn ao sair.
Ele caminhou lentamente pelo corredor vazio. Bjorn não conseguia sentir muita pena do que tinha feito – embora soubesse que estava despejando nele a irritação acumulada graças a Gladys sobre Heinz. Nem mesmo a consciência dos boatos que se espalhariam por toda a cidade antes do amanhecer conseguiria manchar aquela satisfação. Seria perfeito se o desespero da Princesa Gladys aumentasse graças ao escândalo crescente em torno de seu ex-marido, já longe da coroa.
Bjorn entrou na sala com o castiçal ainda na mão. Os convidados, virando inadvertidamente os olhos para ele, se assustaram.
“Bj-Bjorn!” A marquesa de Harbour foi a primeira a recuperar a compostura, e seu grito ecoou nitidamente. “Depois do que você fez com a Gladys e desapareceu – o que está acontecendo?”
“Ah, essa pequena coisa?” Bjorn casualmente colocou o castiçal ensanguentado na mesa em frente à sua tia. “Teve um pequeno tumulto.”
“Tumulto? O quê…? Ah!” A marquesa gritou, incapaz de terminar a frase. Outras damas, seguindo seus olhos, gritaram também. Entre elas estava Gladys, sentada em um canto, cercada por amigas que tentavam confortá-la.
Bjorn se virou, mais satisfeito do que nunca com o que viu. Robin Heinz, mancando e tão ensanguentado quanto se poderia esperar, estava na entrada, chamando a atenção de todos.
Uma das damas quebrou a tensão tentando desmaiar. A tentativa não foi um sucesso total, mas abalou a atmosfera e a festa se desfez em grupos, alguns em torno da dama que desmaiou, outros em torno de Robin.
Agora que o momento dramático havia passado, Bjorn se cansou da cena. Esquivando-se daqueles que o questionariam, ele se dirigiu ao salão de banquetes.
Ao sair, ele lançou um olhar para trás no rosto da marquesa de Harbour. Ela estava pálida, seus olhos faiscando com a excitação de uma batalha sangrenta em sua festa.
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“Senhorita! É verdade! Realmente existe um troféu de ouro assim!” Lisa, animada, levantou a voz assim que entrou no quarto.
Erna, pairando nervosa sobre sua penteadeira, virou-se abruptamente, assustada. O pincel que ela estava segurando caiu de sua mão e rolou até tocar os dedos de Lisa.
“É uma tradição dos clubes sociais que um cavalheiro que está prestes a se casar faça um troféu de chifre de veado dourado e faça uma despedida de solteiro”, disse Lisa, pegando o pincel mecanicamente e o devolvendo a Erna. Seus olhos brilhavam com o prazer de contar novidades. “Quem bebe mais, ou algo assim, na festa ganha. Existem todo tipo de tradições bobas, apostas em bebida, apostas em ouro. Os caras sempre aprontam coisas bobas.”
De acordo com a pesquisa de Lisa entre as empregadas de sua amizade, o filho do Marquês Bergman havia recentemente feito o troféu e realizado uma grande festa de despedida de solteiro. Bjorn havia sido o vencedor. Era bem sabido que o “Príncipe Cogumelo Venenoso” havia arrebatado todos os prêmios da festa de despedida de solteiro e ganhado um novo apelido, “Caçador de Veados do Inferno”. Lisa continuou e continuou, contando tudo o que tinha ouvido, e o desespero de Erna se aprofundou.
“Mas, senhorita, por que você está curiosa sobre essas travessuras?” Lisa perguntou hesitante, interrompendo subitamente sua história.
Erna agarrou sua saia com um sobressalto.
“Eu… Ah, eu ouvi falar disso na festa. Parecia… tão estranho, fascinante… fiquei curiosa, um pouco.”
“É estranho o suficiente!” Lisa concordou, sem questionar a explicação. “Mas o Príncipe Cogumelo Venenoso sempre está aprontando alguma coisa. Ultimamente ele tem dado o que falar na cidade. É um milagre a cidade ficar quieta, com tudo o que ele faz para agitar as coisas.” A língua de Lisa já havia esquecido o troféu e passado para a próxima notícia. “Não basta ele se embebedar, ele ainda entra em brigas. Que perdedor esse homem.”
“Ah, não, Lisa”, Erna corrigiu, sem pensar no que estava dizendo. “Foi… ele não estava bêbado. Eu… tenho certeza de que não estava.” Ela parou, percebendo que não conseguia explicar.
“Ah, você não conhece esses bebedores, Senhorita.”
“Mas… talvez ele tenha brigado com alguém que estava errado?” Erna sabia que deveria deixar pra lá, mas não conseguia recuar. Não importava que tipo de homem o Príncipe fosse, dessa vez foi culpa dela, e ela não podia deixá-lo levar a culpa, não se pudesse evitar.
Lisa riu. “De jeito nenhum. Não importa o quão ruins sejam os filhos Heinz, é improvável que um deles estivesse errado em uma briga com o Príncipe Cogumelo Venenoso.” Ela parou de rir e sua expressão ficou séria enquanto ela balançava a cabeça. “Você continua tomando partido do Príncipe, senhorita.”
“Ah… eu… eu não estou tomando partido – só que você não pode julgar sem conhecer toda a situação…”
“Não!” Lisa balançou a cabeça com mais vigor, franzindo a testa. “Não se deixe enganar pela aparência dele! Cogumelos venenosos são sempre bonitos, mas você sabe o que acontece quando você os come?”
“Não é isso, Lisa.”
“Você morre. Lembre-se disso, jovem senhora. Você vai morrer se comer cogumelos venenosos!”
Lisa repetiu como se estivesse falando com uma criança à beira de uma nova aventura, e parou apenas quando foi chamada por outra empregada que a procurava. Mesmo ao fechar a porta atrás dela, ela sibilou outro aviso severo – “Você vai morrer se comer!”
Sozinha, Erna sentou-se impotente em frente à sua escrivaninha. Ela havia bagunçado todos os seus materiais de trabalho, mas não conseguia se concentrar para arrumá-los.
O rosto do Príncipe flutuava em um pedaço de tecido cortado em pétalas. Seu rosto estava na tesoura brilhante, no vaso de flores, até mesmo no frasco de tinta. A única maneira de evitar ver seu rosto era fechar os olhos.
Erna devia muito ao Príncipe – em mais de um sentido.
O fato inegável pesava muito em sua mente.
Ela inventou uma desculpa para dar um passeio e procurou o caminho da fonte para a mansão de manhã cedo, mas sem surpresa, não havia sinal do troféu de chifre de veado. Sua última esperança de que o Príncipe pudesse ter mentido foi desfeita. Além disso, ela havia colocado a culpa nele e fugido como uma covarde.
Quanto mais ela pensava sobre isso, mais nervosa e preocupada Erna ficava. Ela correu para seu armário e a mão que alcançou seu cofrinho de lata estava pálida e trêmula.
“O que posso fazer, como vou pagar isso?” Erna gemeu, afundando no chão enquanto apalpava dentro do pote. Mesmo que vendesse tudo o que possuía, sabia que não conseguiria comprar nem um canto do chifre de veado.
Embora soubesse que era inútil, Erna ficou sentada ali por muito tempo e contou o que havia no pote várias vezes. Os sons das moedas rolando na lata de estanho tilintavam desesperadamente.
Se ela soubesse que isso aconteceria, poderia ter economizado dinheiro…
No dia em que Pavel dissera à loja de departamentos que Erna entregaria flores falsas, ela ficou animada por comprar muitos materiais. Claro, fora uma pequena quantia em dinheiro, mas agora ela sentia que ter economizado teria feito uma grande diferença.
“Flores…” Erna murmurou inconscientemente enquanto encarava as profundezas escuras do pote. Mas ao pensar em suas flores, uma fraca esperança surgiu e seus olhos letárgicos começaram a reviver.
Seu avô dissera que, qualquer outra coisa que você perdesse, você sempre poderia preservar seu orgulho e sua dignidade. E Erna era a neta e aluna orgulhosa de seu avô.
“Se você está endividado, pague honestamente o máximo que puder”, ele dissera. “Peça sinceramente desculpas e peça francamente perdão se cometer um erro.”
Seus ensinamentos voltaram a ela agora, e com eles tudo o que ele queria dizer com orgulho e dignidade. Só porque ele estava no céu não era razão para esquecer o que ele dissera na terra.
Erna pulou de seu assento, segurando um buquê de flores prateadas que ela havia feito.
Viva uma vida de fé.
Esse era o legado que seu avô havia deixado para trás.
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Ao pôr do sol, o rio Abit fica rosado.
Bjorn puxou as cortinas e abriu a janela de sua carruagem. A paisagem da noite – a cidade fluindo ao seu lado na velocidade da carruagem – era calma e relaxante. Bjorn recostou-se profundamente em seu assento, cansado de um dia agitado, olhando sonolento para a margem do rio tingida de rosa.
A noite estava pacífica.
O Banco Frayr estava firmemente estabelecido no mundo financeiro de Schubert, e seus investimentos individuais estavam dando retornos satisfatórios. Em uma grande corrida de cavalos recente, seu próprio cavalo havia ganhado o campeonato. Bjorn não se interessava pelas corridas em si, mas o prêmio em dinheiro trazido por seu garanhão campeão era diferente.
A vida estava indo como ele queria, tão suavemente que ele não conseguia encontrar nenhuma razão para não amar aquele verão. Ainda mais porque a presença de Gladys estava ofuscada pela empolgação em torno da bela venda que o Visconde Hardy estava fazendo. Bjorn poupou um pensamento de pena para a garota cujo pai estava ocupado arranjando seu casamento com o maior lance… mas importava como? Bjorn pensou que poderia amar qualquer mulher cujo nome não fosse Gladys. Além disso, ele tinha aquela aposta nas viagens de barco durante o festival… e esperava que Erna lhe desse um grande lucro.
Um sorriso de satisfação, nascido de muitas coisas, se espalhou pela boca de Bjorn quando a carruagem entrou na ponte que conectava a cidade e a propriedade do Grão-Duque.
Bjorn estava disposto a concordar com qualquer um que dissesse que aquela ponte era a ponte mais bonita do rio Abit. Ele não era um conhecedor de arte, mas mesmo a seus olhos, a ponte parecia bonita – sem surpresa. Nenhuma despesa foi poupada para torná-la o mais deslumbrante possível para comemorar a antiga vitória de sua família.
Bjorn levantou os olhos em direção à entrada da ponte, onde estava uma estátua dourada em um alto pilar de granito. Filipe II, o Rei Conquistador, o bisavô de Bjorn, havia construído a ponte e mandado fazer essa enorme estátua equestre de si mesmo.
Fazendo um aceno familiar para a estátua de seu ancestral, que fizera tanto para transformar a cidade na joia que era hoje, Bjorn sorriu levemente e afastou o cabelo dos olhos enquanto o vento soprava pela ponte. Embora o anoitecer estivesse começando, a ponte estava brilhantemente iluminada por lampiões a gás e pelos diligentes acendedores de lampiões. Essas luzes brilhando ao longo da grade eram a glória final da beleza da ponte.
Foi quando o fim da ponte estava se aproximando que os olhos de Bjorn, distraídos pelas belezas desdobradas da ponte de luz, de repente se estreitaram. Uma mulher estava parada sob o pilar de granito no final da ponte. Uma mulher com um embrulho nos braços, olhando para sua carruagem.
“Erna.”
Bjorn exclamou seu nome com uma risada repentina. Ele não conseguia acreditar, mas era definitivamente Erna. Uma dama vestida com roupas do campo. Ele sentiu como se tivesse acabado de receber uma sequência real para ganhar sua aposta.
Ao se aproximar, a mulher começou a acenar nervosamente para a carruagem. Não poderia ter sido um acidente. Apenas uma carruagem do Grão-Duque cruzava aquela ponte.
Bjorn riu novamente e bateu na frente da carruagem. Quando o cocheiro conteve os cavalos, a paisagem fluida também parou.
Suspirando suavemente, Bjorn abriu a porta de sua carruagem. A mulher – Erna – recuou por um momento para a cena noturna agora imóvel.