Volume 5 - Capítulo 486

Paulo Coelho disse certa vez que as memórias são como o sal: a quantidade certa realça o sabor da comida, mas em excesso estraga tudo. Essa afirmação se aplica perfeitamente a Qie Ranzhe e Wen Qinxi. Para Qie Ranzhe, era o primeiro caso; para Wen Qinxi, o segundo.

Enquanto um se encolhia embaixo das cobertas, se recusando a sair, o outro sorria, relembrando momentos passados com seu primeiro amor.

Sua mente se agarrava à lembrança do acampamento, onde Wen Qinxi molhou seu irmão com uma garrafa de água gelada antes de sair correndo. Qie Ranzhe não se importaria se fosse outra pessoa, mas aquele era o "Gecko" silencioso, que raramente tomava a iniciativa de falar a não ser que lhe fosse dirigido a palavra.

Em algum momento, ele pensou que o garoto havia feito um voto de silêncio ou algo assim, pois mal falava. Agora, essa mesma pessoa corria por aí rindo sem se preocupar com nada. "Volta aqui, seu idiota!", gritou Wen Danzhe, correndo feito louco pelo acampamento.

"Danzhe, presta atenção na sua língua, ou eu te bato até você esquecer seu próprio nome!", respondeu a mãe de Wen, gritando atrás dos dois.

Ela parecia tão irritada que, frustrada, colocou a frigideira na mesa próxima, resmungando alguma coisa.

Ela talvez estivesse desinteressada, mas Qie Ranzhe não. Ele seguiu as duas figuras que desapareciam com um olhar curioso nos olhos. Ele logo cruzou o olhar com Zhao Huangzhi por acaso, e a garota sorriu para ele docemente. Ele logo se esqueceu do "nerd" conversando com ela.

Pelo menos até dar um passeio ao longo do rio. Ele viu duas pessoas, uma na água e outra na margem, parecendo hesitante. O hesitante era Wen Qinxi. Ele parecia em conflito com alguma coisa, e Qie Ranzhe logo descobriu o quê.

"Do que você tem medo? A água chega só até meus joelhos, qual é o seu problema?", perguntou Wen Danzhe, incentivando o irmão a pular, mas Wen Qinxi não estava afim.

"Não me apressa… Chega até seus joelhos, mas eu sou menor, droga. Vai chegar até meus quadris ou sei lá. Se eu me afogar, vou te assombrar", respondeu Wen Qinxi, tirando a camiseta.

"Se vocês dois continuarem usando palavrões na minha frente, vou dar uma surra em vocês. Só porque seu pai me deixou com vocês dois, dois encrenqueiros, não significa que vocês podem falar o que quiserem", reclamou a mãe de Wen, sentada em uma cadeira de camping enquanto se abanava.

Qie Ranzhe ficou pasmo naquele momento. Aquele coelhinho não era só barulhento, mas também tinha uma boca suja, do tipo "pesado". Ele achou isso bastante interessante, mas não tanto quanto Wen Qinxi sem camisa. Seu corpo magro e definido brilhava sob o sol, fazendo os nervos de Qie Ranzhe se tensionarem enquanto ele desviava o olhar imediatamente.

Ele não conseguia entender que tipo de sentimento estava tendo, nem tinha tempo para pensar nisso, porque Machu apareceu de repente olhando na direção de Wen Qinxi. "Espera… é…?", perguntou ele, tão surpreso quanto Qie Ranzhe ao ver aquela versão de Wen Qinxi. "Impossível."

"O que vocês estão fazendo? Vamos, quero ver os monumentos", disse Zhao Huangzhi, percebendo que Qie Ranzhe estava olhando para aquele garoto de novo. Ela não comentou, mas guardou isso em mente como algo que precisaria observar.

Os dois se viraram para ir embora também, mas Dai Yu não seguiu. "Quem é aquele gatinho? Primo, você conhec… ai!", ela gritou antes de Qie Ranzhe a arrastar para longe.

Naquela noite, Machu foi vítima infeliz do experimento de Qie Ranzhe. Ele sentiu algo ao ver o Gecko sem camisa e queria saber se o efeito seria o mesmo ao olhar para Machu.

Eles já tinham se trocado no mesmo vestiário antes e depois de nadar, mas ele nunca havia prestado atenção em sua reação. Afinal, todos eram homens, então qual era aquele sentimento que o fez desviar o olhar ao ver o Gecko sem camisa?

Naquele momento, ele se sentiu como um tarado se aproveitando de uma donzela, mas o Gecko não era uma donzela. "Tira… deixa eu ver", disse ele a Machu na barraca, sentindo-se bastante impaciente.

"Ran-ge, eu não me exerci nessas férias… desenvolvi uma pequena barriguinha… Ahhh! Droga!… Por que você é tão agressivo?", reclamou ele enquanto sua camiseta era tirada em questão de segundos.

Machu cobriu sua pequena barriguinha, sentindo-se inseguro, mas Qie Ranzhe tinha uma expressão inexpressiva. Ele não sentiu nada, nem um pouco de interesse.

"Veste de novo", disse ele antes de se deitar em seu saco de dormir com um olhar pensativo. Ele empurrou esse pensamento para o fundo da mente, mas uma semente já havia criado raízes naquele momento.

De volta à escola, ele mudou seu treino de basquete para depois da aula, e não foi coincidência que a quadra de basquete ficava perto do ponto de encontro. Todos os dias ele via Wen Qinxi esperando sua mãe e seu irmão o buscarem depois da aula, só para poder vislumbrar aquele sorriso fugaz novamente.

Uma obsessão doentia estava brotando, que até Machu percebeu. Ele uma vez perguntou a Qie Ranzhe por que ele simplesmente não se aproximava e pedia para ser amigo. Talvez assim ele perdesse o interesse, mas a resposta de Qie Ranzhe quase o fez vomitar sangue.

"Não seria tão interessante", foi sua resposta, mas o que ele não percebeu foi que havia chamado a atenção de Wen Danzhe. Ele talvez não tivesse um QI tão alto quanto o de seu irmão mais velho, mas sua inteligência emocional era fora de série. Ele já havia começado a questionar Wen Qinxi sobre aqueles rapazes na quadra de basquete, mas Wen Qinxi não fazia ideia.

Ele sempre mantinha a cabeça baixa, jogando no celular, senão, quando chegasse em casa, não teria chance com sua mãe-helicóptero pairando sobre eles. Isso não deixou outra escolha para Wen Danzhe a não ser encontrar outra fonte de informação, e o que ele descobriu o deixou suspeito.

Qie Ranzhe não estava apenas rondando a quadra de basquete observando seu irmão, mas também havia se infiltrado sorrateiramente em seus clubes, o que era suspeito em si. Isso porque os clubes de Wen Qinxi eram exclusivamente para nerds, mas aquele deus grego, que não tinha nenhum interesse em tecnologia e mangá, estava se comportando como um membro dedicado do clube. Ele também não se esqueceu de arrastar Machu como seu porta-voz.

Qie Ranzhe já havia concluído que seu interesse pelo Gecko era exclusivamente devido à sua personalidade camaleônica, que mudava de cor tão drasticamente. Era intrigante, mas sua mente fez uma curva de 180 graus quando ele acidentalmente colidiu com o Gecko uma manhã.