Volume 1 - Capítulo 7
Sword Art Online
9 A.M.
O dia estava um pouco nublado e a neblina da manhã que cobria a cidade ainda não havia desaparecido. A luz refletia pelas janelas e coloria a tudo com um amarelo limão.
De acordo como o calendário de Aincrad, era o «Mês do Carvalho» o que justificava as folhas que começavam a cair. Estava frio, aquele mês era de longe o mais refrescante do ano. Mas, nesse momento eu estava apenas ignorando isso.
No meio da praça, em frente ao portão de teletransporte estava eu, esperando pela Asuna. Por alguma razão eu não consegui dormir ontem, tudo que eu fiz na minha cama foi rolar de um lado para o outro. Eu acho que só consegui dormir de verdade quando passava das 3 da manhã. Havia muitas opções que facilitavam a vida dos jogadores em SAO, mas infelizmente um botão que fazia dormir automaticamente não estava incluso.
Apesar disso, o oposto existia. Nas opções relacionadas ao tempo no menu, havia um chamado «Alarme» que forçava o jogador a acordar. É claro, a escolha de voltar a dormir ou não era toda sua, mas com o passar do tempo eu já havia adquirido força de vontade suficiente para acordar antes do sistema.
Talvez todo esse jogo seja uma benção para todos os jogadores preguiçosos. Não há necessidade de tomar banho ou trocar de roupa — além de que seria estranho para jogadores tomar banho diariamente em um jogo, mas creio que o principal motivo disso seja que é complicado reproduzir um banho real perfeitamente, o que de certo modo é uma limitação do NERvGear. Depois de acordar perto do tempo limite, eu coloquei todo meu equipamento em vinte segundos e sai até o teletransporte de Algade e desde então estou esperando ela aqui, irritado pela minha falta de sono, mas —
“Ela está atrasada.”
O relógio dizia que já passava das 10. Jogadores já começavam a aparecer e iam em direção ao Labirinto um após outro.
Ahh, eu queria ter um jogo portátil ou alguma coisa parecida.
Tentei me livrar esse pensamento assim que ele apareceu. Eu realmente estava piorando, eu estava querendo jogar um jogo dentro de um jogo.
Eu deveria voltar e dormir... Era isso que eu estava pensando. Outro efeito azul de teletransporte apareceu no portão. Eu via aquilo sem muita expectativa. Mas então —
“Kyaaaaa! Por favor, saia da frente!”
“Ahhhhhh!?”
Normalmente jogadores que se teletransportam aparecem no chão. Mas essa pessoa apareceu a metros — no ar, bem em cima de mim.
Sem tempo para correr ou rolar, nós colidimos e caímos no chão. Eu acertei minha cabeça no chão de pedra. Se não estivéssemos em uma área habitada, um pouco do meu HP seria arrancado.
Tudo isso significava — que esse jogador idiota havia pulado durante o teletransporte e apareceu dessa forma. Mesmo tonto, eu consegui deduzir isso e segurei o idiota com o objetivo de empurrá-lo.
“...hmm?”
Algo estranho foi registrado pela minha mão. Eu apartei duas, três vezes sem saber exatamente o que era aquela sensação.
“K-Kya!!”
Subitamente um grande grito invadiu minhas orelhas e minha cabeça atingiu o chão novamente. Quando finalmente levantei meu corpo eu olhei para a pessoa.
Na minha frente, estava uma jogadora vestindo um uniforme de cavaleira vermelho e branco e uma minissaia, ainda com uma rapier prateada presa a sua cintura. E por algum motivo, havia uma evidente raiva nos seus olhos. Seu rosto parecia dizer que ela tinha passado por uma experiência degradante, estava vermelha de orelha a orelha e seus dois braços estavam cruzados como se protegesse seus peitos... Peitos... ?
Imediatamente me toquei do que eu estava segurando com a minha mão direita. Assim que percebi, um pouco tarde demais, aquela situação perigosa já estava armada. Todos os modos para escapar que eu tanto treinei desapareceram da minha mente. Abria e fechava minha mão direita, sem saber o que fazer.
“E-Ei. Bom dia, Asuna.”
A raiva em seus olhos parecia gerar faíscas. Eram olhos de alguém completamente disposto a sacar sua espada.
Eu comecei a pensar se havia a necessidade de «escapar», mas antes de eu fazer uma escolha, o portão começou a brilhar novamente. Asuna olhou para trás surpresa e começou a se esconder atrás de mim.
“Eh...?”
Sem saber por que, eu fiquei paralisado. O portão parava de brilhar e um recém chegado aparecia. Ao menos dessa vez, o jogador estava no chão.
Assim que a luz desapareceu completamente, eu reconheci a pessoa. Uma impressionante capa branca com um símbolo vermelho. Esse homem, que trajava um uniforme da KoB, carregava uma espada que parecia enfeitada demais, era o guarda costas que estava seguindo Asuna ontem. O nome dele era Cradil ou algo assim.
Cradil me encarou assim que viu Asuna atrás de mim. Ele não parecia tão velho. Ele deveria ter ao redor dos 20, mas as suas rugas o faziam parecer mais velho. Ele começou a falar com uma voz de raiva falsamente controlada.
“...Asuna-sama, você não deveria agir por conta própria...!”
Assim que eu senti um pouco do histerismo em sua voz, eu pensei isso vai ficar complicado.
Com seus olhos pesados, Cradil falou novamente.
“Agora, Asuna-sama, vamos voltar ao QG.”
“Não. Eu não estou trabalhando hoje!...E Cradil, por que estava na frente da minha casa tão cedo?”
“Haha, eu sabia que isso ia acontecer. Por isso eu comecei a ir a Salemburg e vigiar sua casa a mais de um mês.”
Eu pude enxergar o orgulho naquela resposta. Asuna congelou. Depois de um longo silêncio, ela falou com uma voz forçada.
“Isso... Isso não é parte das ordens do líder, é?”
“Meu dever é escoltar você, Asuna-sama. Vigiar sua casa está incluso nisso...”
“O que você quer dizer com incluso, seu idiota!?”
Cradil se aproximou com uma expressão irritada e me empurrou para segurar a mão da garota.
“Você não parece me entender. Por favor, não seja assim... Vamos voltar ao QG.”
Asuna parecia não ter forças para lutar ou responder. Então me olhou, com se implorasse.
Sendo sincero, é em momentos assim que eu caio fora. Mas no momento que eu vi os olhos dela, comecei a me mover. Segurei o braço direito do Cradil, o que estava segurando a Asuna e coloquei força suficiente para chamar o código de prevenção de crimes.
“Desculpe, mas eu devo uma a sua capitã por hoje.”
A frase parecia estúpida até para mim, mas eu não podia voltar mais atrás.
Cradil que propositalmente estava me ignorando até agora, olhou para mim e soltou o seu braço.
“Você...!”
Ele gritou de uma forma histérica. Mesmo com o sistema de expressões faciais e de voz, definitivamente havia algo estranho com ele.
“Eu vou garantir a segurança da Asuna. Não é como se houvesse uma luta lua contra um chefe hoje. Você pode voltar para o QG por conta própria.”
“N-Não brinque comigo!! Você acha mesmo que um jogador patético como você poderia proteger a Asuna-sama?”
“Melhor que você, eu aposto.”
“S-Seu tolo insolente...! Se pode falar tanto, então suponho que não vai voltar atrás...?”
O rosto de Cradil agora estava branco, ele chamou o menu e começou a manipular rapidamente. Em seguida, uma mensagem semi-transparente apareceu na minha frente. Eu já sabia o que era antes mesmo de ler.
[Um duelo 1-contra-1 foi requisitado por Cradil. Você aceita?]
Diante das cartas brilhantes dizendo - SIM\NÃO - e alguns botões de opções, eu olhei para o lado em direção a Asuna. Ela não estava vendo as mensagens, mas parecia entender o que estava acontecendo. Eu pensei que ela iria me parar, mas surpreendentemente, ela manteve uma expressão rígida.
“....Tudo bem? Isso não vai causar problemas na Guilda?”
Asuna me respondeu da sua forma.
“Tudo bem. Eu vou reportar isso ao líder eu mesma.”
Assenti e pressionei o Sim e escolhi «First Attack Mode» nas opções.
O Duelo seria quem acertasse o adversário primeiro ou reduzisse o HP do oponente à metade. A mensagem mudou para [Você aceitou um duelo 1-contra-1 com Cradil]. Um contador de 60 segundos surgiu. No momento que chegasse a zero, a proteção para HP seria desligado e nós poderíamos duelar.
Cradil parecia ter feito sua própria interpretação do consentimento da Asuna.
“Por favor, assista Asuna-sama! Eu vou provar que ninguém é melhor do que eu para escoltar você!”
Ele falava aqui como se algo o estivesse iluminando. Então sacou sua grande espada de duas mãos da bainha e se posicionou com um som metálico.
Antes de eu sacar minha espada de uma mão, eu verifiquei que Asuna se moveu para longe. Como esperado de um membro de uma Guilda tão famosa, a sua espada parecia muito melhor que a minha. Não se tratava de uma diferença entre ser de uma mão e a outra de duas. Era como se a minha fosse uma simples espada de treino enquanto a dele era uma top de linha de algum ferreiro famoso.
Eram 5 metros a distância entre nós, enquanto aguardávamos o contador acabar, as pessoas começavam a comentar sobre a gente. Isso não era tão estranho. Nós estávamos na praça central da cidade e ambos éramos jogadores conhecidos.
“O Kirito e um membro da KoB estão tendo um duelo!”
Assim que alguém disse isso, as torcidas começaram a se organizar. Duelos eram mais usados para comparações de habilidades entre amigos, por isso os espectadores gritavam e torciam ignorando a razão da situação ter terminado assim.
Mas, assim que o contador começou a cair, tudo isso começou a desaparecer. Eu senti um frio passando pelo meu corpo como se eu estivesse lutando contra um monstro. Foquei-me em observar a atmosfera ao redor de Cradil, que também me observava, analisando os movimentos dos seus pés.
Humanos possuíam certos hábitos quando eles estavam prestes a usar uma habilidade. Não importa se era uma de ataque ou defesa ou se iria começar lentamente ou do alto, o corpo revelava todo tipo de informação que podia ser crucial.
A espada de Cradil estava um pouco abaixo do meio do seu corpo, um claro sinal de que ele usaria um ataque de alto impacto. É claro, eu também estava fazendo algo. Naquele momento a postura da minha espada estava baixa e relaxada, dando a impressão de que meu primeiro ataque seria um corte rápido e baixo. Você só pode entender coisas assim com a experiência.
Assim que o contador chegou aos números de um único digito, eu fechei o menu. Eu não podia mais ouvir nada ao meu redor.
Eu via a Cradil, se movendo na minha direção, com todos os músculos tensos. A palavra [DUELO!!] apareceu no espaço entre nós e eu saltei, usando toda minha força.
Ao mesmo tempo, Cradil e eu passamos um pelo outro, mas havia uma expressão de surpresa no seu rosto, eu havia acabado com suas expectativas quanto a um ataque baixo.
O primeiro ataque dele fora, eu acho, um Sowrd Skill de duas mãos: «Avalanche». Se a defesa do adversário era fraca, o defensor até poderia defender o ataque, mas seria incapaz de contra-atacar graças ao impacto, esse tipo de ataque era usado por jogadores para conseguir tempo e diminuir a distância entre eles. Realmente uma habilidade muito útil. Ao menos contra monstros.
Eu, que já havia lido o que Cradil iria fazer, escolhi uma habilidade também de impacto chamada «Sonic Leapt». E ambas as habilidades haviam colidido.
Se você analisar por força, a dele era muito mais forte que a minha e o jogo favoreceria a ela quando os ataques colidiam. No caso de eu ter errado o alvo, a habilidade me pegaria em cheio e eu ficaria fraco demais para continuar o duelo.
Mas eu não estava mirando no Cradil.
O espaço entre nós desapareceu rapidamente. Mas a minha percepção fora ainda mais rápida, como se o tempo tivesse ficado mais lento. Eu não sei se isso é resultado do sistema ou se é uma habilidade natural humana. Tudo que eu sei é que eu podia ler seus movimentos.
A espada, que passou bem pelas minhas costas, tinha um brilho alaranjado que se aproximou de mim. Seus status deveriam ser bem alto, algo esperado da melhor Guilda, visto que a habilidade se iniciou um pouco antes do que eu esperava. A espada brilhante atravessou o ar. Se tivesse me acertado, sem dúvidas teria sido suficiente para terminar o duelo. O rosto de Cradil mostrava o êxtase pela sua aparente vitória. Mas —
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Minha espada, que se moveu mais rápido, desenhou uma trajetória verde e acertou a espada dele momentos antes do fim do ataque. O jogo calculava o dano causado pela minha espada.
O outro resultado para colisão de armas era «Quebra de Arma». Havia apenas uma pequena chance de ocorrer, quando a espada recebia um ataque preciso na sua parte mais fraca.
Mas eu tinha certeza que ela quebraria.
Arma com muita decoração tem baixa durabilidade.
Como esperado — com um som ensurdecedor — a espada de Cradil estava quebrada. O efeito era próximo de uma explosão.
Nós passamos um pelo outro no ar e caímos onde o outro tinha saltado. O pedaço quebrado da espada refletiu a luz do sol, antes de cair sobre o espaço entre nós.
Depois disso, tanto a metade que estava no chão como a na mão de Cradil começaram a se desmanchar em vários polígonos.
O silêncio tomou conta da praça. Todos os espectadores congelaram com as bocas abertas. Mas depois que eu me levantei, com meu movimento habitual de mover a espada da esquerda para direita, eles começaram a comemorar.
“Incrível!”
Ele tinha planejado tudo isso?”
Assim que eu vi todas aquelas pessoas criticando o quão curto fora o duelo, eu suspirei. Mesmo que tenha sido apenas uma habilidade, revelar uma das minhas cartas na manga não era algo para se ficar feliz.
Ainda com a espada em mãos eu me aproximei de Cradil que ainda estava parado no chão. Atrás de si, sua capa branca balançava violentamente. Depois de apontar minha espada de propósito, eu disse.
“Se você quiser voltar aqui com outra arma, eu vou lutar com você de novo... Mas, isso é suficiente, certo?”
Cradil sequer olhou para mim. Bateu suas mãos contra o chão e em seguida disse com uma voz doentia “Eu renuncio”. Ele poderia ter dito apenas “Eu desisto” ou “Eu perdi” em Japonês.
Imediatamente, um grupo de linhas roxas apareceu onde a luta havia ocorrido, mostrando o tempo para o fim do duelo e o vencedor. Outros gritos da torcida começou e Cradil se levantou falando para os que assistiam.
“O que vocês estão olhando? Caiam fora!”
E depois se virou para mim.
“Você...Eu vou matar você... Definitivamente eu vou te matar...”
Eu nem posso descrever o quanto enlouquecido ele parecia.
Emoções no SAO poderiam ser um pouco exageradas, mas eu podia sentir o ódio queimando nos olhos de Cradil, de uma forma que assustaria a qualquer monstro.
Alguém chegou ao meu lado e falou.
“Cradil, eu ordeno a você como sub-líder da Knights of the Blood. Eu retiro você da sua posição como guarda costas. Volte para o QG e fique lá até futuras ordens.”
As palavras da Asuna eram tão frias como seu rosto. Eu senti que por de trás dela estava a raiva e o medo, por isso inconscientemente coloquei minha mão sobre seu ombro.
“...O...Que...É isso...”
Fora somente isso que conseguimos compreender. O resto era provavelmente uma mistura de um grito histérico com o ódio que se perdeu em sua boca. Cradil nos encarava. Não havia dúvidas de que ele pensava em nos atacar com sua arma reserva, mesmo sabendo que o código de prevenção contra crimes iria pará-lo.
Mas ao invés disso, ele pegou um cristal de teletransporte do seu bolso. Ele o levantou, pressionando com tanta força que pensei que o cristal se quebraria, murmurando “Teletransporte... Grandum.” O ódio e seu corpo desapareciam na nossa frente tomados por uma luz azul.
Assim que a luz desapareceu, um silêncio se instalou na praça. Os espectadores pareciam ter apenas ignorado a raiva incompreensível de Cradil e saíram em pequenos grupos. Asuna e eu acabamos sendo os únicos na praça.
Então finalmente, Asuna se afastou e começou a falar de forma frágil.
“...Desculpa, eu te coloquei nisso tudo.”
“Não... Tudo bem, mas vai ficar tudo bem com você?”
Ela balançou a cabeça lentamente, mas deu um sorriso espirituoso, porém fraco.
“Sim, eu acho que sou a única culpada por forçar as regras e as aplicar a todos para concluir esse jogo logo...”
“Eu acho...Que você não pode fazer nada quanto a isso. Se eles não tivessem alguém como você, tudo teria sido muito mais lento. Bem, isso não é algo que um jogador solitário como eu deveria dizer... Ah, esquece isso.”
Eu nem sabia mais o que estava tentando dizer, estava apenas falando o que me vinha em mente.
“...Então, ninguém pode dizer nada sobre você... Ter uma folga com alguém sem esperanças como eu.”
Por um momento, Asuna parecia um pouco confusa, mas então sorriu mais alegre.
“... Bem, Muito obrigada. Eu realmente vou tentar curtir o máximo hoje. Por isso confio a você a linha de frente.”
Ela falou aquilo de modo energético e começou a andar em direção da estrada que levava a saída da cidade.
“O que? EI! O ataque deve ser decidido em turnos!”
Mesmo reclamando, eu deixei escapar um suspiro de alivio e segui a garota de cabelos castanhos.